UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: abril 2012

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Chanunpa

Bem, bem, bem... Essa foi uma daquelas semanas sujeitas a chuvas e trovoadas, abalos sísmicos e maremotos. Mas sobrevivemos todos, felizes e com o coração pleno.



Amanhã, pé na estrada: outras montanhas!  Aho!

O Armagedon do consumo

Dentre todas as teorias catastróficas sobre o fim do mundo, esta é, sem dúvida, aquela com mais chances de se auto-realizar.

No seminário Diálogos Sociais: Rumo à Rio + 20, "o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, afirmou nesta quinta-feira que o mundo se acabaria, caso todos passassem a consumir bens e produtos da mesma forma que os ricos o fazem" (http://oglobo.globo.com/rio20/o-mundo-se-acabaria-rapidamente-se-fosse-universalizado-padrao-de-consumo-das-elites-diz-ministro-4743842#ixzz1tCgUGUxr).

De acordo com depoimento atribuído ao próprio Carvalho em matéria publicada no jornal O Globo online, "os muito ricos, tanto na sociedade brasileira, como no mundo todo, não praticam desenvolvimento sustentável, uma vez que o excesso de consumismo é inviável. O mundo se acabaria rapidamente se fosse universalizado o padrão de consumo das elites e cá entre nós, o nosso, muitas vezes".

Aliás, a "teoria do fim de mundo pelas vias do consumo" não deixa de comportar um certo teor de fatalismo, pois sabemos muito bem o quanto são magras as chances de "as elites" deixarem de: 1) consumir o que consomem; 2) ser um espelho valorativo para o resto da sociedade. A menos que...

A menos que se atente também para a insustentabilidade do padrão de consumo da classes emergentes, antes mesmo que elas se transformem em "elites" de consumo. Documento apontando "45 curiosidades sobre a nova classe média brasileira", disponível no site do Seminário de Políticas Públicas para a Nova Classe Média Brasileira, revela algumas tendências de consumo desta parcela que representa 50,5% da população do país (http://www.sae.gov.br/novaclassemedia/?page_id=58).

O documento aponta que "a nova classe média não deseja o estilo de vida das elites e prefere produtos que valorizam a sua origem". "Ufa!", diariam alguns. "O Brasil está salvo do fim do mundo".

"Nem tanto", diriam outros. "Em vez dos integrantes da classe média tradicional, que apenas almejavam reproduzir o status dos pais, num universo mais ou menos estático, os da 'nova' classe média têm a ambição de 'subir na vida', viver melhor, consumir mais e, portanto, aprender e se qualificar a fim de gerar a renda consentânea com essa forma de viver".

Ora, esta é apenas uma forma poética de dizer que a Nova Classe Média é mais voraz em termos de seu projeto de expansão dos padrões de consumo do que a classe média tradicional. Pois se hoje a Nova Classe C não consome - e nem quer consumir - como as elites, isto, porém, não significa que ela não venha a consumir como tal, em um futuro não muito longínquo. 

A única esperança contra a possibilidade de um fim do mundo causado pela expansão desastrosa de formas predatórias de consumo reside, mais uma vez, na educação: "Segundo um levantamento da consultoria Data Popular, 68% dos jovens da Classe C estudaram mais que seus pais. Nas classes A e B esse percentual não passa de 10%". Se os padrões de consumo crescem que nem os Gremlins na piscina, há que se considerar o aumento sensível da escolaridade de uma geração para a seguinte possa alterar susbstancialmente este cenário. A menos que...

A menos que a educação formal disponível no mercado de ensino só venha a reforçar o mesmo padrão de consumo das elites atuais. Mas aí estaríamos voltando à estaca zero, com o fim do mundo batendo à porta - só que numa versão sem terremotos, nem tsunamis - mas naufragados numa sociedade totalmente inviável a médio e longo prazo. Nada mal para quem gosta de se "acabar nas compras"...

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Prometeu fazendo arte

Cientistas desvendaram a origem do mito de Prometeu Acorrentado.

Parece história dos tempos de colégio, mas não é. A sonda espacial Cassini, cuja função é vigiar a Lua Prometeu, acabou flagrando um evento inusitado: "uma guerra de bolas de neve" em pleno anel F de Saturno.

Não sou eu quem afirma, mas uma matéria publicada na Folha online de hoje: "Os cientistas que monitoram a atividade da sonda espacial testemunharam quando pequenos aglomerados de gelo avançaram através de um dos principais anéis de Saturno, o anel F"  (http://www1.folha.uol.com.br/bbc/1081249-sonda-cassini-captura-guerra-de-bolas-de-neve-em-anel-de-saturno.shtml).

