UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: agosto 2013

sábado, 31 de agosto de 2013

Irmão Relógio

De repente, deu saudade de coisas bestas: saudades de publicar neste blog, saudades de tomar café plantado no cerrado, saudades da prosa com os amigos no sábado à tarde (ainda proseio com alguns, mas outros estão sumidos), saudades de ouvir Chet Baker.

E por falar em Chet Baker, acabei pensando nele depois de ler essa notícia publicada hoje no jornal Folha de S. Paulo e que fala sobre o julgamento de um funcionário corrupto província de Shaanxi, no norte da China. Não que ele tivesse feito algo que jamais tenha sido feito por aqui - mesmo porque, depois da absolvição do deputado Donadon pelos seus comparsas da Câmara dos Deputados, podemos dizer que somos grandes conhecedores na matéria.

Pois bem: digna de menção é a obsessão de Yang Dacai, funcionário e ex-diretor do Serviço de Fiscalização de Segurança: "ele se tornou o alvo principal dos internautas chineses que se comunicam por meio da rede social Weibo (o Twitter da China), onde diversas fotos foram postadas para mostrar que Yang era dono de pelo menos 11 relógios de marcas finas, avaliados em um total de dezenas de milhares de euros" (http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2013/08/1334604-funcionario-chines-adepto-de-relogios-de-luxo-e-julgado-por-corrupcao.shtml).

Indagado sobre a veracidade das acusações de "possuir terrenos e propriedade no valor de 5,04 milhões de yuan (R$ 1,96 milhão) cuja procedência ele não tem como explicar, e de ter aceitando 250 mil yuan (R$ 97 mil) em subornos", Dacai não negou, nem assumiu, muito antes pelo contrário: "sentado entre dois policiais", ele se contentou em permanecer "com uma espécie de sorriso nos lábios".

É preciso explicar, contudo, que a excentricidade do Sr. Dacai acabou lhe rendendo o apelido de "Irmão Relógio". Mas com tantas suspeitas pairando sobre o acusado, fica difícil entender porque seu apelido não virou "Irmão do Donadon".

Em homenagem, portanto, aos irmãos Metralha da vez, uma sugestiva canção de Chet Baker e uma recomendação: get lost!



"Let's get lost" - Chet Baker
Fonte: http://youtu.be/Q0ZBaZoBCaA




segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Acidez

Engraçado: é impressão minha ou o mundo está ficando cada vez mais ácido?

Aliás, de engraçado mesmo eu não vi nada. Primeiro, me aparece este alerta lançado pela alemã  Katharina Six, do Instituto Max Planck, em pesquisa publicada recentemente na revista Nature Climate Change. Segundo ela, "o processo de acidificação dos oceanos, em decorrência da dissolução de dióxido de carbono (CO2) na água, poderá acentuar o aquecimento global ao diminuir a emissão de gases de origem marinha" (http://www.hojeemdia.com.br/noticias/ci%C3%AAncia-e-tecnologia/cientista-alem-alerta-que-o-processo-de-acidificac-o-dos-oceanos-e-acelerado-pela-reduc-o-de-co2-1.161670).

Os prognósticos sombrios estariam diretamente ligados ao aumento da acidez das águas dos oceanos: "O estudo mostra que a baixa do índice de PH (que indica o grau de acidez) da água dos oceanos provoca uma baixa da concentração de dimetilo de enxofre (DMS), um gás produzido naturalmente pelo fitoplâncton (organismos vegetais aquáticos) e que tem influência no papel dos oceanos na regulação do clima". No estudo, ela conclui que a baixa na emissão dos tais gases marinhos "resultará num aquecimento global suplementar de entre 0,23 Celsius (ºC) e 0,48ºC – variação suficiente para que este mecanismo até agora desconhecido seja tido em conta em futuras projeções sobre o aquecimento global".

Como se não bastasse a acidez oceânica, eis que surge a Qatar Airways. A companhia aérea impediu ontem que uma graduanda em gestão ambiental pela USP de 24 anos embarcasse em voo com destino a Bali, na Indonésia, e escala em Doha, no Qatar. Segundo notícia publicada no jornal Folha de S. Paulo online, ela foi impedida de embarcar no voo 922 da Qatar Airways "devido a uma piada feita por seu pai no aeroporto de Cumbica" (http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2013/08/1331919-apos-piada-brasileira-e-barrada-em-voo-para-bali.shtml).

"Segundo ela, após responder a um questionário anterior ao check-in sobre suas bagagens, seu pai, Renato Camargo da Silva, 55, economista, teria dito em tom jocoso 'que bom que não acharam que você era terrorista' ". Que bom nada! A Qatar Airways está aí para mostrar que acidez é com eles mesmos: "Após a piada, os dois foram retirados da fila e informados por funcionários da companhia de que ela não poderia embarcar devido a motivos de segurança".

