UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: junho 2013

sexta-feira, 28 de junho de 2013

IRIS

A semana finda e, com ela, a minha esperança de que esta tivesse sido uma semana mais calma. Ledo engano: o chão continuou estremecendo sob os nossos pés, a cabeça rodou, o fígado se exaltou, os ombros e o pescoço se contraíram, o coração pediu descanso. Tarefa urgente: está na hora de pensar nas próximas férias!

Foi com o espírito de quem anda sonhando com uma rede à sombra que li esta notícia sobre o lançamento do IRIS, um "telescópio espacial para começar a desvendar os segredos da baixa atmosfera do Sol, região desconhecida onde se formam os ventos solares que castigam a Terra regularmente" (http://www.hojeemdia.com.br/noticias/ci%C3%AAncia-e-tecnologia/nasa-lanca-telescopio-espacial-para-estudar-atmosfera-solar-1.140753).

Pelos próximos dois anos, caberá ao telescópio IRIS (acrônimo de "Interface Region Imaging Spectrograph") uma tarefa que me pareceu de razoável importância: desvendar a origem dos ventos de mudança que tanto nos assolam. Com o novo telescópio, acredita-se ser "possível melhorar a previsão sobre as tempestades magnéticas que se dirigem para a Terra e que são um fator de perturbação para a rede elétrica".

A intenção é boa, mas o desafio é bem maior. Muito provavelmente, com ou sem a ajuda do telescópio IRIS, os perturbadores ventos da mudança continuarão revirando nossas vidas e caminhos. Mas de todas as lições que estão por vir, eu hoje vou preferir a tão almejada leveza de que falam os versos do Mário Quintana:

"O que o vento não levou

No fim tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas
que o vento não conseguiu levar:
um estribilho antigo
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha um dia o próprio vento..."

Boa noite para quem fica, pois minha bateria já arriou há muito tempo.

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Detox inteligente


Quanta contradição neste mundo!

Há alguns meses, muito foi falado em defesa das internações compulsórias para dependentes químicos que vinham sendo executadas pelas autoridades de cidades como São Paulo e Rio de Janeiro (http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2013/05/sp-tem-primeira-internacao-compulsoria-de-dependente-de-crack.html). Até o dia em que um censo da Defensoria Pública da cidade do Rio de Janeiro revelou que a maioria dos moradores de rua não bebe nem usa drogas (http://odia.ig.com.br/noticia/rio/2013-05-16/censo-mostra-que-maioria-da-populacao-de-rua-nao-bebe-ou-usa-drogas.html).


Fato notório: o vício anda de mãos dadas com as contradições mal resolvidas. Não é para menos que as autoridades da Coreia do Sul estão cada vez mais preocupadas com uma adequada gestão do vício como forma de coibir determinados comportamentos tido como desviantes. O que não se podia imaginar, no caso desse país, era que os Smartphones, os famosos "telefones inteligentes", gerariam tamanha dependência a ponto de justificar uma intervenção enérgica da parte do governo local. 

As estatísticas estão lá para provar que a questão passou da esfera escolar para a de saúde pública: em um país cuja taxa de conectividade é mais alta do mundo, a constatação de que "quase 20% dos jovens estão 'viciados' em seus smartphones" já começou a preocupar especialistas dessas duas áreas (http://www.hojeemdia.com.br/noticias/ci%C3%AAncia-e-tecnologia/coreia-do-sul-quer-combater-o-vicio-dos-jovens-por-seus-smartphones-1.139516).

São sintomas de dependência dos tais telefones inteligentes: "ansiedade ou depressão quando não podem ter os aparelhos em mãos, tentativas frustradas de diminuir o tempo gasto com o aparelho e sensação de felicidade quando se está conectado". Isto porque, "80% dos estudantes sul-coreanos com idades entre 12 e 19 anos tinham um smarthphone (sic!) em 2012, o dobro do índice de 2011. Além disso, aproximadamente 40% dos donos desses aparelhos passam mais de três horas por dia no Twitter, conversando ou jogando, apesar de os professores apreenderem os celulares antes do início das aulas".