Sabe-se que o anel F é o mais externo dos anéis de Saturno e que tem em torno de 900.000 km de circunferência. O efeito "guerra de bola de neve" surge justamente quando Prometeu passeia pelo anel F. "A perturbação gravitacional gerada regularmente pela Prometeu gera canais e ondas no anel F. Se sabia que parte das partículas de gelo que se movimentavam devido a esta perturbação gravitacional poderiam se unir, formando aglomerados", que nada mais são do que "bolas de gelo cujo tamanho pode alcançar até um quilômetro". 

Esse mundo anda mesmo mudado! Ao mesmo tempo em que os cientistas que acompanharam as imagens registradas pela sonda acreditam que o registro do evento tenha sido um mero golpe de sorte, todos estão convictos de que a guerrinha de bolas de neve foi obra de Prometeu.

Por essas e por outras, Prometeu deverá passar mais alguns milênios acorrentado, até que a ordem seja restabelecida nos anéis de Saturno.

P.S. = Um pouquinho de imaginação literária na ciência cai bem de vez em quando!

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Azmodan

Sincerologia é a arte de ser sincero quando tudo pesa em contrário. De difícil execução, a arte demanda treinamento contínuo até que esta maravilhosa competência técnica seja plenamente desenvolvida e incoporada ao modus operandi de cada um.

Pois bem: uma versão kamikase da sincerologia é o sincericídio. E aqui peço licença aos amigos Tuca e Rachel pela apropriação indébita de termo tão austero. Sincericídio é a sinceridade abusiva, deslavada, sem papas na língua. O sincericídio é uma forma de suicídio perante a opinião pública, ato  do qual só os mais destemidos (ou inconsequentes) são capazes.

Pois bem, a Folha de São Paulo acabou cometendo um sincericídio de grandes proporções hoje por meio de comentário publicado no "Blog de Tec", um blog dedicado à tecnologia no mundo virtual. O comentário em questão dá voz aos discontentes com a dublagem adotada no jogo (ou "game", na versão dos mais frescos e aversos à belezas da nossa Flor do Lácio) "Diablo 3" (http://blogdetec.blogfolha.uol.com.br/2012/04/24/fas-reclamam-de-demonio-com-sotaque-carioca-em-diablo-3/).

A bem da verdade, não se trata de descontentamento com a tradução como um todo, mas especificamente com o sotaque carioca atribuído ao monstro Azmodan, personagem do jogo. A polêmica é descrita da seguinte forma pelo comentário do blog: "A polêmica surgiu em um post no site oficial da Blizzard, que mostra os primeiros vídeos do jogo dublados para o português. Em meio à elogios, algumas pessoas reclamam do suposto 'carioquês' do personagem Azmodan."

O sincericídio acontece justamente quando os comentários dos descontentes são reproduzidos aos quatro ventos, incentivando novas ondas de protesto da parte dos cariocas no próprio blog da Folha. Pouco importa. O sincericídio já havia sido impetrado: e o erro do blog foi justamente dar vazão a comentários bairristas como os que se seguem:

“caraca!! sotaque carioca pesado no Asmodan, hein? triste. nada contra os cariocas, mas em um jogo que vai ser vendido para todo brasil, deveriam usar sotaques mais neutros…”

“AAAF esse sotaque carioca acabou com o game, é muito puxado jesus, porque vocês não pegaram o sotaque paulista que é o sotaque mais comum do Brasil? WHY GOD WHY?”

Depois do estrago feito, só nos resta a sinceridade como consolo. Primeiro, porque "neutralidade" em sotaque é como cabeça de bacalhau:  dizem que existe, mas eu nunca vi. Em segundo lugar, afirmar que o sotaque paulista é o "mais comum do Brasil" é esquecer que este país é um imenso continente formado por grandes ilhotas culturais, mais ou menos isoladas nas suas próprias referências. E se o sotaque paulista ficou "comum" para o resto do país, isso se deve tão somente ao fato de os programas e novelas veiculados em rede nacional serem produzidos quase exclusivamente no eixo Rio-São Paulo. Finalmente, para o resto do país, sotaque paulista e sotaque carioca são o que são: sotaques de outras regiões, nem melhores, nem piores do que os nossos.

