UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: 2015

quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Meu ombro direito

Vou direto ao ponto: quem atravessou 2015 entendeu o que é viver um ano de altíssima periculosidade!

Mas não se iluda: não vim aqui hoje para me queixar deste ano que deixou muitos (senão todos) de queixo caído. Nem tampouco vou propor qualquer retrospectiva que seja - já tem tantas por aí e a minha não haveria de ser mais a interessante, nem mais a acurada ou muito menos a mais representativa das peripécias vividas neste ano ímpar.

Há, contudo, algo de divinamente surpreendente neste ano que está em vias de terminar. 2015 foi, sem dúvida, um ano predestinado a nos tirar o fôlego, as certezas e, muitas vezes, o próprio chão debaixo dos pés. E como este foi um ano que nos pregou muitas peças - para o bem e para o mal - assim tem sido até os 45 minutos do 2o tempo do jogo.

Pois vejam só a minha sina neste finalzinho de ano. Na noite de antes de ontem para ontem, eu me preparava para fechar o ano fazendo as atividades rotineiras que mais gosto: natação e yoga. Cidade vazia, trânsito tranquilo, condições ideais para deslocamento a pé ou em transporte coletivo. Isso sem falar daquela necessidade interna de passar tudo a limpo, de expurgar o corpo suando as impurezas, de alongar a alma e expandir o fôlego.

Pois bem: 2a feira à noite, texto publicado no blog, cama arrumada, corpo cansado, sono chegando. O que poderia dar errado? Na 3a feira de manhã, acordei no horário habitual, abri os olhos e olhei as horas no celular, antes mesmo do despertador tocar. Até aqui, tudo certo. Tempo nublado, Centro Esportivo Universitário vazio, aqui vamos nós. Repito: o que poderia dar errado?

Nada, a não ser o fato de eu ter dormido a noite inteira sobre o meu ombro direito. Passados esses primeiros minutos, dores lancinantes me avisaram que algo não ia bem. Talvez em função do cansaço na noite anterior e do sono demasiadamente pesado. Pronto: não consigo mexer o braço sem ver estrelinhas de dor. Então tentei, com muito jeitinho, fazer a rotação do ombro para frente e para trás. Acabei desistindo. Joguei a toalha. Não vou nadar hoje. Vou deixar para fazer yoga no final do dia.

Troquei mensagens com uma amiga fisioterapeuta: há pouco ou nada a fazer, senão colocar bolsa de água quente e esperar a gravidade fazer seu trabalho, recolocando tudo no lugar. A previsão era a de que os movimentos se normalizassem ao longo do dia, o que, de fato, não aconteceu. À noite, bolsas de água quente melhoraram a situação, mas não o suficiente para permitir a retomada das atividades físicas. Desisti da yoga ontem, desisti da yoga hoje. E nadar, nem pensar.

Tudo isso para dizer que, quando menos se espera, o ano de 2015 ainda consegue deixar sequelas na memória. Ele avisa aos passantes que nada é garantido, que tudo pode acontecer (até mesmo quando se está apenas dormindo) e que tudo (absolutamente tudo) passa.

Inclusive, essa minha inesperada dor no ombro direito. Que assim seja. Assim será. E se a gente não voltar a se falar neste ano de 2015, até 2016.



terça-feira, 29 de dezembro de 2015

A grande bola de cristal

Não sei se esta notícia publicada no hoje no jornal O Globo online faz o seu gênero, mas ela certamente vai agradar àquele sujeito que - estando de férias, desempregado ou trabalhando em ritmo de lentidão pós-natalina - ainda teima em sonhar de olhos abertos com a virada de ano na Times Square, em Nova Iorque.

A notícia em questão ensina que "a principal atração do Ano Novo em Nova Iorque já está recebendo os últimos retoques para sua entrada triunfal nos primeiros segundos de 2016". A atração, no caso, refere-se a uma bola de cristais Waterford (conhecida como a  mais refinada e a mais cara marca de cristais no mundo), que é vertida do alto do prédio One Times Square. Ela perfaz o percurso de 43 metros morro abaixo para, então, permanecer presa a uma altura de 145 metros do chão, "durante um minuto, nos primeiros instantes do ano que se inicia".

Para torná-la um autêntico "Gift of Wonder", segundo os termos do seu projeto original, são necessários nada mais nada menos do que 2.388 triângulos de cristal ajustados à bola. Fora isso, "os cristais customizados, que são criados por artesãos, suportam ventos fortes, chuva e variações de temperatura". 


Quanto a mim, cujo grau de sofisticação é comparável ao de um socozinho na Lagoa da Pampulha, corro e esconjuro esta afronta à verdadeira vocação das bolas de cristal. Em tempos turbulentos como os nossos, bolas de cristal não deveriam voar do alto de edifícios, nem muito menos servir à apreciação coletiva em praça pública. 


Ao contrário dessa mise en scène toda, bolas de cristal são destinadas ao confinamento em uma única mão, de preferência treinada para o ofício da premonição. E mesmo sendo instrumento divinatório dos mais manjados, elas assim deveriam permanecer até o final dos tempos. Do contrário, ocasionarão o desemprego de ciganas avulsas, dessas que atendem em casa, com indumentária própria, sem carteira assinada ou qualquer representação sindical, pela módica quantia que um assalariado mínimo conseguiria, mesmo que por puro capricho, pagar.


Por essas e outras, o meu voto hoje vai pela redução do risco de acidentes em eventos público, pela preservação das profissões em vias de extinção e, consequentemente, pela reserva de mercado às ciganas de profissão.


Sem mais para o dia de hoje, fico por aqui torcendo para que a transição do ano de 2015 se faça com toda a doçura e (tudo correndo bem) para algo novo e muito melhor do que o que se viu até agora.



terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Milagre biônico

O olho biônico implantado recentemente em uma cidadã norte-americana no Hospital do Olho da Universidade do Colorado é tão surpreendente que chega a ser difícil de acreditar.

Foram grandes os desafios vencidos para que Jamie Carlye superasse os efeitos deletérios de doença chamada retinite pigmentosa, responsável por prejudicar a visão dos seus dois olhos, além da visão periférica e noturna, até leva-la à cegueira total aos vinte anos de idade. 

Um deles foi implantar  um microchip conectado a 60 eletrodos implantados na retina do seu olho direito. Após uma cirurgia de 5 horas, os médicos conseguiram fazer com que os eletrodos fossem conectados a óculos especial, capaz de transmitir "o que é captado por uma pequena câmera até o seu cérebro". Após a cirurgia, Carlye recuperou a capacidade de ver formas e contraste e pôde experimentar, pela primeira vez, a oportunidade de ver seu filho de 15 anos.

Mas - reza a lenda! - o maior desafio vencido mesmo foi a quitação da fatura de US$150 mil (mais ou menos o equivalente a R$565 mil) cobrada pelo hospital pela cirurgia da paciente. Só que desta vez, não foi ela, a paciente, que teve que tirar o escorpião do bolso. Mas "a equipe médica que operou Jamie, no entanto, afirma que o valor deve ser coberto pelo plano de saúde da americana".

Em terra de cego, quem tem olho biônico ou é rei ou é acionista majoritário de plano de saúde.







quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Insinceridade geracional

Que as gerações vivam lá os seus conflitos de tempos em tempos, isso já é de praxe. Mas bastou mais um daqueles estudos comportamentais de teor duvidoso para colocar em evidência o fosso que divide as gerações da era do impresso das gerações da era digital.

A notícia (para variar) chegou de segunda mão por aqui, devidamente mediada (como sempre) pelos jornais do centro do mundo (no caso, o Washington Post). Publicada no jornal Folha de S. Paulo, ela fala de um estudo da Universidade de Binghamton, conduzido com um grupo de 126 universitários. O intuito da pesquisa era testar "como as mensagens eram recebidas, com e sem ponto final."