Mas a mais contraditória das contradições foi citada pelo ex-professor Kwon Jang Hee, um dos líderes de uma espécie de brigada nacional coreana contra o smartphone. Ele diz que "a rede de escolas Waldorf, nos Estados Unidos - cuja unidade do Vale do Silício, na Califórnia, é uma das escolas mais populares entre os pais que trabalham no Yahoo! ou no Google - aposta em um enfoque menos tecnológico e proíbe o uso de computadores em suas dependências".


Inspirados pelos californianos, as autoridades sul-coreanas apostaram em outro rol de atividades para recuperar sua juventude do vício dos telefones inteligentes: elas sugerem "uma parceria dos ministérios da Saúde e da Educação com as escolas, que organizariam cursos para prevenir a dependência da internet e acampamentos de férias para 'desintoxicar' os alunos viciados".

Com tanta contradição no ar, vou encerrando o assunto sem resistir ao trocadilho infame: "depois de usar burramente seu celular inteligente, nada como um Acampamento Waldorf Detox para voltar a ser gente". 

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Drones

O encontro perfeito é quando aquilo que você está buscando também está buscando você.

Se a máxima for mesmo verdadeira, então confesso ter dificuldades para imaginar o que seria do meu encontro com um drone - aqueles aparelhos voadores com câmeras acopladas que estão sobrevoando as vastas multidões que tomaram as ruas pelo país afora (http://canaltech.com.br/noticia/videos/Drone-e-usado-para-gravar-imagens-areas-de-protesto-na-cidade-de-Sao-Paulo/).

Sim, meus caros, os drones estão em nosso encalço. Também conhecido como vants (veículos aéreos não tripulados), os tais drones ficaram populares por apresentarem um corte de custos considerável na geração de imagens aéreas das manifestações populares: de acordo com um levantamento feito pelo site G1 em março deste ano, acredita-se hoje que, "em uma estimativa conservadora", cerca de 200 drones estejam voando pelo país.

Se nos fiarmos na notícia publicada hoje no jornal O Globo online, a estimativa passará de conservadora para liberal em dois tempos: "Basta fazer uma busca em um site de compras brasileiro para encontrar diversos modelos completos, cujos valores variam de cerca de R$ 400 a R$ 15 mil, e kits ou peças para fabricação própria" (http://www1.folha.uol.com.br/tec/2013/06/1299253-com-preco-acessivel-uso-de-drone-civil-cresce-mas-exige-cautela.shtml).

Mas não vá pensando que a tarefa é das mais fáceis: registrar encontros humanos genuínos, em tempos de crise, exige noções básicas de aeromodelismo. " 'Tem muita gente comprando drones hoje e que acaba fazendo coisas perigosas, como voar sobre pessoas', diz Eric Bergeric, diretor da empresa idrone.tv, que faz filmagens aéreas com veículos que ele mesmo constrói. 'Imagina se um equipamento de 5 kg cai na cabeça de alguém. É um perigo', diz".

É isso mesmo: viver e encontrar são atitudes muito perigosas. Mas o que iremos fazer? Ao menos reconhecer que os 5 kg de parafernália eletrônica, devidamente acelerados pela gravidade, provocarão, indubitavelmente, um encontro e tanto! 

terça-feira, 18 de junho de 2013

Sopa de aminoácidos

Quer explicar o que é cálculo político para uma criança de 5 anos, de forma clara e eficiente? Basta analisar as posições oficiais que os poderes Executivo e Judiciário de Minas Gerais vêm tomando com relação à onda de protestos que assola todo o país.

O exemplo dos protestos de rua é ilustrativo e demanda pouco poder de abstração, facilitando o entendimento até das crianças mais crédulas.

De um lado, temos o governador Antonio Anastasia que, "apesar de ter convocado a imprensa nesta terça-feira (18) para falar sobre os protestos populares no Estado", acabou chovendo no molhado ao reafirmar "o compromisso com a defesa da livre manifestação pacífica dos cidadão" (http://www.hojeemdia.com.br/minas/governador-defende-a-realizac-o-de-livres-manifestac-es-pacificas-no-estado-1.136740).

De outro lado, temos o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que "manteve a liminar do governo de Minas que impede sindicatos de bloquear o trânsito durante a Copa das Confederações". Ou seja, "o desembargador Antônio Sérvulo negou recurso impetrado pelo sindicato da educação e da Polícia Civil e manteve a proibição de protestos nas 853 cidades do estado" (http://oglobo.globo.com/pais/novo-protesto-fecha-avenida-proxima-ao-estadio-do-mineirao-8728969).