Finda a aula de sincerologia aplicada, vou dormir. Boa noite para quem fica!

segunda-feira, 23 de abril de 2012

A batalha

Hoje é Dia de São Jorge, "um dos mais proeminentes santos militares" na hierarquia dos devotos. "De acordo com a tradição, São Jorge foi um soldado do exército romano e, também, um padre", relata nota publicada na Folha online (http://www1.folha.uol.com.br/paineldoleitor/ultimasdasredessociais/1080158-tuiteiros-comentam-dia-de-sao-jorge-e-convocacao-de-ricardinho-no-volei.shtml).
Tivesse ele escrito a oração que circula em seu nome, teria sido também, além de santo e militar, poeta de primeira. Tão bom que, mesmo sem assumir explicitamente sua verve poética, já conseguiu emplacar sua oração e virar "trending topic" no Twitter.
A oração de São Jorge é uma invocação à proteção divina. A canção de Caetano Veloso é uma ode à lua e aos seus encantamentos. Ironia do destino: no dia de São Jorge, é a lua nova que desponta no céu, supostamente devorada pelo dragão.

Mas pouco importa! O risquinho de lua que sobrou no céu já é mais do que suficiente para eu dançar o meu contentamento e comemorar o desfecho de mais uma batalha.

Salve, Jorge!

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E, aproveitando a deixa, a famosa Oração de São Jorge:

Ó São Jorge, meu guerreiro, invencível na Fé em Deus, que trazeis em vosso rosto a esperança e confiança abra os meus caminhos. Eu andarei vestido e armado com as armas de São Jorge para que meus inimigos, tendo pés não me alcancem, tendo mãos não me peguem, tendo olhos não me vejam, e nem em pensamentos eles possam me fazer algum mal. Armas de fogo o meu corpo não alcançarão, facas e lanças se quebrarão sem o meu corpo tocar, cordas e correntes se arrebentarão sem o meu corpo amarrar. Jesus Cristo, me proteja e me defenda com o poder de sua santa e divina graça, a Virgem de Nazaré, me cubra com o seu manto sagrado e divino, protegendo-me em todas as minhas dores e aflições, e Deus, com sua divina misericórdia e grande poder, seja meu defensor contra as maldades e perseguições dos meus inimigos. Glorioso São Jorge, em nome de Deus, estenda-me o seu escudo e as suas poderosas armas, defendendo-me com a sua força e com a sua grandeza, e que debaixo das patas de seu fiel cavalo meus inimigos fiquem humildes e submissos a vós. Ajudai-me a superar todo o desanimo e alcançar a graça que tanto preciso: (fazei aqui o seu pedido) Dai-me coragem e esperança fortalecei minha e auxiliai-me nesta necessidade. Com o poder de Deus, de Jesus Cristo e do Divino Espírito Santo. Amém!

São Jorge rogai por nós!

sábado, 21 de abril de 2012

Mutatis mutandis

Tempo de mudar o que deve ser mudado. Mudanças sobretudo de perspectiva. Mudanças sutis, feitas na calada da noite da alma, quando ninguém (nem mesmo eu) está olhando. Mudanças mais profundas do que eu sou capaz de entender.
E para brindar a mudança, a recordação feliz de outros tempos de intensas mudanças.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Desaldeados

No assim chamado "Dia do Índio", uma rápida atualização em algumas das nossas noções básicas de demografia brasileira.

Para quem acreditava que os povos nativos deste país ainda vivem distantes dos grandes centros urbanos, uma surpresa: os dados do censo do IBGE realizado em 2010 revelam que eles estão "presentes em 80,5% dos municípios brasileiros", apesar de "uma pequena queda da população indígena na área urbana, que pela primeira vez foi superada pela rural" (http://www1.folha.uol.com.br/empreendedorsocial/1077960-indios-ja-estao-presentes-em-805-dos-municipios-brasileiros-diz-ibge.shtml).

"Com uma população total de 817.963 mil, o número de índios em áreas rurais do país chefa a 502.783, enquanto nas zonas urbanas, o número é de 315.180". Isto significa que, "considerando o número de índios residentes em áreas não isoladas do país", a maior parte dos indígenas viviam, até bem recentemente, nas áreas urbanas do país. E mais: "entre as capitas brasileiras, São Paulo foi a única a apresentar, no Censo 2010, um número superior a 10 mil": foram 11.918 pessoas a se autodeclararem indígenas.

Como nosso método de aferição de pertencimento de cor e raça está calcado na autodeclaração, seguindo orientações da ONU, a presença de expressiva parte da população indígena nas regiões urbanas delimita um perfil pouco conhecido do grande público: a figura do desaldeado, como aquele que se identifica cultural e fenotipicamente com este extrato da população, sem contudo manter o modo de vida de seus antepassados.

Seria pretensiosamente reducionista encarar esses desaldeados como meros "desvios" do ideal do bom selvagem - ou do "mau selvagem", dependendo do livro de história consultado (como, por exemplo, o História Geral do Brasil, de Francisco Adolfo de Varnhagen, conhecido como o "Heródoto brasileiro" e considerado pai da historiografia nacional). A questão da aculturação, conquanto seja um problema real, não pode ser colocado sob o viés de um falso dilema entre regiões urbanas e regiões rurais.