A conclusão é estarrecedora: "Quando as pessoas recebiam mensagens de texto encerradas por um ponto, os receptores atribuíam uma maior falta de sinceridade ao texto." E por que cargas d'água um ponto final mudaria toda credibilidade de um texto - e para pior? A explicação da pesquisadora Celia Klin é bastante verossímil, ainda que ela não explique em nada a implicância com o coitado do ponto final.

Para não dizer que a implicância agora é minha, vejam como o percurso do raciocínio é tortuoso. Segundo ela, "mensagens de texto não transmitem a maior parte dos indicadores de sociabilidade usados em conversas presenciais." Ok, fácil concordar. Depois ela prossegue, dizendo que "quando as pessoas falam, elas comunicam informações sociais e emocionais com os olhos, expressões faciais, tom de voz, pausas e tudo o mais". Ok também (e aqui passamos do fácil para o óbvio).

Contudo, a explicação a explicação final mais reforça a importância da pontuação do que explica propriamente a correlação entre pontuação e insinceridade. "As pessoas obviamente não conseguem usar esses mecanismos quando estão mandando mensagens de texto. Então faz sentido que quem receba as mensagens conte com os sinais disponíveis - emoticons, palavras escritas errado de propósito e, de acordo com nossos dados, pontuação."

No fim das contas, a questão que permanece acaba sendo outra: para que caçar confusão, alegando a falta de lógica de um raciocínio para um público que anda duvidando até da idoneidade dos pontos finais?

Vou dormir com essa, mas não prometo resposta matinal.

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

COP das estrelas

A mensagem mais notável para os delegados de 195 países que estão reunidos agora, em Paris, para a Conferência das Partes da Convenção do Clima das Nações Unidas, a famosa COP-21, não veio do Leonardo di Caprio (muito embora este último tenha tentado mandar seu recado ao entrevistar a secretária-executiva da Convenção do Clima da ONU, Christiana Figueres). A grande sensação foi o astronauta americano Scott Kelly, que mandou seu recado ao vivo da Estação Espacial Internacional. 

Os argumentos de Kelly foram contundentes e encontraram respaldo na perspectiva privilegiada de quem compõe um seleto grupo de menos de 550 seres humanos que já tiveram o privilégio de ver a Terra de fora. O número dessas pessoas certamente pode até não ser grande, mas, segundo notícia publicada no jornal O Globo online, "foi o suficiente para registrar os danos causados pela indústria e outros agentes." 

No frigir dos ovos, a mensagem de Scott Kelly tornou-se um chamado à uma consciência ampliada dos efeitos partilhados das mudanças climáticas que o planeta vem passando. Ao se despedir do público com uma cambalhota em microgravidade, o astronauta conseguiu destoar do mar de separatividade e acusações mútuas que costumam permear as polêmicas em reuniões da ONU sobre mudanças climáticas. Segundo ele, "o que afeta a África, afeta a América Norte, que afeta a Ásia. Éo maior problema que o planeta tem que enfrentar."

Verdade, camarada! Vivemos todos em um único planeta e o que afeta o meu vizinho, afeta a mim também. Nem precisaríamos ir tão longe para chegar a esta conclusão, mas, já que você chegou, obrigada por compartilha-la os outsiders do seu seletíssimo grupo de 550 privilegiados.



terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Cosmeticamente contestados

Não me canso de repetir que este mundo em que vivemos é um mundo de paradoxos. Não raro, esses paradoxos vêm travestidos de ironia, como demonstram os exemplos a seguir.

Notícia publicada hoje na Folha de S. Paulo explica como a empresa californiana Imperfect Produce acaba de descobrir um novo filão de mercado: ela vende alimentos "cosmeticamente contestados", isto é, espécimes de legumes e verduras consideradas "feias" ou "contorcidas o suficiente para perder um hipotético concurso de beleza contra similares mais redondas ou mais simétricas."

A ideia por trás do novo filão é que esses legumes e verduras, justamente por não alcançarem um determinado padrão estético (sim, ele existe), são mais facilmente descartados pelas grandes redes de supermercado. A saída, portanto, é tornar o seu aspecto peculiar economicamente atrativo. Um dos supermercados que comprava alimentos feios da Imperfect Produce, por exemplo, chegava a vender esses exemplares por um preço 40% inferior aos de aparência perfeita.

Aparentemente, a estratégia visa também a reduzir o desperdício de comida, o que em si justifica toda a tietagem em cima de um pepino torto ou de cenouras grudadas umas às outras. Difícil é engolir (literalmente) variações em torno do mesmo tempo do combate ao desperdício, como o supermercado  Daily Table, sediado na cidade de Boston, que vende "alimentos embalados com a data de vencimento passada, mas que ainda são seguros (e saborosos) o suficiente para consumo."

Enquanto o alimento feio ou com data de validade vencida é revalorizado na América do Norte, cá embaixo, no País das Mil e Uma Plásticas, a beleza e o luxo associados ao prazer da leitura perdem espaço comercial com o fechamento da Editora Cosac Naify. Conhecida por produzir livros de arte de luxo e com "produção gráfica sofisticada", privilegiando, muitas vezes, livros de difícil consumo.

Moral da história: legumes feios e livros bonitos são privilégios para poucos em um país de contrastes como o nosso, cuja parte expressiva da população considera as cirurgias plásticas como verdadeiras prioridades parceláveis a perder de vista ou financiadas por consórcio.

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Novembro polêmico

Se você gosta de polêmicas, eis aqui uma imperdível!

Todos sabemos que o chamado Novembro Azul é o mês em que várias entidades médicas se mobilizam para promover a conscientização e a prevenção das doenças masculinas e, mais particularmente, do câncer de próstata.

No entanto, uma polêmica entre especialistas divide opiniões que irão transcender - e muito! - a duração do mês de novembro. De um lado, está a Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, que "passou a contraindicar o rastreamento de rotina, por toque retal e dosagem de PSA (antígeno prostático específico) no sangue". De outro, encontra-se a Sociedade Brasileira de Urologia, "que defende o diagnóstico precoce e recomenda que todo homem com mais de 50 anos – ou 45, no caso de negros e pacientes com histórico familiar – façam anualmente os exames."

A divergência de posição está amparada em estudos que apresentam resultados contrastantes. A Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade cita um estudo americano que "conclui que o rastreamento precoce não diminui a mortalidade dos homens". Já a Sociedade Brasileira de Urologia cita dois estudos europeus que afirmam haver uma redução de "até 40% na chance de morrer de câncer de próstata" para aqueles que fazem os exames preventivos regularmente.

Mas a polêmica não fica por aí. Os urologistas alegam erros metodológicos grosseiros no estudo americano (grupo de controle pequeno, avaliado pelo período de 7 anos, considerado relativamente curto quando comparado aos estudos europeus, que lidam com ). Os médicos de família alegam que, para além do estudo americano, evidências clínicas coletadas na última década indicam que "a grande maioria dos tumores encontrados pelo rastreamento não se comporta agressivamente" e que, portanto, não precisariam ser tratados. Para estes últimos, o rastreamento anual levaria ao problema do sobrediagnóstico, já que o tratamento poderia "levar homens saudáveis a complicações como incontinência urinária e impotência sexual". 

Mas há também uma componente, digamos, epistemológica na divergência encontrada. De acordo com o diretor-científico da sociedade de medicina da família, Gustavo Gusso, os "urologistas são formados para tratar a próstata doente, mas não têm treinamento em epidemiologia" e acabam inflacionando os resultados estatísticos. Já os urologistas "rebatem dizendo que os médicos de família ignoram as particularidades do tumor na próstata" e que um diagnóstico tardio pode inviabilizar o tratamento ou levar a uma morte lenta, na qual o paciente experimenta bastante perda de qualidade de vida.

Por enquanto, o fiel da balança tem sido o Instituto Nacional do Câncer (INCA), que adotou "postura semelhante à dos médicos de família", por acreditar que o rastreamento do câncer de próstata "produz mais dano do que benefício." E enquanto não aparecer uma quarta entidade para alterar a relação de forças entre as áreas de conhecimento e seus respectivos profissionais, o exame de PCA continua envolto em tabu e vai sendo ostensivamente evitado pela maioria dos machos-alfa brasileiros. Longe de conhecer a polêmica, esses só querem (perdão pelo trocadilho!) tirar o deles da reta.

