UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: agosto 2016

sábado, 27 de agosto de 2016

Ondas S

Senhoras e senhores: não é só na superfície política do nosso país, ou nas terras belicosas do Oriente Médio, que as coisas andam tumultuadas.

Cientistas japoneses acabam de registrar, pela primeira vez na história deste planeta, a ocorrência de um microssismo onda S, que é também conhecido como microssismo em onda secundária. 

Mas o que vem a ser isto?

Microssismos são tremores muito fracos. Os microssismos onda S, além de fracos, são lentos, com ocorrência em uma faixa de frequência entre 0.05 e 0.5 Hertz. Eles "se movem apenas através de rochas", contrastando, portanto, com os microssismos onda P,  que "se movem rápido" e podem ser detectados durante grandes furacões. Os onda P são aqueles que os animais conseguem reconhecer um pouco antes de um terremoto.

A novidade, segundo estudo publicado na Revista Science desta semana, é que um microssismo onda S, "um raro e profundo tremor de terra", teve localização rastreada em uma tempestade oceânica entre a Groenlândia e a Islândia. Denominada "bomba climática", a tempestade, apesar de potente, é de pequena amplitude, mas vai ganhando "força à medida que a pressão aumenta".

Rastreada com o auxílio de equipamentos sísmicos posicionados em terra e no fundo do mar, o estudo "detalha como os pesquisadores rastrearam a direção e a distância até a origem das ondas, e os caminhos que elas percorreram", aumentando nosso conhecimento sobre "a crosta mais profunda e a estrutura do manto superior".

E o que de bom, metaforicamente falando, podemos concluir disso tudo?

Que a potência de uma tempestade na superfície pode esconder outros abalos, tanto mais profundos e de velocidade ainda mais lenta, a ponto de permanecer praticamente imperceptíveis aos nossos olhos.

Um consolo (se é que há algum) é que os microssismos de onda S podem nos ajudar a conhecer melhor e mais profundamente as nossas camadas mais internas.

Sem mais para o momento, despeço-me sob protestos, protestos, protestos...

terça-feira, 23 de agosto de 2016

Lotes premiados

Findas as Olimpíadas Rio 2016, fica aqui aquela perguntinha: o que ficou realmente disso tudo foi ressaca ou emoção?

Um pouquinho de ambos, talvez. Principalmente depois de sabermos que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) suspendeu hoje, dia 22 de agosto, dois medicamentos de extrema importância para o públicos dos Jogos Olímpicos de 2016: "A decisão, publicada no Diário Oficial da União, veda a distribuição, comercialização e uso de alguns lotes específicos de remédios como o Rivotril e Lexotan, fabricados pela farmacêutica Roche". 

O motivo da intervenção tem a ver com a qualidade - e, consequentemente, a eficácia - dos medicamentos dos lotes RJ0792 e RJ0899 do Rivotril (Clonazepam, 5 mg) e o lote RJ0613 do medicamento Lexotan (Bromazepan, 6 mg): "Segundo a Anvisa, foram detectados índices insuficientes em resultados de testes in vitro que simulavam a absorção dos comprimidos pelo organismo – o que pode estar relacionado uma possível falha na fabricação."

Diante desta revelação, os motivos de ressaca e emoção serão vários. Para aqueles que se tornaram contumazes consumidores desses produtos farmacêuticos durante os Jogos Olímpicos, haverá muita emoção quando descobrirem que andaram comprando medicamentos dos lotes "premiados", isto é, com defeito de fábrica. E um pouco de ressaca, certamente, ao perceberem que andaram tomando um placebo sem qualquer eficácia, justamente quando mais precisou deles. 

Mas a emoção, certamente, terá a última palavra. Quando você se der conta de que foi, de fato, um fortuito comprador dos medicamentos dos lotes supracitados, então você realmente merecerá seu bônus "emoção" pós-encerramento: não é todo mundo que consegue administrar, por méritos próprios, a carga emocional imposta pelo acompanhamento diário e constante das finais de cada modalidade.

Se este foi o seu caso, então parabéns: é sempre uma alegria estar vivo, mesmo sabendo que comprou medicamento caro, de tarja preta e com eficácia limitada. E Jogos Olímpicos, bem... felizmente eles só acontecem de quatro em quatro anos. Até Tóquio 2020, você se recupera... 

Ou não, como diria Caetano.