A questão é: existe uma parte importante do contingente indígena deste país que continua vivendo nas cidades, sem com isso romperem totalmente o vínculo identitário com seus povos de origem, já que continuam se considerando (e muito provavelmente são também considerados por terceiros) como indígenas.

Esta constatação nos leva a uma série de questões subsidiárias: o que fazem? Como sobrevivem? Por onde andam? E como são acolhidos pelos não-indígenas nos nossos centros urbanos em pleno Séc. XXI? Certamente, ainda pouco se diz ou se sabe sobre o dia-a-dia dessa nossa ilustríssima minoria "minoritária" - a minoria dentro da minoria - que não vive nem lá, nem cá, preferindo ser o que simplesmente são: uma faceta viva da complexidade cultural desse nosso país.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

O canto do Uirapuru

Quando o Uirapuru canta na floresta, todos os outros pássaros se calam para escutá-lo.

Cravadas no corpo, nossas verdades mais intrínsecas rompem grilhões para voarem livres, solfejando o canto do Uirapuru.

A alma, eternecida, agradece e ouve.

Sagrado momento de me perceber mais humana.

 

Casa de ferreiro...

... espeto de pau!

Notícia publicada hoje na Folha online revela uma fragilidade flagrante dos órgãos de fomento à pesquisa no país: aplicar, indistintamente, os critérios de transparência pelas quais elas velam." Um dos diretores da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) deixou o órgão, na semana passada, após a revelação de que ele estava inadimplente com a própria instituição" (http://www1.folha.uol.com.br/ciencia/1077191-falta-de-prestacao-de-contas-leva-diretor-do-capes-a-deixar-cargo.shtml).

O pior: a inadimplência não é de ontem e já vinha se arrastando há alguns anos, de acordo com a matéria da Folha: "Há seis anos, Emídio Cantídio de Oliveira Filho, diretor de programas e bolsas da Capes, devia esclarecimentos sobre as atividades realizadas com apoio financeiro do órgão".

Ao todo, o funcionário devia explicações sobre o destino de recursos da ordem de R$ 66 mil, recebidos na época em que estava vinculado a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). A assesoria de imprensa da Capes informou ainda que só somente uma parte dos documentos de prestação de contas dos gastos efetuados - referentes a um financiamento de R$ 15 mil - foram encaminhados a instituição no início deste mês.O resto ainda está por vir.

Em tempo: essa história da Capes me lembrou de uma conversa que tive com uma amiga há uns 14 anos atrás. Na época, ela se derramava em elogios ao modo como o povo norte-americano supostamente gerenciava sua vida pública. Mais especificamente, ela enaltecia a maneira como determinadas pessoas, tão logo optavam por uma carreira política, passavam a gerenciar sua vida privada de modo que sua reputação pública não sofresse eventualmente nenhum ataque - mesmo se em um futuro remoto. A lógica, segundo ela, consistia em não deixar os vícios privados arranharem a imagem pública.

No Brasil, ela acreditava que acontecia justamente o contrário: pessoas desonestas, envolvidas em negócios espúrios, tentavam a vida política em busca de imunidade parlamentar. Nesta caso, viveríamos o vício em todas as suas dimensões e os vícios públicos seriam senão uma mera extensão e confirmação dos vícios privados.

Essa história de exoneração de membro diretor inadimplente na Capes suscita uma pergunta que não quer calar: como alguém inadimplente perante uma instituição pode assumir um cargo diretivo? No aguardo de uma resposta satisfatória, ficamos ao menos com uma certeza: quando os vícios são públicos, as virtudes morrem (na) privada.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Um pouquinho de Brasil, iaiá

Paradoxais esses nossos tempos: enquanto especuladores imobiliários fazem rios de dinheiro às custas de uma promessa de Copa do Mundo em 2014 (digo "promessa" porque, segundo rezam as profecias, o mundo pode acabar ainda no final deste ano), as estatísticas da pobreza e do atraso social teimam em bater na nossa porta. E or mais que nos esforcemos em esquecer, sempre surge uma faceta da nossa realidade que para nos lembrar que "isso aqui - ô ô - é um pouquinho do Brasil, iaiá"...

E esse mesmo Brasil que canta também revela estatísticas assustadoras. "Pesquisa elaborada pela Fundação Telefônica/Vivo com 2.398 meninos e meninas de até 16 anos em 2011" no município de Inhapi (Alagoaas) revela que "83% das crianças e adolescentes trabalham" naquela localidade, de acordo com matéria divulgada na coluna "Empreendedor Social" da Folha online (http://www1.folha.uol.com.br/empreendedorsocial/1075003-numeros-mostram-que-o-trabalho-infantil-esta-subdimensionado.shtml).

