UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: Tão perto, tão longe

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Tão perto, tão longe



Já que o nosso noticiário de ciência - e não só ele, mas a ciência brasileira como um todo - anda depauperado e sobrevivendo praticamente das matérias enviadas pelas agências de notícias internacionais, só nos resta "degustar" o menu do dia: as matérias de ciência de segunda ou terceira mão que são publicadas diariamente pelos principais jornais de circulação nacional.

Duas dessas notícias me chamaram particularmente a atenção - não apenas por anunciarem feitos inéditos ou extraordinários - mas principalmente porque elas servem de mote para refletir sobre a nossa natureza humana.

A primeira notícia, publicada no jornal O Globo online e assinada por Cesar Baima, fala de uma série de melhorias que serão empreendidas em um dos telescópios do Observatório Europeu do Sul (ESO), localizado no Chile. Essas melhorias serão feitas em colaboração com as Iniciativas Breakthrough, instituição fundada em 2015 pelo milionário russo Yuri Milner, com o objetivo de desenvolver projetos de pesquisa e de engenharia espacial.

As melhorias no telescópio seriam consideradas de menor importância por nós, reles mortais, se a notícia não nos revelasse a sua real motivação: "encontrar um planeta habitável na órbita de Alfa Centauri, um dos sistemas estelares mais próximos do nosso", situado a cerca de 4 anos luz da Terra.

Boa parte do interesse despertado pela possibilidade de assuntar o planeta do sistema solar vizinho nasce de pressupostos um tanto quanto narcisistas: acredita-se que um planeta recém-descoberto por lá, denominado Próxima B, tenha tamanho semelhante ao da Terra. Além disso, o planeta orbitaria um par de estrelas também bastante parecidas com o nosso Sol e que compõem o sistema binário de Alfa Centauri. 

Além da semelhança com o sistema solar vizinho, o empreendimento é favorecido pela curta distância que nos separa: se as Iniciativas Breakthrough conseguirem, de fato, desenvolver as tecnologias necessárias para elevar a velocidade de uma espaçonave a 20% da velocidade da luz, conforme previsto, então uma possível viagem a Alfa Centauri não levaria mais do que 20 anos na escala temporal da Terra.

Se, por um lado, já estamos de olho na grama do quintal do sistema solar vizinho, por aqui, no planeta Terra, a vida ainda insiste em nos mostrar que as surpresas ainda fazem parte do nosso cardápio cósmico diário. Uma segunda notícia, também publicada no jornal O Globo online, fala de um asteroide descoberto a apenas dois dias de sua aproximação máxima com a Terra, que aconteceu na manhã desta 2a feira, dia 09 de janeiro de 2017. Denominado 2017 AG13, o asteroide, que mede entre 11 e 34 metros de diâmetro e viaja a 16 km/s, "passou a cerca de 190 mil quilômetros do planeta, aproximadamente a metade da distância entre a Terra e a Lua". 

Apesar de ter passado de fininho no nosso planeta, os cientistas minimizaram as consequências de seu possível impacto na Terra, que consideraram de menor gravidade: "segundo simulações do 'Impact Earth', da Universidade de Purdue, em Indiana, caso um asteroide de rocha porosa atingisse o planeta a um ângulo de 45 graus, ele explodiria no ar, liberando energia de 700 quilotons de TNT, dezenas de vezes. A bomba de Hiroshima tinha potência de 13 quilotons".

É realmente difícil para nós, pobres leigos, avaliar a gravidade de uma explosão com potência 53 vezes superior à bomba de Hiroshima, ainda que muito distante dos nossos tetos. De qualquer forma, este não é o ponto crucial aqui. Enquanto metáfora do comportamento humano, a surpresinha pregada pelo 2017 AG13 já deu o seu recado: quem tem telhado de vidro não perde tempo vigiando o quintal do vizinho.

Fica aí a minha singela sugestão motivacional para este início de 2017...

2 comentários:

  1. Sempre em destaque o tema da solidez da esfera na qual acreditamos viver, Juliana. Nada é sólido, mas apenas líquido, como diria Bauman, recentemente desaparecido.

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  2. Sinceramente? Morro de preguiça do Bauman. Se tivesse que escolher, ficaria com a célebre frase do Karl Marx: "tudo o que é sólido desmancha no ar" (pelo menos, é mais original). Mas nem pensei que o problema aqui fosse a pseudo-solidez do mundo, mas, sim, a contradição permanente nas nossas atitudes e preocupações.

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