"Como explicar tamanha disparidade diante do direito de livre manifestação?", perguntaria uma criança lactente minimamente curiosa. Simples: o ocupante de um cargo é eleito por voto direto do povo e o outro, não.

Agora, se quiser descobrir qual dos dois cargos é o eleito por voto direto - e, portanto, mais afeito aos interesses eleitoreiros - eu passo a vez. Sinto muito, mas eu teria de regredir no estágio evolutivo humano e chegar ao estado primário da vida na famosa "sopa de aminoácidos": só assim para explicar o óbvio de maneira tão simples.

Centrífuga

Chacoalha, mundo, chacoalha!

E eu, que tinha prometido ontem que este blog deixaria de ser notívago, não pude conter meus dedos, minhas juras de disciplina e resolvi jogar minha reputação na lama. Em termos mais práticos, "reputação na lama" significa tão somente desdizer o dito de ontem. Diante de tanta coisa acontecendo, não pude me conter e cá estou eu no teclado, testemunhando os acontecimentos.

Na verdade, quando eu acordei, o mundo já estava de pernas para o ar. Nas redes sociais, chovia convocatórias para as manifestações contra a Copa das Confederações em BH, São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. Uma amiga, que mora na cidade do México, falava esta manhã de um terremoto ocorrido durante a noite anterior. Um amigo, com quem almocei hoje, relatava o desaparecimento da irmã mais nova desde a 5ª feira passada.

Pelo visto, o mundo entrou em ebulição.

Até a Roça Grande, paraíso das ovelhas brancas que pastam no curral das dinastias políticas locais, resolveu arregaçar as mangas e ir à luta. Diante de tanta coisa nova, só tenho que desejar meus parabéns! Ainda existe alguma esperança de politização para esta cidade.

Enfim, vou me deitar, incerta do que vou ler sobre a cidade no café da manhã. De qualquer forma, o dia de amanhã promete! Vai ser hora de encarar as sequelas das lutas desta noite. Antes de ir dormir, no entanto, vou deixar aqui postado um vídeo que mostra o início dos confrontos entre a Polícia Militar e os manifestantes da Roça Grande. O mérito de ter encontrado este vídeo - postado por Jéssica Alves - não é meu. Ele foi postado antes no link: http://www.bhaz.com.br/video-mostra-momento-exato-do-inicio-do-primeiro-confronto-entre-pm-e-manifestantes/.


Fonte: http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=9rWSaMMlzso.

Boa noite para os que ficam.

Assinado,

A notívaga!


domingo, 16 de junho de 2013

Tempo de mudanças

É verdade, caros amigos: acabei dando um sumiço geral na última semana.

Desde a semana passada, profundas mudanças se impuseram na minha rotina, algumas delas com impacto direto na redação de comentários para este blog. Um novo contrato, mais horas de trabalho, mais horas no trânsito, mais trânsito nas ruas, menos qualidade no transporte coletivo: o resultado desta conjunção de fatores foi a opção por acordar às 5h para estar no trabalho às 8h.

Em função desta alteração, decidi não mais escrever à noite, quando chego em casa daquelas atividades físicas que garantem (mínima e timidamente) minha sanidade mental. Por mais que a escrita seja uma atividade que me dá um imenso prazer, existe um ônus na aventura. Por exemplo, a seleção da(s) notícia(s) que seria(m) matéria-prima de cada comentário, em função das minhas atividades diárias, acabava começando depois das 23h. Não raro, postava só saía depois de 1h. E o resultado final estava bem longe de me encher de orgulho: comentários de conteúdo duvidoso, ortografia delirante, frases inacabadas, várias "pescadas" em cima do teclado e muito, muito cansaço acumulado.

Reconheço que escrever por teimosia é um antídoto poderosíssimo contra a acomodação dos neurônios e, certamente, um dos desafios mais divertidos que procurei pela vida afora. Mas as condições mudaram. Desafio é bom, desde que não ameace a saúde. No meu caso, estavam seriamente abalados minha saúde e meu respeito à língua pátria de Machado de Assis.  