Só que nem tudo o que canta, "é feliz": segundo a presidente da fundação, Françoise Trapenard, "boa parte deles está no trabalho doméstico e na agricultura, mas há ainda os que atuam em vendas e na produção de carvão". O pior é que a realidade de Inhapi está longe de ser um caso isolado no Nordeste - ou até mesmo no sudeste brasileiro. "Dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), divulgada em 2010 pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), apontavam 908 mil crianças de 5 a 13 anos empregadas no país".

Pertinente mesmo foi formulada por Trapenard ao anunciar os novos projetos da Fundação Telefônica/Vivo para erradicação do trabalho infantil no Nordeste: "'Se o trabalho que enobrece condena o futuro de alguém, ele enobrece quem?'

Mas não se iludam: o problema em Pindorama é bem mais antigo do que a interpretação dos Novos Baianos ou mesmo do que a canção original de Ary Barroso:

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Sexta-feira 13, o mito

Sexta-feira, o mito!

Cresci rindo das pessoas que ficavam de cabelo em pé neste dia. Tanto ri que fiz do 13 meu número da sorte. Até o final do meu celular é 1313.Com isso, passei a vida toda sem ter medo do número 13 e - acreditem - nunca me arrependi deste grande feito.

Mas hoje tive ao menos a oportunidade de matar minha curiosidade e tentar entender o porquê de tanta implicância com esta data: matéria publicada hoje na Folha online tenta fornecer algumas explicações "históricas" para tanto. De uma forma ou de outra, todas elas guardam ligação com o Cristianismo (http://www1.folha.uol.com.br/folhinha/1075344-hoje-e-sexta-feira-13-voce-sabe-por-que-esse-e-um-dia-de-azar.shtml).

A primeira das explicações propõe que a rejeição da sexta-feira 13 tenha ligação com a crença de que Jesus Cristo fora crucificado em uma sexta-feira e no dia 13. Nesta mesma linha de argumento, alega-se que o 13 é também de mau agouro porque foram 13 os participantes da Última Ceia.

Já a segunda explicação estaria ligada ao processo de cristianização dos bárbaros do norte da Europa. No seu processo de abandono de velhas tradições e adoção de hábitos cristãos, os bárbaros passaram a revestir a data com novo significado: "com isso, passaram a espalhar a ideia de que Friga, antes considerada a deusa do amor e da beleza, era uma bruxa que se reunia com feiticeiras, às sexta-feiras, para desejar mal à humanidade" (péssima troca, por sinal; tivessem eles ficado com o amor e a beleza de Friga).

A última das explicações - talvez aquela que tenha mais chances de ter sua veracidade histórica "comprovada" - tem a ver com perseguição religiosa: "Na França, numa sexta-feira 13 de 1307, o rei Felipe IV mandou perseguir os participantes de uma ordem religiosa que não tinham permitido que ele integrasse o grupo".

De todas as explicaões podemos extrair uma base comum: os motivos subjacentes à rejeição da data estão relacionados com eventos funestos ou indesejáveis. Morte, maldade, inveja: o 13 lembra coisas que ninguém lembrar: que o Cristo - que era eterno - acabou morrendo; que as bruxas confabulam nossa desgraça às sextas-feiras; que a rejeição pelo grupo deve ser punida com a morte. São todas "lições" carregadas de sofrimento, vindas de um passado que não queremos ver repetido: por isso mesmo - e muito paradoxalmente! - optamos por esperar tragédias de toda sorte neste dia. Paradoxos do medo e da repetição.

Quanto a mim, tive uma sexta-feira 13 peculiar: meu gás acabou quando ia fazer o café da manhã. Encomendei um botijão de gás, mas como o meu interfone não funcionou, não puderam entregar. Como não sabia que o interfone estava com defeito, esperei 50 minutos pela entrega, até por fim telefonar anulando o pedido. Saí de casa atrasada e sem minhas miligramas diárias de cafeína. Acabei chegando tarde na natação e nadando mil metros a menos do que o desejado. Corri para o trabalho e por lá deixei minha agenda, com anotações imprescindíveis e diversos documentos dentro. Amanhã - graças a Deus, um sábado! - eu volto lá só para pegá-los. E provar que esta história de sexta-feira 13 é balela.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Um minuto

Um minuto apenas. Foi o tempo que durou no ar, antes de o foguete norte-coreano que havia sido lançado na manhã desta 6a feira (ou 5a feira à noite, de acordo com o horário de Brasília), após subir cerca de 120 km e se dividir em quatro, para então cair no mar Amarelo.

