UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: agosto 2015

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

O SPA do DNA

Deu hoje na grande imprensa: gaste apenas 20 a 25 minutos do seu tempo para se tornar uma nova pessoa! Ou melhor, seja uma pessoa cada vez menos velha.

É o que garante estudo desenvolvido pela Universidade de Saarland (Alemanha), segundo o qual "apenas uma caminhada diária de 20 a 25 minutos pode render até sete anos a mais de vida". O estudo foi desenvolvido com 69 pessoas saudáveis, não fumantes e com idades entre 30 e 60 anos. Todas elas não "praticavam exercícios regulares e passaram a fazer alguma atividade física," segundo notícia publicada hoje no jornal O Globo online.

O cálculo do ganho de tempo (e qualidade) de vida a ser ganho com a prática de exercícios físicos foi feito após os cientistas realizarem "exames de sangue durante os seis meses de vida ativa" da sua amostra e de constatar que "a prática de exercícios aeróbicos regulares, treinos de força, entre outros exercícios, desencadearam um processo antienvelhecimento capaz de reparar o DNA envelhecido."  Fora isso,  a notícia ressalta que o exercício físico é capaz de "reduzir pela metade os riscos de morte por ataque do coração entre as pessoas de 50 ou 60 anos", além de "retardar o envelhecimento do DNA."
Bom, uma coisa é certa: a originalidade do estudo certamente não reside na comprovação de que o exercício físico reduz o risco de morte por ataque cardíaco ou que ele diminua a probabilidade de desenvolvimento de diabetes e hipertensão. A novidade, ao que parece, está muito mais no peso dado ao exercício físico na contenção do processo de envelhecimento do DNA.

Reforçando esta posição, Sanjay Sharma, pesquisador da St. George's Universtity, declarou ao jornal The Independent que "nunca podemos evitar nos tornar completamente velhos, mas podemos atrasar o envelhecimento. Exercício adquire três a sete anos a mais de vida. É um antidepressivo, melhora as funções cognitivas e agora há uma evidência que pode retardar sintomas de demência”.

Depois de colocar todas as nossas esperanças na preservação do nosso DNA,  vai ter gente chamando a tímida e cotidiana caminhada até a padaria de "A portentosa maratona rumo à eternidade, de braços dados com Dorian Gray."

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

"Smart is the new cool"

"Bonecas de 'cientistas estilosas' chegam ao Reino Unido desafiando os estereótipos", diz o título da postagem publicada no blog Ela, do jornal O Globo online. Mas não se engane. Não foram fabricadas bonecas espelhadas mulheres cientistas da vida real. As bonecas, que são estilosas, acabaram de serem lançadas no Reino Unido.


O problema é que tanto o título e o fato em si nos induzem a vários enganos. O primeiro diz respeito ao estereótipo que está sendo supostamente rompido com tal lançamento. Sinceramente, não entendi: se o objetivo é propor "bonecas temáticas com profissões das áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática", o que cargas d'água a empresa MGA Entertainment, responsável pelo lançamento, entende por "ciência"? Ciências biológicas ou naturais? E por que a Matemática e a Engenharia não podem ser consideradas "ciências"?

A explicação daquilo que seria a ideia central do projeto só acaba complicando ainda mais o entendimento de ciência que ele quer abraçar. Segundo a publicação, "a ideia é mostrar às adolescentes que esses campos não são exclusivamente masculinos e que elas podem ser muito bem-sucedidas nas ciências exatas também." No final das contas, fica claro que as Ciências Humanas passam longe dos projetos de emancipação do imaginário adolescente. Ponto, portanto, para o estereótipo, que sai mais reforçado do que nunca.

Por fim, para piorar as coisas,  há também um estereótipo feminino subsistindo ao modelo de cientista. "Com o slogan ‘Smart is the new cool’, o projeto foca em quatro personagens que, além de inteligentes, são também divertidas e estilosas." Fica então a impressão de que, em se tratando de mulher cientista, inteligência só não basta. Afinal, ela é "mulher" e, portanto, não pode descuidar do trato visual.

Enfim... infeliz de você que é uma mulher cientista simploriamente vestida, razoavelmente mal-humorada e, para piorar, da área de Ciências Humanas. Jamais seria convidada para o lançamento que está sendo "comemorado com uma festa no Museu da Ciência de Londres, em South Kensington".