Mais motivos para sorrir? Confira a história das Olimpíadas 2016 em memes


quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Os trinta por cento

Esta é para quem tem assistido aos jogos olímpicos confortavelmente refestelado(a) na sua poltrona, perguntando a si mesmo(a) como é que aquelas jogadoras de vôlei de praia conseguem manter aqueles 2% de gordura corporal....

Notícia publicada hoje no jornal online Hoje em dia aborda estudo que promete tirar a paz de espírito daqueles que curtem muito mais ver do que fazer esportes. O estudo, coordenado por Mikael Rydén, do Instituto Karolinska, "aponta que a gordura de pessoas obesas - mesmo aquelas que são consideradas metabolicamente saudáveis - apresenta mudanças anormais em sua expressão genética na resposta à estimulação por insulina".

Até então, acreditava-se que cerca de 30% das pessoas obesas tinham perfil metabólico e cardiovascular saudável. Isto porque "uma das marcas da obesidade metabolicamente saudável é a alta sensibilidade ao hormônio insulina, que promove a captação da glicose do sangue pelas células para ser usada como energia".

Publicado hoje na revista Cell, o estudo proposto por Rydén e sua equipe pretende, contudo, jogar uma pá de cal sobre a suposta linha divisória entre a obesidade saudável e a nada saudável. Para mostrar como a definição de "obesidade saudável" é problemática, os pesquisadores realizaram o sequenciamento genético de amostras de tecido de gordura abdominal de outras 15 que nunca foram obesas (o famoso "grupo de controle") e outras 50 pessoas obesas, todas elas candidatas a cirurgia bariátrica. Destas últimas, 21 eram sensíveis à insulina e 29 resistentes a ela.

Como já era de se esperar, houve diferenças consideráveis entre os resultados do grupo dos obesos e o daqueles que nunca foram obesos. Contudo, os resultados dos que foram previamente identificados como obesos sensíveis e resistentes à insulina, isto é, obesos saudáveis e não saudáveis, foi bastante parecido: "A gordura dos resistentes à insulina e dos sensíveis à insulina apresentou padrões praticamente idênticos de expressão genética na resposta à estimulação por insulina". 

Com isso, o estudo sugere que nem mesmo os obesos saudáveis merecem trégua, desbancando a crença de que "eles precisariam de intervenções menos vigorosas para prevenção das complicações relacionadas à obesidade".

Cansado de tanta notícia ruim sobre sua forma física? Então corra (modo de falar, claro!) e vá ler sobre as dez melhores polêmicas das Olimpíadas Rio 2016. Mas aproveite enquanto é tempo: as Olimpíadas acabam em breve e, então, teremos todos que arrumar outra fonte de polêmicas e de desculpas para continuar no sofá.

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Um ministro e as Perseidas

Desculpem, mas está difícil não bater na tecla das diferenças de gênero nesses últimos tempos.

Sim, temos o que comemorar: Mayra Aguiar, do judô feminino, emplaca mais uma medalha, de bronze desta vez, para o Brasil. Aliás, duas das três medalhas do Brasil até agora foram conquistadas por atletas do judô, uma modalidade na qual o desempenho feminino não é tradicionalmente exaltado.

Mas uma coisa é fato: o atual ministro da saúde, Ricardo Barros, poderia ter poupado este dia de júbilo de uma declaração tão inglória sobre diferenças de gênero no uso do Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo ele, os homens procuram menos o SUS por "uma questão de hábito, de cultura, até porque os homens trabalham mais, são os provedores da maioria das famílias e não acham tempo para se dedicar à saúde preventiva."

A escorregada (feia!) na casca de banana se deu quando o ministro resolveu interpretar - e comentar! - de livre e espontânea vontade, uma pesquisa realizada pela Ouvidoria do Ministério da Saúde, para a qual foram entrevistados 6.141 homens cujas parceiras haviam feito parto pelo SUS. De acordo com o dados da pesquisa em questão, 31% dos homens entrevistados "não têm o hábito de ir às unidades de saúde para buscar auxílio na prevenção de doenças."

Curiosamente, ao se pronunciar sobre estes dados, o ministro acabou omitindo outros tão ou mais relevantes para entender (de verdade!) as diferenças de gênero no uso dos serviços públicos de saúde: "a maioria, ou 55%, justifica que 'nunca precisou', ou seja, que procura mais somente em casos urgentes e não para prevenção e cuidados contínuos." E mais: apenas 2,8% dos entrevistados alegaram que o horário de funcionamento dos serviços de saúde é um impeditivo para o seu usufruto.