"Oficialmente, o foguete, de 30 metros de altura e 2,5 metros de diâmetro, levava um satélite de observação da Terra, o Kwangmyongsong-3 (Estrela Brilhante) para coletar informações sobre as plantações, florestas e os recursos naturais da Coreia do Norte", afirma matéria publicada na Folha online (http://www1.folha.uol.com.br/mundo/1075417-foguete-norte-coreano-e-lancado-e-cai-no-mar-amarelo-apos-1-minuto.shtml).

Extra-oficialmente, no entanto, oOs Estados Unidos e países vizinhos da Coreia do Norte, como a Coreia do Sul, o Japão, a China e a Rússia, acreditam que o exercício espacial encobre um teste de mísseis de longo alcance". Fato digno de nota: a Coreia do Norte acabou unindo contra si desafetos políticos de longa data - como os EUA, a Rússia e a China - de acordo com os quais o lançamento não teria passado de um "teste disfarçado de míssil balístico de longo alcance, que poderia ser o primeiro passo (...) para um teste nuclear".

Bastou um minuto no ar para que o artefato tirasse o sono dos membros do Conselho de Segurança da ONU. Um minuto e nada mais, tal qual certos acontecimentos meteóricos que atravessam nossa vida: basta um breve lapso de tempo para que o artefato produza estragos de longo alcance.

Mas hoje, nem Pyongyang, nem os membros do Conselho de Segurança hão de me tirar o sono. Dormirei, feliz, o sono dos justos: daqueles que viram os destroços do artefato bélico caírem em pleno mar. O sono daqueles que deixam para amanhã o que não poder ser resolvido hoje.

E boa noite!

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Insistente

Enquanto o mundo naufraga na ilusão de inovação constante, ainda há quem opte por recriar o óbvio. Paul Sammut, um norte americano de 25 anos de idade, conquistou um séquito de insones mal-dormidos com sua nova invenção: um despertador insistente, mas TÃO insistente que você só consegue desligá-lo se... estiver realmente acordado! (http://www1.folha.uol.com.br/folhinha/1074100-inventor-cria-despertador-que-obriga-a-acordar-na-hora.shtml).

Se, por um lado, a invenção é dessas que "chove no molhado", por outro ela tem ao menos o mérito de ser mais eficaz do que as versões precedentes: "Quando ele toca, não para mais. Para desligá-lo, é preciso levantar da cama e ir até um painel instalado em outra parte da casa", informa a matéria publicada na Folha online. Aliás, antes que alguém levante a lebre, já vou logo avisando: a insistência do novo despertador é também à prova de sonambulismo: "O barulho só acaba quando se digita um código nesse painel".

Com o novo invento, finda o dilema dos cinco minutos a mais na cama. Não haverá mais espaço para o blefe e o auto-engano. Seu sono terá agora os minutos rigidamente contados. E o Sr Sammut, que é "engenheiro e trabalha no Stevens Institute of Technology" - empresa que lida com projetos e pesquisas com robôs submarinos e veículos - vai chegar pontualmente no trabalho: "o inventor já tem encomendas a serem entregues até julho".

Exemplo perfeito de engenharia em causa própria. E por que não?

Insustentabilidade

Com a proximidade da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (também conhecida como Rio+ 20), o Painel do Leitor da Folha.com quer saber: "Qual ação sustentável você já adotou na vida?" (http://www1.folha.uol.com.br/paineldoleitor/1064505-qual-acao-sustentavel-voce-ja-adotou-na-vida.shtml).

O evento, que acontecerá entre os dias 13 e 22 de junho próximo, é a mola propulsora de uma enquete realizada pelo site: conhecer ideias e projetos que contribuam para um mundo mais sustentável. "Para participar, basta preencher o formulário e enviar seus desenhos, charges, fotos, vídeos e textos narrando ou mostrando suas ações realizadas para um futuro mais verde", informa.

Quanto a mim, meu projeto mais ambicioso de sustentabilidade tem sido bem outro. Não que eu tenha terminado o dia nem mais, nem menos"verde". Mas pelo menos consegui terminar o meu dia sem abalar a insustentável leveza do meu ser - o que já um luxo nesses tempos atribulados.

E para comemorar este feito monumental, Marisa Monte:

Bem leve!

