UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: Alongamentos e outras ginásticas cerebrais

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Alongamentos e outras ginásticas cerebrais

Dizem que os ossos doem quando crescemos. Bem, do auge dos meus 35 anos e com reles 1m57cm, posso dizer com muita segurança que a minha experiência de crescimento físico, além de ter dado completamente com os burros n’água, já vai longe no tempo.

Assim sendo, uma primeira saída contra as mazelas do nanismo foi procurar refúgio em um consolo besta, dizendo aos meus irmãos - mais velhos e maiores do que eu - que o que não foi para os ossos, foi para o cérebro. Eu avisei que o consolo era besta, não avisei?...

Mais afeita à sina de cabeçuda do que à de anã de circo – e já sem saco para as alcunhas de “pintora de rodapé” e “surfista de microondas” – busquei outras duas estratégias de sobrevivência nesse mundo-cão: alongamento mental e auto-depreciação (em francês, auto-dérision; e em inglês, self-deprecating).

O alongamento mental funciona assim: se você tem uma ideia boa, estique-a até distorcê-la, deformá-la e torná-la ainda melhor. Não recomendo o procedimento para os músculos, porque pode doer muito, mas é um ótimo exercício mental.

Quanto à auto-depreciação, esta só funciona com um ingrediente fundamental: o humor. Porque auto-depreciação sem humor vira flagelo. E não tem coisa pior nesse mundo do que levar a sério as besteiras que a gente mesmo inventa. Pior, você pode até convencer alguns incautos da veracidade do seu delírio poético e torná-lo um dogma. Sim, meus caros, muitas contas bancárias foram engordadas assim. Mas como não tenho muita vocação messiânica – graças ao meu ceticismo veemente que me levou a desacreditar em Papai Noel precocemente, aos cinco anos de idade – prefiro alongar minhas idéias, rindo das minhas deformidades intelectuais para torná-las ainda mais engraçadas.

Aqui vão alguns exemplos: nada mais patético do que trocar nomes, certo? Pois bem. Quando me mudei para Montreal em 2003, meu domínio da língua francesa era bastante limitado. Não obstante, meu cabeção de dimensões desproporcionais à minha estatura me levava a insistir na aventura de aprender uma outra língua e a alongar meus músculos da aparelho fonador (que em mim reagem muito bem aos estímulos da mente divagadora): comprava, comia e bebia tudo em francês, apesar de, naquele tempo, lidar de maneira muito mais comfortável com a língua inglesa. Foi assim que, tempos depois, descobri que durante os quatro meses consecutivos que passei freqüentando o mesmo café, pedia “sofá de espinafre” (fauteuil aux épinards) ao invés de “folhado de espinafre” (feuilleté aux épinards). Outra vez, passei a noite inteira oferecendo muito “bouchon” (rolha) no lugar da “bouchée” (canapé ou qualquer miudeza do gênero) em uma festa de aniversário. Também já disse que amava as “alemãs” (allemandes), quando queria, na verdade, dizer que apreciava muito as “amêndoas” (amandes em francês ou almonds em inglês).

Enfim, a lista é longa e não me acabe aqui esgotá-la. Mas coleciono essas pérolas como quem coleciona figurinhas premiadas. E nas horas de tristeza ou melancolia, faço yoga com elas, rindo de mim mesma.

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