De posse desses dados, sugiro ao ministro em questão uma profunda reflexão sobre seu lugar no universo, quiça sob a visão inspiradora da chuva de meteoros que cairá na próxima madrugada nas proximidades da Constelação de Perseu. Mas cuidado: como muitas de nós ficamos petrificadas com tamanha ignorância, é bem capaz de o semideus descer do firmamento para cortar-lhe a cabeça, a semelhança do que fez com a Medusa.


terça-feira, 9 de agosto de 2016

Fazendo as pazes

Depois do olé que as brasileiras estão dando no campo de futebol e nos tatamis do judô, nesse início de jogos olímpicos, nada mais conveniente do que uma pesquisa que fale sobre as diferenças de gênero no esporte, certo?

Bom, se for para levantar ainda mais polêmica sobre as supostas diferenças, então a resposta é "sim". Notícia publicada hoje no jornal O Globo online promete acirrar os ânimos que discutem o destoante desempenho  entre a ala masculina e feminina nessas olimpíadas e defendem a qualidade da perfomance do sexo dito frágil: "Homens demonstram mais propensão a se reconciliar após uma situação de embate do que mulheres. É o que sugere um estudo que analisou horas e horas de imagens de atletas se cumprimentando depois de duelos de tênis, tênis de mesa, badmington e boxe."

A pesquisa, que foi encabeçada por pesquisadores da Universidade de Harvard (infelizmente, a notícia não menciona o departamento de origem dos pesquisadores) e publicada recentemente na revista Current Biology, parte de evidências coletadas a partir da análise de "vídeos de atletas de 44 países retirados do YouTube, da Federação Internacional de Tênis de Mesa e da rede social Badminton Link, que reúne jogadores e fãs desse esporte".

As análises apontam para uma diferença sensível entre os gêneros no que tange as reações adotadas pelos dois lados: "homens se tocam por mais tempo e até trocam mais abraços e carícias depois de uma disputa, enquanto as mulheres são menos afetuosas nesses momentos."

Mas o mais interessante ainda está por vir. A também professora da Harvard, Joyce Berenson, usa esses dados para colocar em xeque estudos anteriores, segundo os quais as mulheres são vistas "como o sexo mais interconectado, cuidadoso e emotivo" e mais propensas a interagir "mais fisicamente do que os homens no cotidiano geral". Ao contrário do que se observa nesses estudos, "elas podem ter mais dificuldades para se reconciliar depois de conflitos".

É bem certo que existem perguntas fundamentais sobre a metodologia de pesquisa que precisariam serem respondidas adequadamente antes de entrarmos no mérito da questão. Uma delas, por exemplo, é se as quatro modalidades esportivas escolhidas (tênis, tênis de mesa, badmington e boxe) no estudo são, de fato, representativas do universo esportivo para permitir a generalização das observações sobre diferenças de gênero para as demais práticas esportivas.

Fora isso, existe uma série de pressupostos relacionados com a competitividade feminina que mereciam ser examinados com mais cuidado. É a própria notícia do O Globo que cuida de esmiuçar os pilares da reflexão da pesquisadora Berenson: "De acordo com Joyce Benenson, os humanos são a única espécie que travam embates letais entre grupos, quase sempre compostos por homens. Mas esses confrontos exigem cooperação, o que pode explicar por que homens são capazes de trocar mais facilmente sua postura de confronto, durante uma disputa, para uma titude (sic) de cooperação em seguida, explica a professora". 

As consequências tiradas do alegado espírito de cooperação masculino, contudo, mais parecem confirmar um rol de imagens negativas cotidianamente feitas do gênero feminino do que qualquer outra coisa: "Por outro lado, diz ela, as fêmeas de chimpanzé e as mulheres são menos capazes de se reconciliar e 'apenas se levantam e vão embora' ".

No fundo, os achados de pesquisa terminam por trocar um determinado ideal do gênero feminino - "interconectado, cuidadoso e emotivo" - por uma equação de opostos: o que temos aqui são "homens cooperativos" e "mulheres ressentidas" que agem de forma diferente, parece sugerir o estudo. Isto é, no final das contas, são as mulheres as menos tolerantes, abertas ao diálogo e à superação de conflitos.

Realmente, este é o tipo de estudo que, ao ler, dá vontade de levantar e ir embora. Mas aí vem o pior de tudo: se eu me levantar e for realmente embora depois de ler este estudo, vou acabar reforçando a conclusão do estudo. Deixa para lá. Melhor deixar as nossas divas do futebol e do judô feminino falarem por si só - e responderem à altura.  Há mais cooperação no universo feminino do que julga a nossa vã filosofia.


quinta-feira, 4 de agosto de 2016

Piloto automático

Cansou dessa vida? Do trânsito, das filas, das horas perdidas em engarrafamentos intermináveis?