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Raivosas celebridades

Ninguém nunca tinha se dado conta delas até o último fim de semana, quando parece ter havido um ataque orquestrado no Reino Unido.

E não, não se trata, desta vez, de nenhuma atriz com dependência química tendo ataques de histeria. A primeira diferença deste ataque é que ele foi impetrado por uma série de aranhas "grandes e muito agressivas" , que acabaram ganhando rapidamente notoriedade na redes sociais daquele país.

De acordo com notícia publicada hoje no jornal O Globo online, tudo começou do grito de guerra de uma das vítimas ou, nos termos da própria notícia, "depois que o jornalista Damian Barr encontrou uma em casa e publicou as imagens do aracnídeo em seu Twitter". Dali por diante, foi a histeria coletiva: "muitos outros britânicos também relataram terem encontrado animais semelhantes durante o último fim de semana".

Bem, até aqui, nada realmente demais. A segunda notória diferença não está no ataque, mas no relato do ataque. Trocando em miúdos: notória é a maneira como a notícia publicada no O Globo reproduz bestamente uma sequência de imagens de tweets postados, com fotos-denúncias e relatos de ataques residenciais.

E qual a novidade disso? Bem, no mínimo, significa que o jornalista passou a etapa da apuração sentado confortavelmente em sua cadeira de trabalho e pouco fez para se deslocar da sua idílica mesa de trabalho até o local do ataque (por sinal, em outro continente). Mas para quê tanto esforço, afinal de contas? Com tanto internauta afoito para emplacar um top trend, basta dar-lhes a honra de ter seus tweets divulgados em escala planetária... Só que, como tudo na vida, há também que se considerar o efeito colateral dessa preguiça redacional. Pois tente agora descobrir, na notícia publicada em O Globo, em quais cidades ou bairros ocorreram os ataques.  

Que estranho está ficando esse mundo da notícia veloz, quase instantânea. Entrevista presencial já virou peça de antiquário. E o deslocamento do jornalista para entrar em contato com determinada realidade acaba sendo, na melhor da hipóteses, um deslocamento entre a sala de redação e o banheiro da empresa jornalística. Bela receita para reproduzir sua própria realidade e para não sair de si mesmo. Quiçá, nunca mais! 

sábado, 22 de agosto de 2015

Ventre livre

Lembram da famosa Lei do Ventre Livre, aquela que tornava libertos os filhos de escravas que nascessem a partir do dia da sua promulgação? Pois é, ela está precisando ser reeditada urgentemente no país!

A razão para a reedição da lei vem à tona com a divulgação da Pesquisa Nacional de Saúde, ocorrida hoje, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A pesquisa revela que "metade [53,5%] dos partos por cirurgia cesariana no Brasil ocorre com dia e hora marcados", o que joga por terra a tese de que as cesáreas sejam medidas emergenciais para salvaguardar a vida do bebê e da mãe.

Aliás, o ventre das brasileiras é dos menos livres do mundo. Ainda de acordo com dados divulgados pela pesquisa, "54,7% dos nascimentos ocorridos entre janeiro de 2012 e julho de 2013 ocorreram por meio da cirurgia, enquanto o percentual de partos normais é de 45,3%. A orientação da OMS (Organização Mundial de Saúde) é que a proporção de partos normais seja de 80% dos nascimentos".

E quem mantém os nossos ventres em cárcere privado? Bem, a começar pelas próprias maternidades privadas que, sozinhas, são responsáveis por 74,2% das cesáreas, contra os 35,8% que acontecem no sistema público.

Mas as maternidades não são responsáveis, sozinhas, pelo cerceamento dos fetos de um nascimento mais saudável e natural: "11,8% das cesáreas ocorrem porque a mulher não quer sentir as dores do parto". Além disso, "percentual semelhantes (sic!), de 11,3%, ocorreu por escolha do médico durante o pré-natal".

Mais uma vez, não custa lembrar que a orientação para o parto normal não deveria nem ser discutida, já que ele "é a indicação mais natural do corpo humano de que o bebê está completamente desenvolvido e pronto para vir ao mundo". Dizer que os partos por cesáreas deveriam ter caráter absolutamente excepcional é chover no molhado, já que os "especialistas afirmam que a cesárea marcada favorece o nascimento de crianças prematuras".