Moral da história: se a coisa continuar nesse pé, senso de humor e dimetilo de enxofre serão, em breve, artigos de luxo.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Obstinação

Alguns diriam que é um ato de rebeldia, mas eu acho que é pura obstinação: depois de começar a minha 2ª feira ficando presa no elevador e sendo literalmente cutucada pelo ferrinho de dois dentistas no mesmo dia, decidi que vou terminar o meu dia rindo. E se não der para rir de mim mesma, o jeito então vai ser rir de outra pessoa.

E não que é encontrei o caso de um camarada lá em Brasília que, exatamente como eu, andou vivendo fortes emoções fortes hoje pela manhã? Segundo nota publicada no jornal Folha de S. Paulo de hoje, "o embaixador Thomas Shannon e dezenas de funcionários da Embaixada dos Estados Unidos em Brasília passaram por um susto nesta segunda-feira", quando "no meio da manhã, o alarme de emergência foi acionado, forçando todas as pessoas que estavam no prédio a deixar suas salas" (http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2013/08/1328618-brasileiro-aperta-botao-errado-e-aciona-alarme-de-emergencia-na-embaixada-dos-eua.shtml).

Passados dez minutos da evacuação e após rápida averiguação do pessoal de segurança, descobriu-se o verdadeiro autor do quase atentado: "um brasileiro, que estava no prédio para pedir visto de entrada para os Estados Unidos, puxou a trava do alarme de incêndio do prédio, ao invés de apertar um botão que permitiria sua entrada na sala de entrega de documentos".

Não foi dito naquela nota se conseguiu realmente obter o almejado visto para os EUA. Mas de nada me admiraria se, nos próximos dias, o dito-cujo fosse flagrado na fila de colonos voluntários com viagem de ida sem volta para Marte (http://cronicasdejuvenal.blogspot.com.br/2013/05/cansou-do-transito-perdeu-o-emprego.html).

O único problema prático que o nosso amigo brasileiro encontraria para chegar até a primeira reunião de colonos voluntários para Marte, realizada recentemente na Universidade George Washington, seria a detenção de um visto americano válido até, pelo menos, a data de embarque (http://www1.folha.uol.com.br/ciencia/2013/08/1321690-voluntarios-de-viagem-sem-volta-para-colonizar-marte-se-reunem-nos-eua.shtml).


quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Corpos estranhos

Que sinuca de bico esta na qual o Procon-SP colocou a marca Predilecta, conhecida por atuar no ramo de massas de tomate e afins: "O Procon-SP notificou nesta quinta-feira a Predilecta Alimentos para que esclareça relatos de consumidores que encontraram corpos estranhos em embalagens do molho de tomate da marca na região de Araçatuba, no interior de São Paulo" (http://oglobo.globo.com/defesa-do-consumidor/procon-sp-notifica-predilecta-por-corpo-estranho-em-molho-de-tomate-9567686).


Explicar satisfatoriamente a presença de um "corpo estranho" não me parece uma tarefa nada simples, esteja o corpo vivo ou morto. Mas se a Predilecta tiver muita dificuldade para identificar um "objeto não identificável", sugiro recorrer à lista de fotos preparada pela Folha de S. Paulo para celebrar o mês de agosto, que é também o mesmo do folclore (http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/18451-riaturas-do-folclore-brasileiro#foto-308811).

Nela, a Predilecta encontrará um vasta lista de "corpos estranhos" de amplo conhecimento popular: onça boi, caboclo d'água, cavalo de três pés, Papa Tigo, mula sem cabeça, homem do saco... São exemplos de diversos "corpos estranhos" que animam a cultura popular e o imaginário infantil. Na falta de uma boa explicação, um bom desenho pode ajudar...

Não que eu ache que a Predilecta tenha lá muito o que fazer a respeito, a não ser tudo o que for necessário para corrigir e impedir que o problema ocorra novamente. Quanto à mim, eu aproveitei este frio e ventoso dia de feriado municipal me sentindo um corpo tranquilo, próxima à minha cachoeira predileta. Situação muito mais confortável do que a da marca de alimentos, sem dúvida: justificar um corpo tranquilo dá muito menos trabalho do que um corpo estranho.

Enfim, boa noite para quem fica. 

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Hegemonia

Ontem, depois de quebrar um jejum inédito de escrita neste blog - configurando uma ausência de cerca de 10 dias -, acabei me poupando do esforço de explicar minha dilatada e sentida ausência.  Sentida, sobretudo, por mim mesma, pois sou a primeira e talvez a única a lamentar minha dose diária de ironia na veia.

Poderia discorrer longamente sobre os motivos que me fizeram ausente por esses dias, mas vou preferir fazê-lo de outra forma: pesquisa do Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia (IBGE) , publicada hoje no jornal O Globo online, revela que a percepção do uso do tempo pelos brasileiros é inquietante. 

A pesquisa mostra, antes de mais nada, que o problema da falta de tempo é crônico e generalizado: além de solicitar ao entrevistado uma descrição do seu "fluxo de atividades ao longo de 24 horas", "no questionário do IBGE, os pesquisadores também quiseram saber sobre a percepção de tempo e o desejo das pessoas de como gostariam de gastar o seu tempo" (http://oglobo.globo.com/economia/as-6h45m-mais-da-metade-dos-brasileiros-ja-esta-de-pe-9438039).