Então, na próxima encarnação, peça para nascer um pássaro fragata das Ilhas Galápagos (Equador). É que uma equipe de pesquisadores liderados por Niels Rattenborg, do Instituto Max Planck (Alemanha), confirmou uma estranha aptidão desta ave, que chega a voar mais de 3 mil quilômetros, sem interrupção, sobre o Oceano Pacífico.

Com o auxílio de um pequeno aparelho acoplado na cabeça do pássaro, capaz de registrar sua atividade cerebral eletroencefaclográfica, os pesquisadores colheram evidências de que a fragata dorme enquanto voa. 

De acordo com notícia publicada hoje no jornal O Globo, "os resultados mostram que os pássaros ficam acordados durante o dia. Quando o sol se põe, eles param de voar buscando comida e passam a voar de corrente em corrente de ar. Eles entram em sono de ondas lentas por vários minutos inúmeras vezes. Entretanto, os pesquisadores concluíram que os pássaros mantém o controle do voo mesmo com os dois hemisférios dormindo." No entanto, prossegue a notícia, é muito mais frequente eles manterem pelo menos um dos lados do cérebro ativo enquanto voam.

Divulgado recentemente pela revista Nature Communications, o trabalho explica a façanha por meio de mecanismos evolutivos adquiridos pelas aves ao longo do tempo. Foram esses mecanismos que que permitem hoje que elas entrem em sono uni-hemisférico enquanto dormem, mantendo um lado do cérebro em descanso e o outro controlando os movimentos.

Contudo, ainda subsiste um grande mistério no funcionamento do cérebro da fragata. "Mesmo com essa incrível capacidade, as fragatas ainda dormem muito pouco. Em média, 42 minutos por dia. Em comparação, quando em terra, dormem até 12 horas". Mesmo com a compensação em solo, "os cientistas ainda não sabem explicar como eles conseguem operar com tão pouco descanso."

Ou seja: se você decidir voltar mesmo uma fragata na próxima encarnação, não se esqueça de contar o seu segredo para o pesquisador mais próximo. Uma legião de fãs humanos - aliada a uma indústria farmacológica ávida por lucros - estarão loucos para saber como se faz.


terça-feira, 2 de agosto de 2016

Objetos negados

Ok, eu me rendo. Já que estamos às vésperas dos primeiras Olimpíadas realizados no Brasil, vou deixar meu sarcasmo olímpico de lado para falar da festa.

Mas que festa? Vai ter festa?

A julgar pela lista de objetos proibidos na festa de abertura das Olimpíadas, na 6a feira próxima, dia 05 de agosto, no Maracanã, para a muitos, a festa terá acabado antes mesmo de começar. 

"Apesar da grande vontade de registrar os momentos com fotos, bastões de selfie, de acordo com a assessoria de imprensa da Rio 2016, não são permitidos". Segundo a notícia publicada hoje no jornal O Globo, o mesmo vale para "equipamentos profissionais de fotografia e de filmagem."

A dolorosa lista inclui ainda "recipientes e embalagens de vidro, bebidas (alcoólicas ou não), capacetes e equipamentos esportivos - como bolas, raquetes, patinetes e skates (exceto quando usados para locomoção de pessoa com deficiência)", bem como "brinquedos ou objetos que tenham a aparência de armas de fogo, além de balões ou recipientes que contenham qualquer tipo de gás."

Mas calma! A lista ainda não acabou! Não poderão também ser levados ao estádio "apitos, cornetas ou quaisquer objetos que emitam som, como instrumentos musicais ou aparelhos que emitam sinal de rádio. Apenas os animais usados como guias terão o acesso liberado".

Contudo, ainda há esperança, na curtíssima lista das "permissões", para quem busca esnobar o resto do mundo diretamente do local de abertura dos jogos olímpicos: não haverá nenhuma restrição a celulares, mochilas e bolsas. 

Passar a abertura das Olimpíadas sem bebidas, charanga ou pau de selfie, vá lá. Agora, não postar uma selfie no Instagram com a Anitta cantando ao fundo seria, para muita gente, o equivalente à morte. Uma morte que, certamente, os anti-anitta comemorariam!

Em suma, para quem quiser ver a lista completa, aqui vai ela.

E boa noite para quem fica!