Enfim, a situação no Brasil é tão alarmante que ainda chegará o dia em que precisaremos obrigar, por lei, médicos, maternidades e mulheres a repensarem suas prioridades. Até lá,  só nos resta orar pela emancipação dos ventres da ignorância generalizada.

quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Exatidão

No tempo certo, no local exato.

Notícia publicada hoje no jornal O Globo online fala de um fenômeno raríssimo registrado pela Estação Espacial Internacional, durante uma tempestade sobre o México, ocorrida no dia 10 de agosto de 2015. O fenômeno está relacionado com a emissão de raios de cor vermelha, denominados red sprites.

De acordo com a notícia, "os red sprites são descargas elétricas que acontecem acima das nuvens, disparadas por poderosos relâmpagos. Eles formam eventos luminosos de cor avermelhada que atingem entre 50 e 90 quilômetros de altitude, mas são dificilmente vistos da Terra, pois, em geral, as nuvens das tempestades encobrem a visão".

A raridade do registro, contudo, parece estar menos relacionada com o encobrimento das nuvens do que com a agilidade do registro: "Fotos como as captadas pelos astronautas a bordo da ISS são raras porque os red sprites são muito rápidos, com duração entre três e dez milissegundos".

Portanto, da próxima vez então em que pensar em mandar alguém para o raio que o parta, seja ágil e breve! Em caso de raios vermelhos, você tem entre três e dez milissegundos para acertar o alvo.

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Liberlândia

Até onde você está disposto a ir para alcançar sua liberdade?

Pois saiba que um cidadão tcheco está disposto a ir até a terra de ninguém para realizar seu sonho de liberdade, mais conhecido como Liberland.  Este, por sinal, "pode ser o país mais jovem do mundo: Liberland (ou Liberlândia) [foi] fundado em abril deste ano em um terreno de apenas seis quilômetros quadrados entre Croácia e Sérvia, no Leste Europeu". Ele "é a realização do sonho de um político da República Tcheca de 31 anos, Vit Jedlicka".

Segundo notícia publicada na Folha de S. Paulo online, Jedlicka pensava em fundar seu próprio país, "onde se pudessem viver todas as liberdades, fora do alcance das forças políticas". O que ele descobriu que, com o fim da antiga Iugoslávia, "depois do desmembramento em vários países e da repartição de terras, restaram seis quilômetros quadrados que aparentemente não pertenciam a ninguém".

A fundação, que ocorreu em 13 de abril de 2015, "foi semelhante à chegada do homem à Lua: no dia, Jeredlicka, na companhia da namorada, Jana Markoviceva, e de um amigo do colégio, levaram uma bandeira até o centro do terreno e cravou-a no chão".

Pronto! Agora só faltava um governante livremente eleito: "Jedlicka cumpriu os requisitos para fundar um país. Pediu a posse da terra, cravou uma bandeira e formou um governo: foi eleito presidente com os votos da sua namorada e do amigo de infância que o acompanharam na viagem."

Depois do ato de fundação, chegou a hora de dar visibilidade ao seu projeto político de liberdade na terra de ninguém. Fundou um site oficial do país e correu para o Facebook para fazer "uma forte campanha para que mais pessoas adotem a cidadania da Liberlândia".

Moral da história? Já recebeu 360 mil solicitações de cidadania, o que parece totalmente utópico para um país de apenas seis quilômetros quadrados. Mas o pacote de cidadania tem do bom e do pior: "Os riscos na formação de uma cidadania também estão latentes: com a ameaça de grupos islamistas insurgentes na Europa, especialistas em segurança alertam que um novo território no coração do continente, organizado à margem de muitas regras da União Europeia, seria um lugar ideal para realizar um ataque".

Bom, com 360 mil cidadãos em míseros seis quilômetros quadrados de extensão de terra, pelo visto não sobrar muito espaço para mais nem meio extremista. E, suspeito eu, nem muito menos espaço para ser livre.