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Velório de corvo

Experimentos são situações artificiais em que se busca testar algo, que tanto pode ser um fenômeno, como um artefato ou uma hipótese teórica específica. A amplitude da definição sugere, logo de saída, que existe experimento de tudo quanto é jeito e para tudo quanto é tipo de situação.

Por exemplo, um notícia publicada na Folha de S. Paulo online (mas traduzida do New York Times) de hoje busca entender a reação dos corvos à morte de um ente da mesma espécie. A situação artificial provocada pelo estudo envolve a interação de humanos com os corvos, mas de uma maneira bastante peculiar.

Primeiro, uma pessoa (no caso, a pesquisadora Kaeli N. Swift) atira ao chão amendoim e salgadinhos de queijo para reunir um grupo de corvos. Logo em seguida, uma segunda pessoa (um voluntário ou "cúmplice", nos termos da matéria), se aproxima do grupo com um máscara de látex (acredite: os corvos reconhecem rostos humanos e o estudo exige ano anonimato), um cartaz onde se lê "estudos de corvos UW" (University of Washington) em uma das mãos e um corvo empalhado na outra. A primeira pessoa (pesquisadora) observa e toma notas sobre o comportamento dos corvos a partir da chegada do companheiro falecido, conservado por taxidermia.

Ainda de acordo com a matéria, a pesquisadora em questão e seu orientador, John M. Marzluff, pretendem entender o "modo como os corvos parecem se reunir em bandos ruidosos em volta de colegas mortos". Mas o que pode haver de especial nisso?

Bem, o primeiro achado de pesquisa é um tanto quanto curioso: "Quase todas as vezes os corvos atacaram em bando os voluntários com o corvo morto" (um ataque "apavorante", nos termos da própria pesquisadora). Comparações ajudam a colocar a reação em perspectiva: "Mas se o voluntário estivesse levando uma pomba morta, os corvos só o atacavam cerca de 40% das vezes. E, se o voluntário chegasse de mãos vazias, os corvos simplesmente se afastavam até ele ir embora."

Essas evidências levaram a pesquisadora e seu orientador a concluírem, em artigo publicado na revista Animal Behavior do mês de novembro de 2015, "que os corvos prestam muita atenção a seus mortos para reunir informações sobre ameaças à sua própria segurança". Mas é a interpretação das reações do objeto de estudo que é um atrativo à parte: "A presença de um corvo morto talvez informe aos outros corvos que um lugar específico é perigoso. Os grasnidos altos das aves podem ser uma maneira de compartilhar informações com o resto de seu bando".

De fato, o experimento parece envolver um certo teor de perigo para os seres em observação. Afinal, amendoim e salgadinhos de queijo estão longe de ser uma dieta saudável para qualquer ser humano, o que dizer então para um corvo... 

No próximo experimento, sugiro mudar o cardápio e incluir uma dieta rica em fibras e produtos orgânicos...

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Retrato póstumo

Retratos póstumos. Um deles foi feito para homenagear Antônio Francisco Lisboa, nosso popular Aleijadinho, considerado por muitos como o maior expoente da arte colonial brasileira.

Contudo, à semelhança do seu protagonista, seu retrato está envolto em um manto de mistério e controvérsias. A primeira delas refere-se à autoria do próprio retrato (um "óleo sobre pergaminho", para ser mais exata): inicialmente atribuída ao Mestre Ataíde, ela acabou sendo revista no Séc. XX e finalmente conferida ao pintor Euclásio Penna Ventura.

A segunda controvérsia diz respeito ao próprio caráter póstumo da obra, já que ela fora pintada após a morte de Aleijadinho, ocorrida no ano de 1814. Portanto, a morte de Aleijadinho antecedeu em pelo menos 25 anos a invenção do daguerreótipo, que ficou conhecido como o primeiro equipamento fotográfico fabricado em escala comercial da história.

Ora, se a fotografia enquanto tal ainda não existia - ou, pelo menos, associada a processos de fixação da imagem sobre material razoavelmente perene - a única saída viável para a produção de um retrato fidedigno seria a observação direta do seu referente. Mas como este já tinha passado desta para melhor, fica aqui o cerne de mais uma controvérsia: que cara tinha, afinal, Aleijadinho?

Em depoimento ao jornal Hoje em Dia online, Vinícius Duarte, historiador da Superintendência de Museus e Artes Visuais da Secretaria de Estado de Cultura, reconhece: "Essa obra é muito reproduzida em livros didáticos do Brasil inteiro. Não existe uma referência de como era o rosto de Aleijadinho." Ficamos, pois, com esta espécie de "genérico" do grande mestre do barroco mineiro, feita sabe-se como.

Nada disso, porém, desencorajou os defensores do retrato a reconhecer sua oficialidade em evento realizado hoje, 4a feira, no salão nobre da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, data em que também se comemora o Dia do Barroco Mineiro. Da Assembleia Legislativa, a pintura segue para o Museu Mineiro, em Belo Horizonte, e, de lá, para o Museu de Congonhas.

O mistério em torno de Aleijadinho e sua iconografia, contudo, persistirá ainda por um bom tempo. Afinal, quem, um dia, poderia imaginar que o maior ícone do barroco mineiro - escultor, entalhador e arquiteto de qualidade inquestionável - fora considerado, no seu tempo, um aleijado? E quem, nos dias de hoje, poderia imagina-lo sem rosto? 

"Mas aí você já está pedindo demais", alega o leitor conformado. Concordo plenamente. É muita informação nova para a tradicional família mineira.

terça-feira, 17 de novembro de 2015

Aos Phóbicos

Ei, você aí, que é excessivamente preocupado, ansioso e craque em sofrer por antecipação: está na hora de ir conhecer de perto o drama de Phobos, a maior das duas luas de Marte.

Notícia publicada hoje no jornal O Globo online relata o registro de fendas em sua superfície, identificado pelos cientistas como um efeito da ação da gravidade do planeta Marte sobre a lua: "De acordo com estudo apresentado esta semana durante reunião anual da Sociedade Astronômica Americana (AAS), as longas e rasas fendas em sua superfície indicam que ela já sofre com as forças de maré que deverão despedaçá-la daqui a 30 a 50 milhões de anos".

Aliás, o nome da lua - Phobos - já é uma espécie de piada pronta, ou melhor, um vislumbre do estado de espírito de quem já sofre com o que ainda está por vir. Certo, daqui a 30 ou 50 milhões de anos, você não estará mais aqui. Porém, até para sofrer por antecipação, é preciso ter paciência. Afinal, se a lua, de fato, se aproxima cada vez mais de Marte em função da ação da gravidade deste planeta, é bom registrar que isso só acontece na proporção de 2 metros a cada século.

Sabida mesmo é a Astronomia, que ensina que sofrer por antecipação não é tarefa para fracos; é preciso rigor e disciplina. É que as catástrofes celestes pedem, acima de tudo, paciência. Fica então a sugestão: na hora em que você se cansar de falar das ameaças de ataques terroristas no Brasil ou do prenúncio de novas barragens se rompendo nas Minas Gerais, pare tudo o que estiver fazendo e olhe para Phobos. De preferência, mude-se para lá!

Aos demais, que preferem viver com a mente em paz e o coração cheio de esperança, recomendo ficar de olho na estreia do filme "Awake - a vida de Yogananda", que relata a vida de um dos grandes difusores da yoga no Ocidente.

No fim das contas, tudo é uma questão de escolha entre o amor e o medo.


quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Raridade

Ah, mutações genéticas! Elas acontecem o tempo todo, mas quando o acaso ajuda, sai de baixo!

Esse parece ser o caso do pequeno povoado de Araras, um distrito que fica a 40 km da cidade de Faina, no estado de Goiás. Araras é conhecida por um recorde mundial: "O povoado é recordista mundial na prevalência do xeroderma – uma para cada 30 pessoas. No mundo, a doença afeta uma para cada 250 mil". 