Diante isso, e munida de uma sensatez ímpar da qual raramente me vejo acometida, resolvi que este blog voltaria ritmo de postagem dos seus primeiros tempos e deixaria de ser notívago: vou tentar escrever enquanto tem sol brilhando acima de nossas cabeças. Vai ser duro encontrar tempo em meio às atribulações diárias para ler e destilar a ironia necessária para a sobrevivência intelectual nos dias atuais - a prova disso foi minha inatividade ao longo de quase toda a semana passada - mas vou topar esse desafio por algum tempo, até encontrar um meio termo.

No mais, Gerais. Um excelente semana para todos e (espero) até breve!

P.S.1 = Parto sempre do pressuposto otimista de que, afora o leitor acidental que acaba caindo ocasionalmente de paraquedas neste blog, somente os muito amigos são capazes de me ler seguidas vezes.
P.S. 2= A decisão de escrever durante o dia começa a valer a partir de 3a feira, porque hoje, domingo, é véspera de dia santo: dia de jogo do Brasil na Copa das Confederações. E quem há de impedir que os fiéis velem pelo seu santo do pau oco preferido, o futebol?  

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Apaziguamento compulsório

Você, pessoa honesta e trabalhadora que acordou hoje cedo, balangou de um lado para o outro em um ônibus lotado e saiu de lá agradecendo aos deuses por ter chegado inteiro ao trabalho: muito boa noite! A notícia que foi publicada na edição do jornal Folha de S. Paulo online de hoje é para você ir dormir mais apaziguado(a) consigo mesmo(a).

A notícia é a seguinte: o fator previdenciário, que é a "fórmula que incide no cálculo da aposentadoria que reduz a aposentadoria de quem se aposenta cedo", vem piorando à medida que a expectativa de vida dos brasileiros aumenta (http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2013/06/1292399-para-se-aposentar-com-mesmo-salario-trabalhador-deve-contribuir-por-mais-7-anos.shtml).

O cálculo do fator previdenciário leva em consideração a idade e o tempo de contribuição, impondo reduções de cerca de, pelo menos, 30% do valor total do salário no momento da aposentadoria para aqueles que decidem se aposentar antes do limite de idade estabelecido em lei, mesmo tendo contribuído pelo tempo mínimo regulamentado (35 anos para os homens e 30 anos para as mulheres).

Em outros termos, isto significa que um homem que "tiver média salarial de R$ 1.000, terá só R$ 698 de aposentadoria". Ou seja: ele receberá cerca de 30% a menos do que recebia no momento da aposentadoria. Este cálculo é válido para a média de idade e de tempo de contribuição dos homens no país: "54,8 anos de idade e 35,2 de contribuição". Na prática, isto significa também que o trabalhador que quiser manter o mesmo nível salarial terá de trabalhar mais alguns anos depois de ter cumprido 35 anos de contribuição.

Com as mulheres, a situação consegue ser ainda pior. A  mulher brasileira, "com idade média de 51,9 anos na concessão do benefício (e 30 anos de pagamento ao INSS), teria de esperar, e contribuir, até os 59 anos. Ou seja, sete anos e um mês a mais. Caso contrário, o corte aplicado pelo fator será de 38%".

Isto posto, pouco tenho a acrescentar, exceto no tocante ao "apaziguamento" de que falei logo nas primeiras linhas. "Afinal, quem há de dormir em paz com uma notícias dessas?", perguntam, estarrecidos, o meu caro leitor e a minha cara leitora.

Ora, dormirão em paz todos aqueles e aquelas que já estão porventura inseridos no mercado de trabalho formal e que poderão contar com uma aposentadoria dentro dos moldes da lei. Os demais, se não morrerem de morte morrida (acidente de trânsito) ou morte matada (por arma de fogo), terão outro direito: o de sonhar com o dia em que terão a honra de terem 30% ou 38% na redução de algum benefício.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Rei lagarto

Sim, pesquisadores têm lá seus hábitos. E também suas preferências musicais.

