Se alguém buscava um pouquinho de otimismo nesta noite auspiciosa, que antecede a tão celebrada conjunção entre Vênus e Júpiter no nosso céu, a notícia publicada no jornal Folha de S. Paulo online sobre o estado de uma das sete maravilhas do mundo moderno cai como uma luva. Ao que parece, uma extensão considerável da Grande Muralha da China está desaparecendo. (http://f5.folha.uol.com.br/voceviu/2015/06/1649154-cerca-de-30-da-muralha-da-china-da-dinastia-ming-desapareceu.shtml).
Ou melhor: já desapareceu, segundo estudo desenvolvido pela Administração do Estado da China, encarregada do patrimônio. O estudo avaliou um trecho total de 9.000 km de muralha construída no Séc. XV, durante a Dinastia Ming, para chegar a conclusão de que "2.000 quilômetros desapareceram e 1.200 estão danificados."
A parte da muralha construída na Dinastia Ming, contudo, não é nem a mais antiga nem a mais extensa parte da muralha, cuja extensão total está estimada em 21.000 km. O mais interessante é que o destino provável dos tijolos é a construção de casas. De acordo com Cheng Dalin,
especialista da Comissão de Estudos da Grande Muralha "os habitantes que
vivem perto da Grande Muralha tinham o costume de
utilizar seus tijolos para construir suas casas e vários setores da
fortaleza foram destruídos como consequência da expansão urbana e da
construção de estradas."
Ah, se toda despesa militar no mundo passasse a ser usada para abrigar famílias! De todos os destinos, os tijolos daquela que é a parte mais recente da Muralha da China conheceram o mais nobre: acolher ao invés de dividir, abrigar ao invés de separar.
Que esta noite fria seja então o prenúncio de muitas outras mudanças e - por que não? - de celebração do fim das grandes muralhas psíquicas, que nos impeçam de comunicar e conviver livremente.
A autora criou esse blog para divagar sobre o que lê diariamente nos jornais, com foco principalmente (mas não exclusivamente) na cobertura diária de ciência. Suas principais armas são a ironia de inspiração machadiana e um computador bacaninha (ela tirou o escorpião do bolso e comprou um de verdade). Ao citar alguma passagem, por favor, dê créditos para a autora: até para as grandes bobagens o direito autoral é inalienável.
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