O xeroderma pigmentoso é descrito como uma extrema sensibilidade ao sol, a tal ponto que as células da pele acabam sofrendo mutações provocadas pela radiação UV. O resultado disso é sentido na pele (literalmente) pelos habitantes de Araras: "O acúmulo delas causa manchas, escurecimento, engrossamento da pele e aumenta mais de mil vezes a chance do aparecimento de vários tipos de câncer."

Com uma taxa de incidência dessa monta, Araras não poderia jamais passar despercebida dos geneticistas interessados em mutações humanas de toda espécie. Segundo Carlos Menck, professor titular da USP e especialista no reparo de DNA, as mutações de Araras são fruto do que ele chama de "azar dos azares": "o encontro geográfico de duas famílias não correlacionadas, que fundaram o povoado, cada uma carregando uma cópia alterada de um gene."

Em consequência disso, os ararenses devem "evitar ao máximo a exposição ao sol e utilizar um potente filtro solar com uma enzima reparadora de DNA." Devem também, na medida do possível, vencer o isolamento geográfico e procurar consortes em outra freguesia, evitando assim casamentos consanguíneos. 

Bem, se irão buscar isso ou não, já é outra história. Mas fato é que Araras tem hoje motivos para acreditar que está melhor do que no passado, mesmo diante da fatalidade de uma doença considerada raríssima. É que até bem recentemente, "muitas pessoas achavam que a doença era contagiosa e que seria fruto de doenças venéreas, como sífilis, de seus antepassados". A Genética, contudo, provou que não.

terça-feira, 10 de novembro de 2015

Criança travessa, futuro incerto

Uma prova cabal do quanto nossa percepção nos engana é a distância existente entre a sensação térmica que experimentamos na epiderme e o aumento real da temperatura média da Terra nos últimos anos.

Se nos fiássemos na sensação de calor dos últimos dias, os termômetros teriam acusado temperaturas médias pelo menos 100 vezes mais altas do que o normal  - se é que se pode chamar as temperaturas dos últimos vinte anos de "normais".

Mas a verdade dos cálculos oficiais atestam um aumento infinitamente mais tímido do que a nossa vã filosofia. Em notícia publicada hoje no jornal O Globo online, o escritório britânico de meteorologia, Met Office, afirma que, "pela primeira vez, a temperatura média da Terra está mais de 1 grau Celsius superior à registrada antes da Revolução Industrial".

Mesmo objetivamente menor do que a sensação percebida subjetivamente, o aumento desregulado da média mundial pode colocar o planeta em risco: "De acordo com os cientistas, o aumento da temperatura média da Terra não pode chegar a 2 graus Celsius, sob o perigo de o homem perder o controle sobre o clima do planeta".


Para chegar a esta conclusão, o Met Office driblou a dificuldade de se conseguir dados objetivos das temperaturas em 1750 - período em que teve início a Revolução Industrial e, consequentemente, o uso de combustíveis fósseis - observando a média das temperaturas registradas entre 1850 e 1900, as quais "são mais conhecidas e acuradas."


Mas o rol de "notícias quentes" não para por aí. "Estima-se que, nos próximos meses, esta diferença será até superior, devido à combinação entre as emissões de carbono e o impacto do fenômeno climático El Niño." Some-se a isso o fato de que, neste ano de 2015, está se formando um El Niño de proporções inéditas, conforme declaração do diretor do Centro Hadley do Met Office, Stephen Belcher: "Um forte El Niño está se desenvolvendo no Oceano Pacífico, e ele provocará um impacto sobre a temperatura global."


Para coroar "de glória" nossa percepção sensorial do calor, parece que a coisa vai se complicar ainda mais no ano de 2016: "os cientistas acreditam que 2016 também está se configurando como um ano muito quente. É provável que nele a temperatura média da Terra também fique acima de 1 grau Celsius em relação aos índices vistos entre 1850 e 1900".


Diante das evidências apresentadas pelos climatologistas e da possibilidade de que estejamos caminhando a passos largos rumo a mudanças de grandes proporções climáticas, fica uma breve e singela lição: com o El Niño não se brinca; nem muito menos com os efeitos dos gases-estufa.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Paradoxos da vigilância

Paradoxos: o universo está cheio deles. Uma parte deles cruza os ares e ameaça a segurança psíquica da Terra. Outros, rastejam pela terra e ameaçam a integridade física das crianças.

Dentre os que cruzam os ares, está o WT1190F, "um objeto espacial detectado no início do mês [que] está em rota de colisão com a Terra, com queda prevista para o próximo dia 13," a 65 Km ao sul do Sri Lanka. 

Mesmo sabendo que ele "tem entre um e dois metros de diâmetro" e que "deve queimar por completo durante a entrada na atmosfera do planeta", há um interesse destacado da parte dos astrônomos em acompanhar de perto sua rota nessas próximas duas semanas. A razão é simples: o WT1190F possibilitará uma oportunidade ímpar de treinamento para situações de risco, isto é, uma "oportunidade inédita de acompanhamento e [para] testar planos de esforços coordenados para uma situação de perigo real".

Ainda assim, sabe-se pouco do WT1190F. Acredita-se que ele seja oco e, possivelmente, um destroço de algum corpo artificial, como pedaços de foguete ou painéis perdidos em missões espaciais anteriores. Pouco importa: "a descoberta do objeto a apenas um mês do impacto indica a importância de se aumentar os esforços para a identificação de corpos que apresentem riscos de colisão."

A outra ponta do paradoxo, aquela que esteja pela terra, está localizada aqui mesmo nesse nosso Brasilzão de dimensões continentais. Mesmo rastejando, acabou interceptada pelas mãos de uma criança de 1 ano e cinco meses, que vive com os pais na cidade de Mostardas, no Litoral Norte do Rio Grande do Sul.

A ameaça, contudo, só foi detectada mesmo pela mãe da criança, que viu o pequeno Lorenzo mordendo a cobra, jp´com sangue na boca e nas mãos. "Percebi que ele estava muito quietinho e fui ver se alguma coisa havia acontecido. Mas ele já estava na sala, e com a cobra na boca, mordendo ela!"

Após o susto, a cobra foi retirada das mãos e boca da criança, mas acabou morrendo logo em seguida. Levado ao Hospital São Luiz, Lorenzo foi examinado e ficou em observação durante duas horas, até ser destacada a hipótese de intoxicação. 

Criança sã e salva, cobra morta, susto redobrado: chegou-se a pensar que se tratava de uma cascavel, tida como a cobra que mais mata no Brasil. Cascavel ou não, quando se trata de crianças, a necessidade de vigilância é redobrada. De qualquer forma, as duas pontas do paradoxo da vigilância não deixam de convidar à reflexão: tanto esforço para controlar as situações de perigo que grassam pelo universo afora e ainda nem conseguimos vigiar nem nosso próprio quintal.

De qualquer forma, em ambos os casos, quando a falha humana se apresentar, a recomendação deve ser a mesma: vigiai e orai!

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Panspermia criacionista

Esqueçam a sopa primordial, aquela cheinha de aminoácidos que teriam dado origem à vida na Terra. 


O cometa Lovejoy resolveu mudar o cardápio e propor uma explicação diferente para o surgimento da vida na Terra: "Um estudo sobre a composição química do cometa Lovejoy forneceu aos cientistas informações que reforçam a teoria da panspermia, de que a vida teria surgido na Terra graças ao impacto de asteroides". Ou seja, a vida pode não ter sido gerada na própria Terra, mas provavelmente trazida pelo asteroides.

Mais interessante, contudo, é saber quem andou levando a melhor sobre a da sopa de aminoácidos na teoria do surgimento da vida no nosso planeta: "Por meio da análise espectral da atmosfera do corpo celeste, os pesquisadores descobriram 21 diferentes moléculas orgânicas, incluindo grande quantidade de álcool etílico (o mesmo encontrado em bebidas) e glicolaldeído, um tipo de açúcar".