Por conta de ambos - hábitos e preferências musicais - um grupo de paleontólogos americanos da Universidade de Nebraska-Lincoln acabou fazendo uma homenagem singular: batizou de Barbaturex morrisoni uma espécie extinta de lagarto que viveu há 40 milhões de anos atrás, em reverência ao cantor Jim Morrison, vocalista do (também extinto) grupo The Doors (http://oglobo.globo.com/ciencia/lagarto-gigante-batizado-em-homenagem-ao-cantor-jim-morrison-8602908).

Em termos de preferências musicais, a inovação pode até não ser lá grandes coisas, mas o saudosismo é. Os pesquisadores do estado de Nebraska foram buscar inspiração em uma banda ícone dos anos 1960 para a indexação deste espécime gigante de lagarto que, com seus dois metros de comprimento 28kg de peso, podia ser considerado o "rei dos lagartos". "Escutei muito The Doors durante a investigação. E Jim Morrison era o rei dos lagartos, tudo coincidiu", afirma Jason Head, responsável pelo estudo, em referência à canção "The Celebration of the Lizard".

Em contrapartida, quando o assunto é hábito, aí a inovação é grande. É que homenagem de paleontólogo é peculiarmente distinta do que acontece corriqueiramente na vida cotidiana dos leigos. Enquanto estes buscam homenagear um ancestral (esteja ele vivo ou morto), dando o nome dele a um recém-nascido, no campo da ciência, dá-se o nome de alguém mais novo (esteja ele vivo ou morto) a um fóssil antigo.

Mas isto é um detalhe menor. O importante, no fundo, é que a cadeia das homenagens prossiga ininterruptamente. Mesmo se um dia os paleontólogos não tiverem outra saída criativa a não ser inverter o processo: o que equivaleria a descolar um cantor qualquer para homenagear o fóssil de um "rei leão".

Enquanto isto não acontece, fiquemos com a canção que deu origem ao nome.


Fonte: http://youtu.be/m2kkaJWeFWo. 

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Macacaquices

É chinês - e não africano - o fóssil mais antigo de um primata de quem se tem notícia: "Uma equipe internacional de paleontólogos anunciou a descoberta de um esqueleto, praticamente completo, de um pequeno primata que viveu há 55 milhões de anos, no início da era Eoceno. Trata-se do fóssil de primata mais antigo encontrado com tamanha qualidade de preservação" (http://oglobo.globo.com/ciencia/fossil-mais-antigo-de-primata-encontrado-na-china-8600727).

Pronto!

Por hoje é só.

Já posso ir dormir?

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Anticonstitucionalissimamente

Homologias têm lá sua utilidade. Em uma dada comparação, elas são capazes de  ressaltar relações de equivalência entre dois corpos sem, com isto, pressupor total semelhança entre eles.

A meu ver, somente uma homologia daria a dimensão da perda pela qual a língua alemã acaba de passar. Segundo notícia publicada hoje no jornal Folha de S. Paulo online, "o idioma alemão perdeu sua mais longa palavra graças a uma mudança numa lei de conformidade da União Europeia (UE)" (http://f5.folha.uol.com.br/estranho/2013/06/1289438-alemanha-abandona-uso-de-sua-palavra-mais-longa.shtml).

A palavra em questão é "Rindfleischetikettierungsueberwachungsaufgabenuebertragungsgesetz" e havia sido introduzida no Estado de Mecklenburg-Oeste Pomerania, em 1999, para significar "lei que delega monitoramento de rotulação de carne". Guardadas as devidas proporções (coisa que a homologia sabe fazer muito bem), é como se a língua portuguesa perdesse, da noite para o dia, a palavra "anticonstitucionalissimamente" pelo simples fato de não mais existir Constituição.

No caso alemão, as mudanças no cenário jurídico da União Europeia, particularmente no que se refere à regulamentação de testes em gado de corte, forçaram o abandono do termo. Ainda segundo a notícia, a palavra, com seus 64 caracteres, "foi criada para ser usada no contexto dos esforços para combater a chamada 'doença da vaca louca' ", mas que "depois que a UE pediu o fim dos testes em gado saudável nos abatedouros europeus, a palavra saiu de uso".

A tese do desuso jurídico é, sem dúvida, aquela que mais ecoa na versão "oficial" dos fatos. Mas uma versão fantasiosa, que acabo de fabricar, sugere que o abandono é resultado da pressão exercida pelos usuários do Twitter, principalmente os usuários gagos: basta repetir a palavra duas vezes e pedir desculpas logo em seguida que lá se vão todos os caracteres disponíveis e um novo tweet deve ser composto.