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

O urso e o imponderável

Contrariando meus surtos otimistas dos últimos tempos, eu hoje vou contar uma breve historinha triste. É que o trágico fim de Xiao Heixiong, um jovem urso preto do Parque de Animal Selvagem, em Xangai (China), tem muito a nos ensinar sobre o poder do imponderável na confluência de fatores adversos.

Segundo a notícia publicada hoje no jornal O Globo online, o urso preto de apenas três anos estava "passeando sem destino" quando deu de cara com o imponderável: ele viu, pela primeira (e última) vez na sua vida, não apenas um, mas dez tigres famintos, prontos para devorá-lo. Acredita-se que Xiao Heixiong, que "provavelmente nunca havia visto um tigre até o momento do infeliz encontro", tenha "entrado no local onde ficam os tigres por causa de uma porta deixada aberta por um veículo de safári."

Fora isso, caso vivesse no mesmo ambiente natural que os tigres, é bem provável que Xiao Heixiong jamais os visse em grupo. Ainda segundo a notícia, os tigres, que são tidos como "animais que são criaturas solitárias em estado selvagem", têm seu comportamento alterado quando passam a ser confinados em grupo. Ou seja, "quando se juntam em um grupo em cativeiro normalmente é para fazer uma emboscada".



Quem deixou a porta de acesso ao local dos tigres aberta? Quem ensinou os tigres a fazerem emboscadas? Quem há de pagar pela morte de um jovem urso preto inexperiente? Essas e outras tantas perguntas só me levam a constatar o quão humano pode ser o drama dos animais.

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Graça nenhuma

Total falta de graça!

Facebook publica "estudo" (perdão, mas as aspas são necessárias) sobre as formas pelas quais as pessoas expressam riso ou gargalhada na Internet e conclui: "a maneira como as pessoas riem on-line está mudando."

O estudo em questão conclui, entre outras coisas, que "a forma mais comum de as pessoas gargalharem em comentários na internet é escrevendo 'hahaha' e suas variações como 'haha' ou 'haaahhahaha' ".  Esta última forma (e suas variantes) foram responsáveis por 51,4% dos casos de riso no Facebook, ao passo que os emojis (aqueles ícones com expressões faciais) amargaram um reles 33,7%, dos casos.

Só que a graça acaba justamente quando descobrimos os possíveis loci para coleta de dados: "Para chegar a esse resultado, o site de Mark Zuckerberg analisou mensagens e comentários publicados na última semana de maio que continham risadas". Pois bem, quais mensagens foram efetivamente analisadas e quais ficaram de fora? Ao que parece, não foram consultadas as mensagens privadas trocadas no Messenger. De qualquer forma, não é nada animador saber que um robô é capaz de rastrear suas conversas mais ou menos públicas, mesmo se cada um pode supostamente controlar a "visibilidade" dada aos seus comentários nesta rede social, por meio de alterações em suas configurações pessoais.

Além de colocar em dúvida o nível de privacidade do usuário que é respeitado em "estudos" dessa natureza (sempre com aspas, por favor), é inegável que tal estudo possui um certo viés etnocêntrico, sob a alegação de que se "usou dados recolhidos no mundo inteiro, embora tenha dado prioridade aos países de língua inglesa".

Por fim, fica a cargo do leitor uma profunda reflexão sobre a relevância dos dados levantados pelo "estudo" (não, não me esqueço das aspas). Por meio da notícia da Folha de S. Paulo online, ficamos sabendo que o famoso LOL (contração da expressão "laugh out loud" e equivalente a "rindo alto"), muito popular nos primórdios das convenções internéticas, esteve presente em apenas 1,9% dos casos de risada; que o usual "kkkkkkkk" brasileiro não entrou na amostra, visto que a prioridade foi dada aos países de língua inglesa; e que "os emojis são mais comuns em Nova York, enquanto quem mora em Boston prefere o 'hahaha'."

 Realmente, ainda estou na dúvida sobre o que eu ganho ao saber que a cidade de Boston foi toda "hahahaha" na semana passada. Das duas, uma: ou sofro de mau humor crônico ou estamos vivenciando uma total carência de motivos realmente mais saudáveis para sorrir.

Ok, reconheço: uma opção não exclui a outra, rsrsrs... mesmo sabendo que esse "rsrsrs" jamais vai entrar na amostra do "estudo" do Facebook.