Sabendo-se que os cometas são corpos congelados que remontam à formação do Sistema Solar, uma análise da composição química do cometa Lovejoy não poderia dar margem às dúvidas: o mundo pode ter sido gerado em meio a uma autêntica rave. "Nós descobrimos que o cometa Lovejoy estava liberando a quantidade equivalente de álcool em ao menos 500 garrafas de vinho por segundo durante o pico de atividade — disse Nicolas Biver, do Observatório de Paris, na França, e líder do estudo publicado na sexta-feira na revista 'Science Advances' ".


Na verdade, temos que elevar as mãos ao céu por termos tido a oportunidade de sermos povoados com vinho e bombom. Em situações adversas, cometas como o Lovejoy podem liberar líquidos bem menos nobres que o vinho: "Cometa Lovejoy é um dos mais brilhantes e ativos cometas desde o Hale-Bopp, em 1997. Ele teve a sua maior aproximação com o Sol no dia 30 de janeiro, quando liberou água a taxas de 20 toneladas por segundo".


Mas, em tempos de tanta desunião, o grande mérito do Lovejoy reside na sua capacidade de conciliar os defensores da panspermia com os criacionistas: afinal, se a vida veio de um sopro de Deus ou nas costas de um asteróide, isso não tem a menor importância. Importante mesmo é saber que o Lovejoy pode passar da água para o vinho, a sua conveniência.










quinta-feira, 22 de outubro de 2015

E o vento levou...

22 de outubro de 2015 há de entrar para a história. 

De acordo com notícia publicada no jornal Hoje em Dia online, o recorde histórico de 105 anos, computados desde que as medições meteorológicas começaram a serem feitas na capital mineira, foi novamente batido em pelo menos duas das estações de medição da cidade.

"De acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), às 16h os termômetros na estação Pampulha chegaram a 37,7ºC." Já na estação centro-sul, estação de referência por ser a mais antiga da cidade, registrou 37,6ºC. A umidade relativa do ar também não estava ajudando nada: ela estava situada na faixa dos 21%, ou seja, muito abaixo dos 60% recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). 

Pouco após o recorde ser batido, uma forte chuva sobreveio à capital mineira, fazendo com que a cidade fosse colocada em estado de atenção. Segundo Heriberto dos Anjos, meteorologista do Centro de Climatologia Tempo Clima/PUC Minas, "o temporal pode causar transtornos por causa dos ventos, que podem ser superiores a 50 km/h."

Às 23h42 do dia de hoje, enquanto escrevo este texto, ventos de índole "tufônica" assobiam do lado de fora do meu lar, levando placas, caixas e objetos deixados ao léu. No rastro da destruição, a minha toalha de banho foi dada como desaparecida. Suspeita-se que ela tenha sido capturada por ventos guerrilheiros fortemente armados e levada pela janela do banheiro. Até o momento, ninguém entrou em contato pedindo resgate, mas tenho fortes suspeitas de que eu nunca mais voltarei a vê-la. 


Se, realmente, a toalha que o vento levou não volta mais, o que então ele há de me trazer de novo?

Vão se as toalhas, ficam as metáforas de vida.

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

2015 TB145

Parece piada pronta, mas pode virar o roteiro do filme trash do ano. Fica ao gosto do freguês: notícia publicada hoje no jornal O Globo online anuncia passagem de um "asteroide de grandes proporções" às vésperas do Halloween. 

"Batizada 2015 TB145, a rocha espacial foi descoberta apenas no último dia 10 de outubro e tem diâmetro estimado em cerca de 470 metros". No entanto, prossegue a notícia, não há muito o que temer com sua aproximação: "De acordo com os cálculos da Nasa, o asteroide chegará a 499 mil quilômetros do planeta, ou cerca de 1,3 vez a distância média da Lua, no ponto de maior aproximação, previsto para a madrugada do dia 30 para 31 de outubro, e não há perigo de colisão com a Terra."

Com isso, quem pensava em arranjar uma boa desculpa para antecipar o feriado prolongado de Finados vai ter que inventar outra coisa. Claro, sempre restará um átimo de esperança enquanto estivermos vivos e em plena capacidade de amar. Afinal, até agora, "
o 2015 TB145 é a maior rocha espacial conhecida a se aproximar de nosso planeta até 2027." 

Mas ainda assim, o caso demanda prudência e o afastamento de ilusões de grande monta: o asteroide em questão tem pouco mais de um quilômetro de diâmetro, ou seja, dez vezes menos do que aquele outro, cuja colisão com a Terra colaborou para a extinção dos dinossauros há 65 milhões de anos.

Ou seja: com sorte, muita sorte mesmo, uma possível colisão daria para extinguir, quando muito, algumas lagartixas e outros invertebrados de pequeno porte, mas certamente não acabará com as baratas, aqueles seres asquerosos que, segundo as más línguas, vem sobrevivendo no Universo desde o Big Bang.

sábado, 17 de outubro de 2015

Progressividade

Desculpe a curiosidade, mas o que você estava fazendo entre 13h e 14h de hoje, dia 16 de outubro de 2015?

Eu, por exemplo, neste mesmo horário, reclamava com o dono de uma comida a quilo aqui perto que quase não estava conseguindo comer com este calor. E ele me respondeu: "Nem eu. De vez em quando eu vou ali, coloco uma coisinha ou outra no prato, mas dizer que eu tenho vontade, assim, de comer, eu não tenho".

Bem, se você não fez nada demais, não tem a menor importância. No entanto, você  certamente deve se lembrar de que hoje fez um calor medonho, desses que deixam a gente prostrada, pedindo água gelada em baldes. Mas saiba que,  se você viveu algo similar neste intervalo, seus lamentos não eram infundados: o recorde histórico de calor foi batido aqui hoje na Roça Grande. 


Foi esta notícia publicada agora à noite no jornal Hoje em Dia online que fez soar o alarme: "Belo Horizonte bateu recorde de temperatura entre as 13h e 14h desta sexta-feira (16) Segundo o Centro de Climatologia Tempo Clima/PUC Minas, os termômetros registraram 37,4ºC, na região da Pampulha, ultrapassando o recorde anterior de 37,1ºC, marcado no dia 30 de outubro de 2012". Mas isso não é tudo: "A umidade no local também é crítica, apenas 12%", avisa.


Além de fazer suar, obviamente, o novo recorde nos coloca em guarda contra a progressividade do desconforto. Até quando teremos novos recordes de calor? Quando virão as chuvas? Até quando quando Eduardo Cunha no poder?

Enquanto essas e outras perguntas desconfortáveis não são respondidas, deixo aqui meu registro do por-do-sol de um dia que entrou para a história.  A foto é minha. O desconforto é nosso.







quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Recidiva

"Recidiva" é o termo comumente empregado para descrever duas realidades distintas. Na área médica, ele é usado para nomear o reaparecimento de uma doença ou de um sintoma, após um período prolongado de ausência. No Direito Penal, ele sinaliza a recaída em algum crime ou falta que já tenha sido anteriormente cometido.

Pois bem: Marlon James, o ganhador deste ano do Man Booker Prize - um dos mais prestigiosos prêmios literários em língua inglesa da atualidade - teria um grande problema em saber se sua obstinação pela literatura seria classificada como "doença" ou "crime". De qualquer forma, ela se enquadraria perfeitamente na definição de recidiva: afinal, quem sobreviveria sobriamente a 78 rejeições de publicação do seu primeiro livro?

Bom, Marlon James sobreviveu! Um trecho da sua entrevista concedida a Rádio BBC 4, que circulou amplamente no noticiário nacional de hoje, dá a dimensão da sua força vontade - e até da falta dela: "Eu tive de sentar um dia e contar [as rejeições] e não sabia que eram tantas. Houve uma época em que eu realmente achei que escrevia o tipo de história que as pessoas não queriam ler. Eu desisti. Destruí o manuscrito e até acessei o computador dos meus amigos para apagá-lo."