Não deu outra: 47,5% dos entrevistados percebem a falta de tempo eventual (33,8%) ou permanentemente (13,7%). 44,5% se ressente da falta de lazer, outros 29,7% de passar mais tempo com família, e outros 18,5% se queixam de não ter tempo para cuidados pessoais.

É que a rotina média do brasileiro começa cedo, ao contrário do que rezam as más línguas: "mais da metade dos entrevistados já estavam acordados às 6h45m da manhã". Com isso, "o trabalho começa a dominar o tempo da maioria das pessoas no país", se estendendo até em torno de 19h.

 Neste cenário desolador, o tempo de simplesmente viver é escasso: "O tempo livre assume sua hegemonia somente a partir das 21h, quando o sono vem". E como já passamos de 21h faz tempo, vou encerrando aqui meu expediente e lembrando que eu sou também fazer parte desta última estatística: a dos que já estarão acordados às 6h45 da matina, perdidos em mais um engarrafamento em véspera de feriado.

De posse desses dados, só me resta deixar abraços e desejar uma boa noite de sono! 

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

No túnel do tempo da publicidade 17

Ao comentar, nos corredores do trabalho, sobre a atraente estratégia de se contar a história da publicidade usando propagandas antigas, acabei me lembrando da série de comentários intitulados "No túnel do tempo da publicidade", que publico aqui neste blog.

Fui lá averiguar a quantas anda a saudosa série e descobri que o último comentário foi escrito no final de 2011. Foi por esta razão que resolvi espanar a poeira da sessão e do meu acervo pessoal de publicidades brasileiras de mil novecentos e bolinha (mais precisamente: 1979-2005).

Bem, sabemos que analisar relações de gênero na publicidade nacional dá pano para a manga de toda população de Pequim e adjacências. Mas um dos aspectos que mais me interpelam na história da publicidade, em geral, e da brasileira, em particular, são as sutilezas do modelo de representação do relacionamento entre homens e mulheres. Isso sem perder de vista - claro! - o papel da mulher dentro do que se convencionava representar como "modelo" de relação.

Pois a verdade é que a harmonia de um casal, senhoras e senhores, se constrói... com pano para a manga e transações gratificantes! É o que dá a entender o breve exame de duas publicidades que apresentarei a seguir, pinçadas lá do final da década de 1970.

Exemplo 1: A "gratificada"

O homem da publicidade da Bety Joias é tipicamente um homem de negócios. É a ele que o texto dirige o seguinte apelo de consumo: "dê uma joia Bety para a mulher que você ama. Ela vai gostar muito do presente e você vai fazer um ótimo negócio."

Obviamente, a pergunta incita a curiosidade do leitor: "mas que negócio?", pergunta logo de cara. A resposta concedida em seguida apaga qualquer sombra de dúvida, pois um homem de negócios que se preze prima pelo lucro acima de todas as coisas: "A começar pelos ótimos preços e pela flexibilidade do pagamento", explica o texto.

O anúncio não poupa o leitor das diversas vantagens de se fazer uma transação com a Bety (a loja, no caso): o atendimento pode ser feito em uma cobertura em Ipanema, com "sala particular para a escolha do seu presente". E parece que a Bety é boa mesmo de negócio: ela "também vai ao seu escritório ou marca uma hora especial por telefone, reservando uma vaga em estacionamento próprio".

Em suma, o convite da Bety parece irrecusável: "Faça este investimento. Ele rende os juros mais gratificantes que existem". Ficaremos por aqui na nossa análise, imaginando quem seria o mais gratificado nessa história toda...
 
 Exemplo 2: A "embrulhadinha"

A distribuição de papeis de gênero aqui é simples e clara, não deixando margem para a dúvida quanto ao grande beneficiado pelo produto. Nesta publicidade das camisas Raphy, fala-se de um homem "à espera do sucesso", ávido por fazer "bonito aos olhos das mulheres". Então, nada melhor do que as camisas Raphy, "que veste melhor que muita camisa de encomenda."

Até aqui, tudo bem. Poderíamos ter ficado por aqui mesmo, mas os publicitários quiseram mais, muito mais. É aí então que o texto prossegue rumo ao clímax: "gostosa de usar e gostosa de ser acariciada, a camisa Raphy é ideal para homens que não costumam fazer fita. Principalmente diante de uma mulher que está embrulhadinha num tecido também fabricado pela Raphy", finaliza.

Querem prova mais cabal do que a foto ao lado? Camisa cheia de qualidades essas... O desfecho - ou clímax, como preferirem - foi feito com chave de ouro. Embrulhadinha, pronta para ser usufruída em casa, no trabalho, no lazer: eis o destino da "embrulhadinha" da Raphy.

Então é isso meus amigos: no final dos anos 1970, a vida era muito mais simples: depois de feita a transação, era pegar o embrulho de levar para casa.

Mas quem disse que nós, mulheres, queremos ser simples?