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Tudo ou nada

Descoberta causa furor entre arqueólogos israelenses, que "estão tentando decodificar inscrições antigas descobertas em uma escavação em Jerusalém."  As inscrições, que teriam sido feitas há 2 mil anos atrás, "foram encontradas nas paredes de uma câmara antiga com resquícios de uma banheira escavada na pedra, usada para o mikvá, um tradicional ritual de banho judaico".

Mas o que elas significam?

Por enquanto, um reles ponto de interrogação. O mais interessante, na verdade, são as hipóteses de sentido: "especialistas estão tentando decifrar as palavras, que parecem ser em aramaico, e os símbolos encontrados, entre eles, um barco e árvores de palmeira." Mas há quem diga que um dos símbolos possa ser "um menorá, um candelabro de sete braços, um dos principais símbolos do Judaísmo". Isso, sem contar que algumas dessas inscrições podem também significar "nomes" que, apesar de estarem em aramaico, foram grafados "em estilo cursivo hebraico".

Com tantas possibilidades,  Royee Greenwald e Alexander Wiegmann, chefes da escavação, não pouparam elogios, qualificando a descoberta de "muito significante."







Isso é que é ironia fina!

quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Só para os brutos

Projetos nascem e morrem todos os dias. Alguns deles, porém, ainda estão na gaveta esperando por dias melhores para se tornarem realidade.

Prova disso é um projeto de casa um tanto quanto inusitado, assinado pelo escritório grego OPA (Open Platform for Architecture). De acordo com a descrição apresentada na notícia publicada hoje no jornal Folha de S. Paulo online, "a casa, que ficará perto do mar Egeu, é subterrânea, tem 180 metros quadrados e uma piscina no teto."

Contudo, um olhar menos condescendente já vai logo avisando que a casa é uma toca incrustada num penhasco à beira do mar, só que com uma piscina no topo. Portanto, quem tem fobia de água, vazamento ou terremoto, pode ir esquecendo o projeto: não vai conseguir nem tirar um cochilo em paz.

A julgar pelo material utilizado nas paredes e tetos, não vai dar para tirar cochilo é nunca.  Para se ter uma ideia, "o quarto de hóspedes fica sob uma laje de concreto com um canto de vidro", enquanto o quarto principal tem paredes "cobertas por espelhos para criar um jogo de luzes e sombras no ambiente". E nem adianta tentar dormir na sala: "O interior da casa é simples e minimalista, porque os protagonistas são a fachada de vidro e sua vista para o mar".

O material previsto para ser utilizado na construção só vem a confirmar a verdadeira vocação da "Casa Brutale" (nome com o qual o ela foi apelidada): ser um lar para os brutos. "A residência será construída com materiais simples: madeira, vidro e concreto. Este último, usado com técnica de acabamento bruto (beton brut), dá nome à Casa Brutale." Isso sem contar com os "detalhes de aço revestido de preto e madeira envelhecida [que] completam a composição". Animou? Tem mais: "a cama é feita com concreto e tem acabamento de madeira." Que bom! Ainda bem que ela não é de pregos!


Mas existem também aquela categoria de projetos que, mesmo depois de terem morrido, ainda nos fazem pensar sobre seu sentido. Exemplos abundam na engraçadíssima lista publicada hoje no jornal O Globo online, contendo os piores nomes de carros de todos os tempos. Chana, Kia Besta, JMC Pika, Ford Pinto e Mazda Laputa são alguns exemplos contundentes de que a sonoridade nunca deve andar divorciada do sentido - para o bem das vendas e para preservação da sua privacidade (afinal, nem todo mundo vai ter interesse em saber quantos quilômetros você andou rodando com sua Chana ou seu Ford Pinto por aí).

Bom, uma coisa é certa. Eu posso até não vibrar de alegria com as ilustrações do projeto, nem sequer querer levar um carro dessa lista para casa, mas não me resta mais nenhuma dúvida de que o paraíso dos brutos é mesmo neste planeta!

terça-feira, 4 de agosto de 2015

Tendências e contra-tendências

Cansado do pessimismo reinante e ávido por ouvir boas notícias? Pois aqui vão duas, segundo as quais maus hábitos começam a ceder espaço para comportamentos mais saudáveis no âmbito das corporações.