E onde entra recidiva? A cada uma das 77 tentativas frustradas ou no momento supremo em que ele conseguiu recuperar o manuscrito, que "sobreviveu na caixa de email de um velho computador iMac, de onde foi resgatado para ser publicado em 2005", sob o título de John Crow's Devil?

Difícil avaliar. Felizmente, recidivas acontecem. Aparentemente, James está sendo premiado este ano por A Brief History of Seven Killings, romance em que o autor narra o avanço da cocaína e da violência política na sua terra natal, a Jamaica. Mas, no fundo, o prêmio só repara uma aparente assimetria de opiniões: ao fim e ao cabo, James teve razão em tentar 78 vezes;  só não teve quando quis desistir.

Ficam aqui a minha reverência à grandeza do seu exemplo e os votos de uma longa e promissora carreira.

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Céu azul, água gelada

Uma brevíssima para descontrair e desopilar o fígado.

A sonda New Horizons, lançada pela agência espacial norte-americana NASA, trouxe a público  hoje novas informações sobre Plutão, o planeta-anão que é ponto final da linha do nosso sistema solar.



Segundo fotos enviadas pela sonda, Plutão tem céu azul e água gelada. Bom, até aí, nada demais. Cabo Frio também tem. Mas este pequeno território mineiro em terras fluminenses não tem a prerrogativa de estar situado no Cinturão de Kuiper, região longínqua do nosso sistema solar onde esta localizado o pequeno planeta vermelho. 

"Quem teria esperado um céu azul no Cinturão de Kuiper?", indagou Alan Stern, chefe da missão New Horizons.

Difícil imaginar. De qualquer forma, se a mineirada resolver baixar por lá nas próximas férias de janeiro, pode ter certeza de que vai nublar e/ou chover todos os dias, sem exceção.




Sobrevoo

Após breve "folheada digital" no noticiário online do dia, eis que eu dou de cara com a seguinte notícia publicada no jornal Hoje em Dia online: nosso índice de inflação oficial acusou um aumento em 12,98% no mês

Então, "tudo como dantes na Terra de Abrantes" - diriam os mais pessimistas. Bom, nem tudo. A novidade é que, desta vez, o vilão da alta da inflação não foi o tomate, mas o gás de cozinha: "Sozinho, o gás de botijão respondeu por um impacto de 0,14 ponto percentual da inflação no mês, ou por cerca de um quarto do índice no mês. O gás de botijão responde por 1,07% da cesta de consumo das famílias".


Olhando por outro ângulo, a notícia notícia só é ruim para quem não fez votos para se tornar faquir, isto é, para a esmagadora maioria da população brasileira. 

Continuando o sobrevoo pelas notícias do dia, encontro outra notícia, desta vez sobre fóssil de uma espécie de pássaro que viveu há 125 milhões de anos na Espanha. Segundo a notícia publicada no jornal O Globo online, "a correspondência aerodinâmica da rede de músculos preservada no fóssil e aquelas que caracterizam as asas dos pássaros indica fortemente que alguns dos primeiros pássaros eram capazes da proeza aerodinâmica como muitos pássaros atuais".

E mais: a notícia em questão revela que esses pássaros eram capazes de voos de maior envergadura, uma vez que "a análise deste fóssil comprova que alguns pássaros sobrevoavam os grandes dinossauros".


Findo o dia e a leitura expressa, ficando apenas o desejo: será que dava para encomendar uma asa dessas e voar acima da inflação?



sexta-feira, 2 de outubro de 2015

A mente dos bichos

Conhecer a mente dos bichos pode nos ajudar a entender sua aptidão para uma vida social complexa. É o que sugere notícia publicada hoje no jornal Folha de S. Paulo online, que também noticiou o lançamento de novo livro do ecólogo norte-americano Carl Safina.

Aliás, desculpe: vida mental e emocional.

A tese central de Safina no livro Beyond words: what animals think and feel  é "mostrar que é só por preconceito que as pessoas ainda evitam dizer com todas as letras que os bichos também tem vidas mentais e emocionais, às vezes quase tão complexas que as nossas."

Para convencer os leitores do seu argumento, "Safina acompanhou o trabalho de campo de cientistas que estudam mamíferos de vida social complexa: elefantes-africanos, orcas do Canadá e, é claro, os lobos de Yellowstone". Ainda assim, ele não deixou de considerar também, em suas observações, outros animais, como primatas não-humanos, aves, peixes e invertebrados.

Apesar da diversidade de espécies, a conclusão privilegia para a realidade dos mamíferos: "talvez o elemento mais impressionante do comportamento seja a presença de personalidades bem-definidas e muito características entre os mamíferos sociais"

Ponto, portanto, para os mamíferos sociais: além de ter uma vida mental e emocional complexa, eles ainda conseguem ter personalidade definida. Ou seja: a alguns anos-luz de muitos humanos que eu conheço.

Assim sendo, se você gostou do argumento, corre lá e compra o livro, que acaba de sair pela Editora Henry Holt and Company. Se não gostou, mas queria ter uma vida social e mental ativa assim mesmo, talvez seja a hora de considerar uma mudança de ambiente para ir ver elefantes na África, orcas no Canadá ou passar uma temporada longa em companhia dos lobos do Parque Yellowstone. E se for, por favor, volte com mais personalidade do que quando partiu.

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Paraíso digital e utopia

Prosaico esse mundinho digital! Ele é capaz de traçar para seu próprio ambiente prognósticos de um mercado de trabalho tão utópico que deixariam Thomas More totalmente basbaque.

O cenário - que, por sinal, não tem nada de modesto, foi delineado em um programa sobre digitalização exibido hoje na TV Folha. Segundo Luli Redfahrer, colunista da Folha de S. Paulo, "o empregado do futuro irá trabalhar 1 ou 2 dias por semana com muito mais eficiência do que a pessoa que sua sangue e 'se mata' no trabalho".

Neste novo mundo descrito como sendo de alta qualificação e menor número de empregos, parece não haver mais espaço para a exploração: "Você não vai mais sacrificar as pessoas. Trabalhar 6 dias por semana, 10 horas por dia. É muito tempo gasto no trânsito, sentado no escritório", afirma o especialista.

De fato, ninguém parece discordar de que passamos realmente muito tempo nesses dois ambientes. Mas qual seria a base de sustentação para um mundo do trabalho tão isento de sacrifícios? A resposta é dada por Renato Buselli, vice-presidente sênior da divisão Digital Factory da Siemens, em um discurso bastante alinhado com as proposições do colunista da Folha. Para ele, o "crescimento profissional de cada um vai depender ainda mais dos estudos e do aperfeiçoamento". E vaticina: "Educação vai ser mais nobre."

Ora, se o conhecimento há de pesar na balança desse fabuloso mundo do trabalho, você há de pensar que a educação se tornará, finalmente, uma prioridade nos investimentos empresariais e governamentais, certo? Errado! Ainda de acordo com Buselli, a chave do sucesso e da digitalização está assentada em outros "pilares sólidos" que são, a rigor, um "PIB industrial razoável e base automação e TI mais diversificada".

Resta ainda saber onde os profissionais do futuro (isto é, os poucos "eficientes" que não sucumbirem ao progresso da automação dos processos) buscarão os estudos e o aperfeiçoamento necessário para se manter nesse mercado sem sacrifícios.

Pelo visto, em meio a tantas utopias, a educação continua sendo a mais hardcore de todas!
O vaticínio veio do colo


sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Recorde de calor


Olhos parados no horizonte. Já são quase 23h, mas ainda sim a noite trouxe pouco alívio para essa cidade que acaba de ter seu novo recorde de calor no ano batido hoje: 36,9oC.

Nada disso é familiar aos habitantes da Roça Grande. Não conhecemos calores nem frios extremos. Vivemos em uma espécie de meio termo climático que nos torna chatos e exigentes com a meteorologia.

