Homologias têm lá sua utilidade. Em uma dada comparação, elas são capazes de ressaltar relações de equivalência entre dois corpos sem, com isto, pressupor total semelhança entre eles.
A meu ver, somente uma homologia daria a dimensão da perda pela qual a língua alemã acaba de passar. Segundo notícia publicada hoje no jornal Folha de S. Paulo online, "o idioma alemão perdeu sua mais longa palavra graças a uma mudança numa lei de conformidade da União Europeia (UE)" (http://f5.folha.uol.com.br/estranho/2013/06/1289438-alemanha-abandona-uso-de-sua-palavra-mais-longa.shtml).
A palavra em questão é "Rindfleischetikettierungsueberwachungsaufgabenuebertragungsgesetz" e havia sido introduzida no Estado de Mecklenburg-Oeste Pomerania, em 1999, para significar "lei que delega monitoramento de rotulação de carne". Guardadas as devidas proporções (coisa que a homologia sabe fazer muito bem), é como se a língua portuguesa perdesse, da noite para o dia, a palavra "anticonstitucionalissimamente" pelo simples fato de não mais existir Constituição.
No caso alemão, as mudanças no cenário jurídico da União Europeia, particularmente no que se refere à regulamentação de testes em gado de corte, forçaram o abandono do termo. Ainda segundo a notícia, a palavra, com seus 64 caracteres, "foi criada para ser usada no contexto dos esforços para combater a chamada 'doença da vaca louca' ", mas que "depois que a UE pediu o fim dos testes em gado saudável nos abatedouros europeus, a palavra saiu de uso".
A tese do desuso jurídico é, sem dúvida, aquela que mais ecoa na versão "oficial" dos fatos. Mas uma versão fantasiosa, que acabo de fabricar, sugere que o abandono é resultado da pressão exercida pelos usuários do Twitter, principalmente os usuários gagos: basta repetir a palavra duas vezes e pedir desculpas logo em seguida que lá se vão todos os caracteres disponíveis e um novo tweet deve ser composto.
Pelo sim, pelo não, tenho certeza de que as crianças em idade de alfabetização também se beneficiarão imensamente pelo desuso jurídico.
A autora criou esse blog para divagar sobre o que lê diariamente nos jornais, com foco principalmente (mas não exclusivamente) na cobertura diária de ciência. Suas principais armas são a ironia de inspiração machadiana e um computador bacaninha (ela tirou o escorpião do bolso e comprou um de verdade). Ao citar alguma passagem, por favor, dê créditos para a autora: até para as grandes bobagens o direito autoral é inalienável.
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