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Hiperrealismo tosco

Cenas de hiperrealismo explícito em plena Sexta-feira Santa: "O ator Thiago Klimeck, de 27 anos, do grupo Traças de Teatro, foi enforcado acidentalmente ao representar Judas no espetáculo Paixão de Cristo no município de Itararé, a 327 quilômetros da capital paulista"
(http://oglobo.globo.com/pais/ator-enforcado-acidentalmente-nao-corre-risco-de-morrer-4517699#ixzz1rbXMjhin).

Por muito pouco, o ator não seguia o destino de Judas Iscariotes, sem nem sequer ter beijado a face do Cristo: apesar de não correr risco de morte, o estado do ator até a manhã de ontem, domingo, era "grave e preocupante", informa matéria publicada no jornal O Globo online.

Sua atuação foi tão convincente que ninguém notou o embroglio no qual ele havia se metido: "Segundo a Guarda Municipal, as pessoas que estavam próximas demoraram um pouco para perceber que algo estava errado e que Thiago estava desacordado. Acharam que a cena estava realista e o rapaz trabalhava muito bem".

É, de fato: pode-se dizer que ele se "dedicou de corpo e alma" à peça. Ou então: que ele "deu seu sangue" no papel.Felizmente, "as pessoas [do público] que ficaram perto de Thiago notaram que ele não se mexia". Um pouco mais de realismo e dedicação e era a própria vida que ele estaria entregrando de bandeja, para o delírio dos fiéis. E então, só mesmo o Cristo - "the original" - para ressuscitá-lo.

domingo, 8 de abril de 2012

Pascoalinas

Um seleto grupo de habitantes da Roça Grande pôde constatar o milagre da ressureição de modo bastante peculiar: viram Elis Regina renascendo na voz de Maria Rita!

Para quem não foi, uma amostra do show (na versão recifense).



(Fonte: http://youtu.be/tC1-KjWcJCs)

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Hábitos e monges

A novela é antiga: pesquisa científica conclui "X", matéria jornalística diz "Y". E nós é acabamos levando gato por lebre.

Estudos experimentais desenvolvidos por um grupo de pesquisadores da Northwestern University, em Illinois (EUA), concluíram que "a forma como interpretamos o valor simbólico da vestimenta pode afetar nossos processos cognitivos" (http://oglobo.globo.com/saude/sim-habito-faz-monge-mostra-pequisa-4488046#ixzz1r8N3WeH9).

Bem, dizer que algo "afeta nossos processos cognitivos" é vago, pois não diz muito da relevância fenômeno já que, virtualmente falando, tudo pode "afetar" nossos processo cognitivos. Mas a questão nem é essa. Resumir experimentos de psicologia comportamental em duas ou três maltraçadas linhas - principalmente quando se trata de apresentar uma área de estudos em expansão, como esta denominada "cognição incorporada" - não poderia mesmo acabar bem.

Não que o princípio teórico não fosse atraente: Adam Galinsky, líder do grupo de pesquisa responsável pelos experimentos, lembra que "pensamos não apenas com nossos cérebros, mas com nossos corpos, e nossos processos de pensamento estão baseados em experiências físicas que provocam conceitos associados abstratos". Ótimo! Quem já leu "A Aula" de Roland Barthes, já tem uma vaga noção do que significa "aprender" com o corpo. E na mesma senda, seguem inúmeros autores, dos reichianos aos biodançarinos, passando pelos yogues e praticantes de meditação ativa. Ou seja, a posição teórica é velha, o que não altera em nada seu valor. No máximo, que a ciência ocidental está revendo alguns dos seus pressupostos básicos, com os quais o Oriente já lida há milênios.

Porém, o bolo desanda justamente quando se pensa em "operacionalizar" esta postura teórica em experimentos de laboratório: "Os pesquisadores, liderados por Adam Galinsky, realizaram três experiências usando jalecos brancos idênticos de médicos e pintores. Em todos os casos, as pessoas que vestiram as peças que seriam dos profissionais de saúde — a quem costuma ser atribuído um comportamento cuidadoso, rigoroso e atento — apresentaram melhores resultados em testes de atenção e percepção visual de erros".

Colocado desta forma, as conclusões ficam, no mínimo, risíveis. Difícil imaginar que o resultado seria o mesmo no Brasil, caso o estudo fosse replicado por essas bandas. É claro que os pesquisadores devem estar cansados de saber que o "significado social de médico" é absolutamente contextual (isto é, varia de grupo social para grupo social). Aliás, admitir que as qualidades atribuídas aos médicos variam substancialmente de contexto para contexto em nada invalida o achado da pesquisa: que "vestimos" as qualidades que percebemos na roupa.