Mal sabíamos que o pior inimigo vem de dentro - e não de fora. Assim é com o calor, tipo de inimigo que se aloja nas entranhas e passa fazer parte do seu ser.  A sensação de frio já vai tão longe que é como se nunca tivéssemos sentido isso antes, como se a vida se resumisse a um suspiro melancólico, desses que deixamos escapar quando sentimos falta de algo que ainda não conhecemos.

Muito bem, senhoras e senhores: com tanta novidade no ar, eu hoje farei um pouco diferente. Não vou reclamar, analisar, nem sequer denunciar. Apenas vou aceitar e agradecer o tempo que faz neste momento. Hoje, um recorde de calor foi batido. Amanhã, ele poderá batido novamente.

Então, para que se preocupar?

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Acima da média

Ei, você aí, que tanto se esforçou para ser uma pessoa diferenciada: caso já não more, chegou a hora de se mudar para a Roça Grande e passar uma primavera bem "acima da média".

6 graus acima da média, para ser mais exata! É o que prevê o técnico de meteorologia da Cemig, Geraldo Paixão, em notícia publicada hoje no jornal Hoje em Dia online: “Usualmente, temos no mês de setembro temperaturas na casa dos 27°C em Belo Horizonte. Este ano, os termômetros devem continuar registrando de 32°C a 33°C”, detalha.

Se, por um lado, o calor de hoje fez os cidadãos da capital mineira soltarem fogo pelas ventas logo no primeiro dia da primavera de 2015, por outro lado, também há que se reconhecer que São Pedro será mais clemente conosco este ano: as chuvas nos farão visitas constantes ao longo da estação. "Previstas com regularidade para todo o período, elas devem começar a partir deste sábado e se alternam, semanalmente, em função da chegada de frentes frias."

Se a notícia das chuvas regulares não refrescaram em nada o efeito psicológico de um calor acima da média, melhor ir desistindo da vida.  Além dos 6 graus acima da média, a alta do dólar somada ao aumento do valor pago pela corrida de táxi entre o Aeroporto John Fitzgerald Kennedy e Manhattan hão de congelar seus sonhos de uma brisa cálida em Nova Iorque neste próximo verão brasileiro: "a corrida de táxi entre o Aeroporto John Fitzgerald Kennedy e Manhattan ficará mais cara durante o horário de rush em dias úteis, segundo o 'The New York Times'. O valor inicial da corrida, sem as taxas, passará de US$ 52 para US$ 56,50".

Contra aquele se alegrou ao gritar "não vai ter copa",  existe também o outro que grita "não ter vai sacolagem em Nova Iorque". Que peninha! Essa primavera está mesmo de derreter o coração!

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Sangue ilegal

Aos que advogam pela popularização da ciência, não custa lembrar: lembrar os erros e abusos da ciência é uma missão moral. Afinal, se não nos lembrarmos das derrapadas passadas, como iremos corrigi-las no presente?

Um exemplo disso são as devoluções de amostras de sangue de povos Ianomâmis, coletadas ilegalmente por instituições de pesquisa norte-americanas nos idos dos anos 1960. Essas devoluções vem sendo mediadas pelo nosso Ministério Público Federal, que vem mediando a devolução "aos índios ianomâmis, nesta segunda-feira (21), [de] 474 amostras de sangue coletadas por cientistas norte-americanos sem consentimento dos índios e sem autorização brasileira, em 1967".

A querela com as instituições de pesquisa norte-americanas começou com a publicação do livro "Trevas no Eldorado", pelo jornalista norte-americano, Patrick Tierney, em 2000. Tierney acusou o geneticista James Neel e o antropólogo Napoleon Chagnon de recolherem, sem consentimento, milhares de amostras de sangue ianomâmi no Brasil e na Venezuela.

Desde então, o Ministério Público Federal vem mapeando, "por meio de uma articulação entre sua Secretaria de Cooperação Internacional e o Itamaraty", a localização das "amostras recolhidas ilegalmente e negociar, extrajudicialmente, com as instituições nos Estados Unidos". Dentre as portadoras dessas amostras, encontram-se a Universidade Estadual da Pensilvânia, o Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos,  a Universidade de Ohio, a Universidade Northwestern e a Universidade da Pensilvânia. De acordo com a procuradora Deborah Duprat, "coordenadora da Câmara do MPF que atua na defesa dos povos indígenas, o Brasil 'não tem nenhuma informação' sobre que tipo de pesquisa foi ou seria feita com o sangue coletado irregularmente".

Apesar da devolução, a responsabilização dos responsáveis pelas coletas parece ser algo um tanto quanto remoto. O geneticista James Neel acabou falecendo em 2000, ano da publicação do livro-denúncia, sem sequer ter sido investigado. Quanto ao antropológo, Napoleon Chagnon, este acabou inocentado pela Associação Americana de Antropologia. Na visão da Procuradora Duprat, "como as coletas foram realizadas na década de 1960, quando não havia leis específicas, não há como punir agora os responsáveis".

A primeira remessa das amostras chegou ao Brasil em abril de 2015, vindas da Universidade Estadual da Pensilvânia. As atuais foram trazidas do Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos. Todas as amostras estão sendo encaminhadas à aldeia ianomâmi localizada em Roraima, para serem enterradas. "Para a etnia, o enterro tem um importante valor simbólico", explica a notícia publicada no jornal Folha de S. Paulo. Nas palavras do líder ianomâmi, Davi Kopenawa, "a terra é nossa mãe, então, tem que devolver para ela".

A única coisa que  jamais terá devolução serão as resultados das pesquisas realizadas com amostras de sangue ilegais dos Ianomâmis. Esses aí, por sua vez, não merecem nem sequer serem lembrados.

sábado, 19 de setembro de 2015

Ignóbeis

A Ciência (com "c" maíusculo) costuma ser sisuda e raramente procura motivos para o riso - a não ser,  claro, que o riso seja seu próprio objeto de estudo.

Não é bem este o caso da 25ª edição do Ig Nobel, cerimônia promovida pela Universidade de Harvard para premiar "estudos que propõem abordagens e teses curiosas e pouco usuais, mas fazem parte da construção do conhecimento." No caso do Ig Nobel, o riso não é necessariamente objeto de estudo dos trabalhos contemplados em 12 áreas do conhecimento, mas uma consequência para quem toma conhecimento deles.

Explico: ao expor o caráter "pouco usual" dos estudos, o prêmio expõe seus autores e coautores ao ridículo, no sentido mais raso do termo - o que, de acordo com o Dicionário Houaiss, vem a ser "aquilo que provoca riso, escárnio ou zombaria". Basta ver o prêmio concedido aos vencedores de cada categoria: "os vencedores recebem um troféu e uma nota de dez trilhões de dólares do Zimbábue (a moeda, extinta este ano, tinha a cotação de 250 trilhões de dólares zimbabuanos por US$ 1) das mãos de verdadeiros laureados". Ou seja: para uma premiação de mentirinha, dinheiro de mentirinha.

Bem, se o objetivo real for mesmo o escárnio coletivo,  que interesse teriam os autores em participarem da premiação? Há, a meu ver, algo de mais insano nessa encenação toda: por mais que estejam presentes as estrelas do verdadeiro Prêmio Nobel, deve haver algo de muito mais sedutor do que simplesmente receber dinheiro de mentirinha da mão dos verdadeiros laureados.

Por fim, mais uma questão instigante levantada pelo Ig Nobel: se as conclusões desses 12 estudos realmente se prestarem ao ridículo, como continuar dando credibilidade aos pareceristas dos periódicos que revisaram esses trabalhos e às instituições que os financiaram?

Se a resposta não parece tão simples, pelo menos o riso há de ser garantido. Segue, logo abaixo, uma compilação dos ganhadores em cada área contemplada no concurso Ig Nobel, de acordo com notícia publicada hoje no jornal O Globo online:

Ig Nobel de Medicina: ganharam Hajime Kimata, diretor do Departamento de Alergia do Hospital Kyouwakai, em Osaka, no Japão, e Jaroslava Durdiaková , da Universidade Comenius, em Bratislava, na Eslováquia. "Kimata descobriu que o ato de beijar influencia as defesas contra alergias provocadas por pólen e ácaros. O estudo de Jaroslava demonstrou ser possível recuperar traços genéticos na saliva trocada durante o beijo".

