UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: Miopia anti-social

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Miopia anti-social

Como respeitar o limite entre seu quintal e o quintal do vizinho, se a cerca que antes o separava deixou de ser "visível"?

Pois bem: estou falando metaforicamente desse tipo de polimento social que coloca limites (necessários) nos ímpetos de agressão verbal e psicológica entre pares; que torna o convívio social possível e minimamente suportável; e que alija palavras rudes e preconceituosas antes mesmo que elas aflorem no palato do cidadão comum.

A notícia que suscitou o tema figura entre as mais lidas da Folha de S. Paulo online de hoje: "Um funcionário da empresa de acessórios Visou foi obrigado a fazer uma retratação pública por ofender, via rede social, uma consumidora que não recebeu a compra que fez e resolveu reclamar com o perfil da loja na rede social Facebook" (http://www1.folha.uol.com.br/mercado/1151709-funcionario-manda-cliente-insatisfeita-procurar-um-macho-loja-diz-que-fez-estorno.shtml).

Tomando partido da denunciante, a matéria da Folha reproduz um trecho do diálogo entre as partes que revela os pormenores da agressão verbal à cliente. A conduta do funcionário encarregado da mediação da empresa via redes sociais foi a tal ponto grosseira que beirou o surrealismo. É ao funcionário que se atribui a seguinte sequência de deselegâncias (peço perdão aos estômagos mais sensíveis, mas uma tal conduta precisa ser exposta para, no mínimo, causar bastante constrangimento ao seu autor):

- "Aproveita e leva isso para eles: VAI SE FODER SUA COMUNISTAZINHA DE MERDA.
e não vamos enviar merda nenhuma
vai transar sua mal comida
nem foto põe de tão feia que deve ser"

Diante de provas tão contundentes de tamanha inadequação social, creio não ser preciso esmiuçar o rico manancial de preconceitos que subjaz à mensagem.

Para mim, a questão é a seguinte: essa conversa mole de defesa das "mídias sociais" - um termo da moda que me faz subir nas tamancas, pois induz o leitor a pensar que as mídias convencionais prescindem das relações sociais - omite uma série de questões relevantes sobre limites socialmente aceitos e coletivamente construídos.

Em primeiro lugar, acredito que muitas pessoas hoje estão sendo acometidas de uma espécie de miopia social que não as deixa ver muito mais além do seu próprio umbigo. Em segundo lugar, acredito que muita gente anda perdendo o tino para perceber - e respeitar! - o limite colocado pelo outro. E mais: penso cada vez mais que uma boa parte dos "consumidores de mídias sociais" não sabe mais fazer a distinção entre o seu quintal e a praça pública, pois os limites entre esses dois espaços tão importantes - conquanto distintos - para a constituição da subjetividade foram a tal ponto banalizados, que eles nem sabem mais como e quando a adequação é necessária.

Em um mundo como o nosso, eivado de preconceito e individualismo, fica claro o risco que se corre: que a cerca  que antes delimitava o comportamento socialmente aceitável está sendo totalmente ignorada pelos míopes das mídias anti-sociais.

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