Dificílimo falar de outro tema, por esses dias, que não seja a Copa do Mundo. Só que eu resolvi que meu espírito de contradição é mais forte e mais tenaz do que a monotematização dos assuntos do dia. Em resposta ao assunto do momento, hei de falar de coisas longínquas e nada mundanas: isto é, de coisas que nem sequer são deste mundo.
Para tanto, escolhi falar do último flagra da sonda Cassini, lançada pela NASA: "Cientistas investigam um vulto misterioso que apareceu e sumiu em um lago no Titã, a maior lua de Saturno" (http://oglobo.globo.com/sociedade/ciencia/vulto-misterioso-visto-em-lago-na-maior-lua-de-saturno-batizado-de-ilha-magica-12972927).
Tirada a mais de um bilhão de quilômetros da terra, a foto me pareceu um convite ao devaneio cósmico, já que "na fotografia capturada, o vulto é um pouco mais do que uma mancha
branca em uma imagem granulada tirada do hemisfério norte de Titã". Mas como manchas pouco nítidas parecem ter pouca atratividade no mercado editorial, os "astrônomos nomearam a bolha de 'ilha mágica' até que se tenha uma ideia melhor do que se está olhando".
A saída poderia ter sido uma astuta jogada de marketing interplanetário. Ora, se o segredo é a alma do negócio, então a ambivalência deveria ser o seu esqueleto. De acordo com Jason Hofgartner, cientista da Universidade de Cornell,
em Nova York, "nós não podemos ter certeza do que é ainda, porque nós só temos a
imagem de um momento, mas não é algo que você normalmente vê em Titã."
"Não sei o que é, só sei que não se vê muito por aqui", parece ser a conclusão dos cientistas envolvidos na análise das imagens do lago Ligeia, um dos três maiores lagos "da maior lua de Saturno". O fato de ser este "o único lugar fora da
Terra conhecido por ter líquidos estáveis em sua superfície e a chuva
caindo de seus céus" torna o evento ainda mais intrigante: "Com 12 milhas de comprimento e seis milhas de largura, o ponto brilhante
aparece em uma imagem de 10 de julho de 2013, mas não aparece em fotos
do mesmo local tiradas anteriormente e em 26 de julho do mesmo ano", explica a notícia.
Hipóteses pululam: "O local distorcido poderia ser um iceberg que se soltou da costa, um
efeito de bolhas ou ondas rolando em toda a superfície do lago". Mas qualquer uma dessas hipóteses perde a graça diante da opção pela "Ilha mágica" que, diga-se de passagem, soa bem mais bacana aos ouvidos.
Pois bem: a "Ilha mágica" é esse lugar inóspito para onde fogem todas as sensibilidades literárias que tentam escapar do monotema da Copa do Mundo. O que eu não contava encontrar, no meio do caminho, era essa chuva de meteoros ufanistas, ávidos pelos detalhes da última partida de futebol, atrapalhando a viagem da minha imaginação.
Bem, desisto! Quem não se sentiu um pouco mais brasileiro hoje e não torceu pelo nosso time que atire a primeira pedra, porque eu já morri soterrada pela chuva de meteoros desta tarde. Boa noite para quem fica. E Ilha mágica: um dia eu chego lá!
A autora criou esse blog para divagar sobre o que lê diariamente nos jornais, com foco principalmente (mas não exclusivamente) na cobertura diária de ciência. Suas principais armas são a ironia de inspiração machadiana e um computador bacaninha (ela tirou o escorpião do bolso e comprou um de verdade). Ao citar alguma passagem, por favor, dê créditos para a autora: até para as grandes bobagens o direito autoral é inalienável.
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