Ig Nobel de Física: ganhou David Hu, que "descobriu que praticamente todos os mamíferos, não importa o tamanho, demoram o mesmo tempo para esvaziar a bexiga, aproximadamente 21 segundos".

Ig Nobel de Química: o vencedor é Gregory Weiss, que "descreveu uma nova técnica para 'descozinhar' ovos, que poderá ser usada não na culinária, mas no desenvolvimento de novas drogas pela indústria farmacêutica".

Ig Nobel de Administração: venceu Raghavendra Rau, "que descobriu que muitos empresários de sucesso desenvolveram o gosto pelo risco ao vivenciarem desastres naturais durante a infância, mas sem serem afetados diretamente".

Ig Nobel de Economia: a vencedora foi a Polícia Metropolitana de Bangkok, Tailândia, "por oferecer pagamento extra a policiais que rejeitarem suborno".

Ig Nobel de Matemática: quem venceu foi o trabalho liderado por Elisabeth Oberzaucher, "por tentar usar técnicas matemáticas para entender como Mulai Ismail, Imperador do Marrocos entre 1672 e 1727, conseguiu ser pai de 888 crianças".

Ig Nobel de Biologia: venceu Bruno Grossi, que "observou que uma galinha com um peso preso na parte traseira caminha como um dinossauro"

Ig Nobel de Medicina Diagnóstica: venceu Diallah Karim, que "descobriu que sentir dor ao passar por um quebra-molas indica a presença de uma apendicite aguda".
uído sem autorização. 

Ig Nobel de Fisiologia: os vencedores foram Justin Schmidt e Michael Smith, por seus estudos relacionados a dor. "Smith se doou ao trabalho, ao deixar ser picado por abelhas em 25 partes do corpo para descobrir onde as dores são menos (cabeça, ponta do dedo médio e braço) ou mais (narina, lábio superior e pênis) intensas".

Isso é o que eu chamo de observação participante!

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Vestigial

Hoje o dia foi de grandes surpresas. E das boas!

A primeira delas foi a descoberta de pulmão no celacanto, "imenso peixe, remanescente de épocas passadas quando os dinossauros habitavam o planeta". Os espécimes atuais do celacanto são hoje "encontrados em águas profundas do Oceano Índico, na costa leste do continente africano e na Indonésia, se alimentam de lulas e polvos e têm mandíbulas articuladas".  Até sua descoberta em 1938, muitos acreditavam que ele já estivesse extinto.

Mas as boas surpresas não param por aí. Contrariando uma tendência triste na cobertura de ciência no nosso país, o jornal O Globo online resolveu romper o padrão e entrar em contato direto com um dos autores do artigo - o que, por si só, já é uma grande conquista, pois raramente os autores dos estudos divulgados são entrevistados diretamente pelos jornais brasileiros. Fora isso, o artigo do O Globo teve a retidão jornalística de inserir um link para o artigo original, publicado ontem na revista Nature, outro hábito louvável raramente cultivado pela nossa cobertura de ciência.

Por fim, e não menos importante, temos a procedência do pesquisador pesquisado: o paleontólogo responsável, Paulo Brito, é pesquisador da Uerj e líder do estudo - o que também é outra raridade em termos de cobertura de diária de ciência pela grande imprensa, dado que os jornais daqui têm se contentado, via de regra, com os informantes consultados pelas agências de notícias (e isso - pasmem! - mesmo quando há brasileiros na equipe).


A presença de um pulmão vestigial no celacanto diz muito do seu processo de adaptação ao longos de milhões de anos. "Nos fósseis, o pulmão ocupa mais da metade da cavidade abdominal, o que mostra que os celacantos usavam o órgão para respirar. Isso indica que, no passado, esses peixes viviam em águas superficiais, provavelmente com baixos níveis de oxigenação. Na medida em que foram emigrando para águas mais profundas, o pulmão foi dando espaço a uma outra estrutura, uma bolsa gordurosa que ajuda o animal a controlar a flutuação nas profundezas do oceano".

No final das contas, ficou uma grata impressão: mesmo sendo "vestigial", uma cobertura minimamente adequada das fontes científicas não só é desejável, como também plenamente possível. Torçamos, porém, para que esse protocolo mínimo de cobertura das fontes de ciência não tenha o mesmo fim do pulmão do celacanto: ter tem, só que acabou.

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Cabeça móvel


Lembra quando alguém dizia que estava prestes a "perder a cabeça" e fazer alguma bobagem? Pois saiba que, se essa pessoa perder mesmo, vai ter gente de olho no seu corpo: equipe de médicos chineses e italianos, liderados pelos médicos Ren Xiaoping e Sergio Canavero, anuncia para 2017 o primeiro transplante de cabeça da história deste asteroide pequeno que todos chamam de Terra.

Anunciada durante o encontro anual da Academia Americana de Cirurgiões Neurológicos e Ortopédicos, em Maryland (EUA), na semana passada, a cirurgia ainda depende de testes suplementares: "o procedimento só será realizado se testes e pesquisas preparatórias forem bem sucedidas", informam os pesquisadores. A cirurgia está prevista para acontecer na Harbin Medical University (China) e terá como protagonista Valery Spiridonov, um russo de 30 anos de idade, que "terá a cabeça separada do corpo e implantada no corpo saudável de um doador, que tenha tido uma morte cerebral".

 A procedência do doador, contudo, está no cerne dos debates éticos em torno da cirurgia. "Xiaoping, por exemplo, se recusou a dizer de onde viria o doador do corpo." Apesar do relativo grau de incerteza sobre quem será o doador e como ele será trazido até a equipe médica, esta última permanece otimista: "as chances disso funcionar são de 90%, mas é claro que existe um risco marginal. Eu não posso negar — afirmou Canavero".

 Spiridonov, que "sofre de atrofia muscular espinhal, doença degenerativa progressiva e sem cura", parece disposto a correr todos os riscos: "Ele é um homem corajoso, em uma condição horrível. Vocês precisam compreendê-lo. Para ele, a medicina ocidental falhou, não tem nada a oferecer". Vejamos, pois, o que medicina sino-italiana tem a oferecer. Uma coisa, contudo, é certa: uma pessoa prestes a ganhar um novo corpo, certamente pensará duas vezes antes de perder a cabeça.


quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Na Lama

Receita para transformar lama em ouro em pó!

O empresário Roberto Medina encontrou uma forma nada ortodoxa de ficar um pouquinho mais rico. Não, não se trata de vender água no deserto, como podem ter pensado as mentes menos fantasiosas. Ele vai vender lama - pasmem! - daquela mesma em que tantos chafurdaram no saudoso Rock In Rio organizado em 1985.

É a notícia publicada no jornal O Globo online que avisa: "a organização do evento anunciou que vai vender a 'lama sagrada' do terreno original durante a próxima edição do festival, que acontece entre 18 e 27 de setembro". O empresário, por sua vez, se defende, jogando a culpa na demanda: "Todo santo dia encontrava alguém que me pedia lama", afirmou ele em entrevista ao Portal Uol. Dito e feito: "a lama foi recolhida com baldes pela equipe de Medina, que ainda se diz impressionado com essa 'doideira' ".

Fato é, prezado leitor, prezada leitora, que, doido ou não, o homem deixaria qualquer alquimista no chinelo. Com a venda do seu novo produto, muito ouro haverá de migrar para o seu bolso, já que "o exótico souvenir será comercializado nas lojas oficias em pequenos blocos imprensados em placas acrílicas, em quantidade limitadas, custando cerca de R$ 100".

Para fechar com chave de ouro (e sem perder a chance do trocadilho), o produto já chega ao mercado com reputação de raridade: "Com a melhoria na drenagem, as mudanças de local e a instabilidade do clima, as imagens de 1985 não se repetiram nas edições seguintes".

Lama nunca mais. Mas se tiver de seer, que vire logo ouro em pó!