Mas daí a afirmar que "o antigo ditado que nos orienta sobre não julgar as pessoas pela aparência acaba de ser contrariado por um estudo americano, pelo menos no que diz repeito às roupas" é querer forçar um pouco a barra. E a razão é simples: "aparência" não diz respeito somente ao porte de roupa, mas a um conjunto complexo que inclui desde de características fenotípicos (cor e textura do cabelo, da pele, altura, peso, etc) até inscrições e inserções no corpo (piercings, tatuagens, próteses) ao qual a antropologia confere o pomposo nome de "etnicidade". Portanto, reduzir a "cognição incorporada" à apreensão de um único elemento - no caso, a roupa - parece um erro metodológico dos mais graves.

Enfim, fica dúvida se o experimento é realmente besta ou se a "ópera" é que foi mal-resumida pelo jornalista. Mas, como é tarde e a dúvida persiste, decidi entregá-la aos braços de Morfeu para que ele faça bom uso dela.

terça-feira, 3 de abril de 2012

Mistério

Vocês aí que se interessam pelos mistérios da morte e também pelos mistérios da vida, me digam sem titubear: que nome se dá a um ato extremo como este em que uma norte-americana de 80 anos, sem nenhuma experiência de pilotagem, consegue fazer pouso de emergência logo após seu marido ter sofrido um enfarto em plena cabine?

Como ela fez isso? "A partir de instruções por rádio, Helen Wilson fez três tentativas antes de conseguir pousar em Sturgeon Bay, na segunda-feira, apesar de destruir a roda dianteira do avião", revela matéria publicada hoje no jornal Hoje em dia (http://www.hojeemdia.com.br/noticias/mulher-de-80-anos-pousa-avi-o-apos-morte-do-piloto-1.428137).

E para dar emoção ao evento (como se precisasse!), ela provavelmente não teria tido combustível suficiente para ultrapassar a quinta tentativa, pois sua reserva estava chegando ao fim.

Já seu marido, "O piloto, John Collins, 81, foi declarado morto ao chegar ao hospital".

Qual o nome disso? Bravura ou apego desmesurado à vida?

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Aposentadoria

No auge dos seus 70 anos de idade e 50 de carreira musical, a cantora Nana Caymmi anuncia aposentadoria em coletiva de imprensa. A notícia foi dada no Rio de Janeiro, antes de apresentação no Vivo Rio com a casa lotada, o que já é praxe para a cantora (http://www.hojeemdia.com.br/entretenimento/nana-caymmi-anuncia-aposentadoria-durante-show-1.427466).

Dona de uma franquza ímpar, dessas que beiram o destempero, Nana alfineta gregos e troianos ao tocar nos motivos que a levam a optar pela saída de cena: "Já dei o que tinha que dar. Estou me aposentando aos poucos. Tenho 50 anos de disco e ganhei um de ouro. Então eu quero que o mundo se exploda. Hoje a música é outra, é bunda, é aeróbica". Tá certo, Nana, tá certo. O mundo mudou, mas isso não quer dizer que a gente mereça ou precise se adequar a tudo.

Anunciar retirada extratégica em noite de glória é coisa para poucos. Mas poucos também apostam com tanta convicação na própria irreverência, sem medo de parecer pretensiosa ou amarga: "Estou encerrando essa fase da minha vida. Vou fazer o mesmo que a Rita (Lee). As pessoas dizem: 'Mas você tem 70 anos e essa voz toda!' Ah, vai se ferrar, não tenho mais estrutura para ouvir baboseira de imprensa", afirmou.

Quem não gostou nada do "ferro" anunciado e acabou correndo para colocar panos quentes no anúncio da diva foi seu irmão, Danilo Caymmi: "É cascata! Temos vários compromissos marcados. É um pouco essa questão do luto dela. O público não deixa a Nana parar. A gente nasceu para o palco mesmo", afirma o também cantor.

Deixar ou não deixar Nana parar, eis a questão. "Na verdade, Nana vem anunciando que deixará os palcos desde 2008, logo após perder os pais, Dorival e Stella num intervalo de apenas 12 dias. Ela era muito ligada aos dois e entrou em depressão depois das mortes".

Bem, com ou sem motivos louváveis, Nana Caymmi merece ir para aonde ela quiser. E quem quiser segui-la que a siga. Sorte para os que moram aqui na Roça Grande e adjacências. Ela promete se refugiar na pacata Pequiri, terra de sua mãe, situada na Zona da Mata mineira. Afinal, a Zona da Mata é logo ali, no caminho do Rio, de São Paulo ou do Espírito Santo: fica ao gosto do freguês. Até da Bahia, se for o caso: os Caymmi valem o desvio.

A prova está aqui: Nana canta "Se é por falta de adeus" no Teatro João Caetano, em 1994. Com certeza, por falta de adeus não será.