UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: Palmas para o dinossauro "sarado"!

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Palmas para o dinossauro "sarado"!

Depois de saber que Fernando Collor de Mello (PTB-AL) foi designado presidente da Comissão das Relações Internacionais do Senado, resolvi consolar minha tristeza caindo de cabeça na superficialidade das notícias sobre o mundo animal. Aliás, tenho fortes indícios de que esse tipo de notícia fala mais do ser humano que somos, do que do objeto analisado.

"Mas é óbvio, somos nós que escrevemos as matérias, sua cabeçuda!", diriam alguns. Sim, é verdade. Enquanto sujeitos da observação, tendemos mesmo a imprimir nossa marca nas "descrições objetivas" do mundo a nossa volta. Até aí, nada demais. Fazemos isso o tempo todo, com tudo aquilo que se presta à nossa observação. Mas com o mundo animal a coisa tende ficar mais grotesca: os paralelos com a vida humana abundam. Nunca dá para saber se, no fundo, aquilo é notícia sobre bicho ou sobre aquilo que julgamos importantes para nós mesmos. Ou melhor, aquilo que alguns julgam ser importante para eles mesmos.

A prova é a nova descoberta científica anunciada nos jornais de hoje. Na Folha Online, diz-se que cientistas descobrem um "dinossauro chutador" (http://www1.folha.uol.com.br/bbc/879786-cientistas-acham-dinossauro-chutador.shtml). Denominado cientificamente de Brontomerus mcintoshi, o danado tinha coxas hipertrofiadas como as do ex-jogador Dunga. Até aí, tudo bem. Só que, no bojo da matéria, atribui-se ao professor Mike Taylor, da University College London, um arrazoado interessante para justificar as coxas estilo "pilotis" do dinossauro: "O Brontomerus então teria coxas muito fortes, musculosas e capazes de disparar chutes". A conclusão disso tudo é apresentada pelo jornalista: "Por isso, o Taylor acredita que inicialmente, os coices teriam sido usados para disputar a atenção de fêmeas, possivelmente evoluindo para defesa." Dois neurônios bem preguiçosos já seriam suficientes para chegar à primeira conclusão: qualquer semelhança com malhadores hipertrofiados de academia, não é mera coincidência: sedução e defesa continuam sendo objetivos perseguidos por muitos. Mas passemos à notícia seguinte.

Já no O Globo Online, a ênfase é dada a aqueles aspectos anatômicos do bicho que levaram os cientistas a supor que ele utilizava suas coxas como armas (http://oglobo.globo.com/ciencia/mat/2011/02/23/cientistas-descobrem-brontomerus-mcintoshi-dinossauro-que-viveu-ha-110-milhoes-de-anos-923863881.asp). Mas a conclusão imputada ao professor Mike Taylor é, no mínimo, hilária: "Brontomerus Mcintoshi é um dinossauro carismático e uma descoberta emocionante para nós" (?!!!!). Das premissas à conclusão, o salto foi gigantesco, provavelmente proporcional ao tamanho das pernas do dinossauro. Aliás, fiquei até achando que tinha pulado algum parágrafo na minha leitura atabalhoada. Desnecessário dizer que Perplexidade agora é o meu nome! Alguém aí, por favor, seria capaz de me explicar: 1) como um dinossauro consegue ser carismático? 2) Como é que os dados empíricos disponíveis (restos de ossos, diga-se passagem) serviram de fundamento para um análise psicológica tão ousada?

Por fim, a matéria do Hoje em Dia Online. A comparação, meus caros, já vem explícita no título: "Cientistas descobrem o dinossauro mais 'sarado' " (http://www.hojeemdia.com.br/cmlink/hoje-em-dia/noticias/mundo/cientistas-descobrem-o-dinossauro-mais-sarado-1.244290). Descrito como "um novo dinossauro particularmente atlético" e "dotado de 'coxas torneadas' ", a matéria passa a bola mais uma vez para Mike Taylor: "O chute era utilizado, provavelmente, durante uma disputa entre dois machos por uma fêmea, mas com toda essa mecânica, seria impossível não crer que ele se utilizasse também do golpe para se defender de um predador". Claro! Nada mais científico. Só faltou ele dizer que os machos da espécie chutavam as fêmeas ao término de cada relacionamento. Maria da Penha neles, cientistas!

Bem, tudo isso para dizer que ficou claro que a ordem dos fatores e a ênfase em um ou outro aspecto - disputa entre machos e luta contra predadores - mudou conforme o contexto jornalístico. Parece óbvio também que a analogia entre o mundo animal e o comportamento do macho humano já vinha empacotada desde a fonte, que nada mais é do que uma notícia requentada da Agence France-Presse(AFP). Mas esta não é a questão. A questão é a recriação do dinossauro como um prolongamento das nossas expectativas sociais: na ciência e no relato jornalístico, a um só tempo. Mas não dizem por aí que era Deus quem tinha criado o Homem a sua imagem e semelhança? Bem, só me resta crer que os cientistas foram à forra, tentando fazer o mesmo: pobres dinossauros!

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