No mundo corporativo, por exemplo, o uso de ar condicionado clama urgentemente por uma abordagem de gênero socialmente mais equilibrada. Explico: estudo publicado na revista Nature Climate Change, divulgado pelo jornal New York Times, replicado no Brasil pela Folha de S. Paulo e comentado de últimíssima mão pela minha pessoa (só para se ter uma ideia do percurso informacional percorrido pela notícia até chegar até você, prezado leitor) revela um injusto viés de gênero na regulagem do ar-condicionado em empresas: "a maior parte dos edifícios de escritórios ajustam a temperatura baseados em uma fórmula de décadas atrás e que usa taxas metabólicas de homens".

O efeito devastador deste ajuste é sentido na pele, tecidos e ossos por nós, mulheres, que quase congelamos de frio. Tudo culpa de um tal "modelo de controle térmico" desenvolvido na década de 1960, o qual "considera valores como temperatura do ar, velocidade do ar, pressão de vapor e isolamento por tecidos" - só que todos esses parâmetros são ajustados ao corpos masculinos, claro! A solução mais justa e mais equitável em termos equilíbrio de gênero seria ajustar o ar-condicionado à realidade de quem sente mais frio, ou seja, nós mesmas: "O estudo conclui que edifícios que ajustarem a temperatura para níveis um pouco mais quentes poderia ajudar a combater o aquecimento global."

Na mesma tendência revisionista, têm abundado os laboratórios do país. Segundo notícia publicada também no jornal Folha de S. Paulo, os "laboratórios do país começam, aos poucos, a não exigir mais jejum dos pacientes para a realização da maioria dos exames laboratoriais." A razão disso é límpida e cristalina: "o avanço dos equipamentos, dos reagentes químicos e das análises afastou a interferência da alimentação."

Tema de debate no Congresso Brasileiro de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial, ocorrido na semana passada, no Rio de Janeiro, o fim da exigência de jejum para determinados exames é uma lufada de ar fresco - de ar condicionado ajustado para mulheres - na . E, "ainda que nem todos os laboratórios tenham eliminado o jejum, muitos estão diminuindo o período para 3h ou 4h dependendo do exame", ressalta a notícia.  O que não cabe mais, ao que parece, é a prescrição de períodos prolongados de 12 horas de jejum para casos absolutamente inúteis.

Resumo da ópera: não será de frio e fome que hemos de morrer! 

sábado, 1 de agosto de 2015

Paleotoca

Ponta do Abunã, localizada em Rondônia, está prestes a entrar para a história, se já não entrou. É que lá foi encontrada a primeira paleotoca -  espécie de "labirintos gigantes escavados por animais já extintos, como preguiças e tatus gigantes" - da região amazônica.

A equipe do Serviço Geológico do Brasil (CPRM) encontrou um túnel "escavado por uma preguiça gigante extinta há cerca de 10 mil anos, uma vez que fósseis do mamífero já foram localizadas no vale do Rio Madeira durante a fase de garimpo. No túnel é possível identificar marcas de garra que podem ser do animal".

A maior parte das paleotocas brasileiras estão localizadas na região sul do país - só o Rio Grande do Sul tem mais de mil. No caso da paleotoca da Ponta do Abunã, ela é formada por "estruturas circulares e semicirculares de grandes dimensões, com numerosos túneis interligados e a extensão é ainda indefinida."

Sem dúvida, uma obra de engenharia de grandes proporções, capaz de fazer inveja a qualquer habitante da Roça Grande, também conhecida como Belo Horizonte, que teve o desprazer de testemunhar uma tentativa de reajuste de 10% do valor da passagem de ônibus, "sem divulgação prévia e por meio de um decreto publicado no 'Diário Oficial'."

Sorte nossa que o juiz da 4ª Vara da Fazenda Pública de BH acolheu o pedido de suspensão do aumento, com base em denúncia da Defensoria Pública do Estado. Porque se não desse certo, o jeito seria uma mudança da capital do estado de Minas Gerais diretamente para a Ponta do Abunã, onde já estaríamos a meio caminho de um metrô mais eficiente e mais decente do que o serviço de transporte por ônibus da capital mineira.

Por mais paleotocas em todos os estados brasileiros, por favor!