Pelo sim, pelo não, tenho certeza de que as crianças em idade de alfabetização também se beneficiarão imensamente pelo desuso jurídico. 

terça-feira, 4 de junho de 2013

Regra e exceção

Duas matérias publicadas hoje nas versões online de dois jornais de repercussão nacional colocam em perspectiva duas formas distintas de lidar com a herança dos nossos antepassados.

No jornal Folha de S. Paulo online, notícia evidencia estudo do campo da Antropologia Física põe em destaque um legado do processo evolutivo que, em princípio, teria nos demarcado dos macacos. Digo "em princípio" porque o foco da notícia é justamente o resquício de uma marca que mais nos aproxima do que propriamente separa dos primatas: "cerca de 8% da população têm flexibilidade maior da planta do pé, comparável à de macacos que vivem nas árvores", relata (http://oglobo.globo.com/ciencia/parte-da-humanidade-dobra-os-pes-como-macacos-que-vivem-em-arvores-8576475).

A herança evolutiva teria, inclusive, sido confirmada por dois estudos diversos. O primeiro deles, de autoria dos médicos Jeremy de Silva e Simone Gill, foi publicado na revista American Journal of Physical Anthropology. O segundo estudo é assinado por Robin Huw Crompton, da Universidade de Liverpool (ainda que a publicação em anais de pesquisa ou em periódicos não seja explicitamente mencionada). De qualquer forma, ambos os estudos convergem neste mesmo ponto: algumas pessoas têm os ligamentos da planta do pé mais flexíveis do que outras e que isto seria um traço conservado de antepassados em comum com os macacos.

De forma muito mais autocrítica, a questão da herança colonial é colocada em xeque nos museus de países como a Alemanha, Estados Unidos e Grã-Bretanha, que "que começaram a receber reivindicações de repatriação de restos humanos", conservados nestes mesmos museus (http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2013/06/1288666-museus-devolvem-restos-mortais-roubados-de-antigas-colonias.shtml).

"Muitos dos museus do mundo, especialmente os de história natural, ciência, medicina e arqueologia, possuem restos mortais humanos", explica a matéria. Por trás das demandas de repatriamento dos restos mortais, questionamentos profundos sobre a preservação da dignidade dos mortos e o sobre o direito de seus herdeiros de enterrá-los segundo seus costumes.

Neste contexto, a divulgação de "novas diretrizes éticas para museus sobre o tratamento a ser dado a restos mortais" pela Associação Alemã de museus, em abril deste ano, é mais uma iniciativa na senda daquelas tomadas por outros museus como o Instituto Smithonian, de Washington, que "começou a repatriar ossadas de indígenas americanos no final da década de 1980" e, "restos mortais humanos à Austrália" em 2008 e 2010.

Como já era de se esperar, este movimento de repatriamento encontra resistência entre pares: para a socióloga Tiffany Jenkins, autora de Contesting Human Remains in Museum Collections, "o perigo é que os museus deixem de explorar porque terão outras prioridades" e que "há toda uma gama de pesquisas que estão deixando de ser feitas porque envolvem questões delicadas demais."

De maneira muito oportuna (ainda que não com a ênfase merecida), a matéria conclui, ressaltando o medo que as demandas de repatriamento vêm despertando no meio museológico: "devolver restos mortais provoca mal-estar entre os museus, receosos de que essa repatriação possa intensificar também as reivindicações de devolução de objetos de arte saqueados."

Moral da história: regra e exceção são conceitos altamente voláteis no contexto das ciências pós-coloniais. Para muitos curadores, museólogos e cientistas, é até concebível repatriar restos mortais de indivíduos que, na maior parte das vezes, não passaram de indigentes disponíveis para a admiração pública. Mas devolver objetos (saqueados, via de regra) que encerram, a um só tempo, valor histórico, estético e monetário, bem, aí já é pedir demais. Para ver esta exceção se tornar regra, é bem provável que tenhamos que esperar ainda um tempo considerável - suficiente, talvez, para que os 8% de humanos com plantas dos pés flexíveis deixem de ser exceção e se conformem à regra.