UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: A ética da pobreza

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

A ética da pobreza

Os pobres estão a um passo da beatificação! Eis o que dá a entender a matéria publicada hoje no jornal Hoje em Dia online: "Pessoas mais ricas e de classes elevadas são mais propensas do que as de renda mais baixa a ter comportamentos antiéticos, revelou um estudo publicado nesta segunda-feira (27) nos Estados Unidos", reza a matéria (http://www.hojeemdia.com.br/noticias/ricos-s-o-mais-propensos-a-trapacear-do-que-pobres-1.412267).

Daí que a matéria só me deu motivos para manter meu voto de pobreza. Por exemplo, tive uma baita vontade de comprar um fusquinha. Tudo em nome da ética do bom condutor, claro! É que "motoristas de carros caros, por exemplo, se mostraram mais propensos a violar as leis em interseções e a interromper a travessia de pedestres do que os condutores de automóveis mais baratos".

O mesmo vale para o joguinho de dados: ao que parece, jogar sem trapaça tem correlação direta com o desapego material. "Em um outro teste que usou um jogo de dados, quando percebiam a chance de ganhar um prêmio, as pessoas que se autodenominaram como pertencentes a classes socioeconômicas altas se mostraram mais propensas do que o resto a mentir e a dizer que tiraram números maiores do que efetivamente fizeram".

Testes empíricos comprovam: a propensão à maracutaia dos mais abastados invade os domínios mais variados da vida em sociedade. Assim o é, por exemplo, nas relações de trabalho, já que "pessoas de classes mais altas também demonstraram ser menos propensas a dizer a verdade em uma negociação hipotética de emprego, na qual atuaram como empregadores tentando contratar alguém para um trabalho que sabiam que seria encerrado em breve".

A julgar pelos testes em laboratório, nem as crianças ricas foram poupadas da decrepitude: "E quando receberam um recipiente com doces, que os pesquisadores informaram ser para crianças que participavam de experiências em um laboratório vizinho, os mais ricos tiraram mais balas do que os demais, quando informados que poderiam pegar algumas".

Claro, uma sucessão de achados tão impactantes não teria a menor graça se não houvesse espaço para se especular as possíveis ações que levam a tanta devassidão. A pesquisa reunindo psicólogos da Universidade de Berkeley, na California, e da Universidade de Toronto, no Canadá, e publicada recentemente no periódico Proceedings of the National Academy of Sciences, associa o comportamento desviante das classes mais altas à busca obstinada pela realização dos auto-interesses: "A busca do interesse próprio é uma motivação mais fundamental na elite da sociedade e o desejo aumentado, associado a maior riqueza e status podem promover más atitudes".

Pronto! Era tudo o que eu precisava para calçar minhas sandálias franciscanas e levar adiante os ideais mais extremos de despojamento. Porque, para quem não sabe, pesquisa é assim: ela é capaz de descrever e prescrever comportamentos com habilidade ímpar. E o que é pior: com credibilidade científica.

O único perigo é deixar seu empregador saber disso da próxima vez que você for reivindicar um aumento - justo, por sinal - de salário: este certamente lhe será negado em nome dos padrões mais elevados de comportamento ético. E se você for argumentar que "saco vazio não para em pé", seu empregador certamente lhe dirá: "ora, vá encher o seu saco de virtudes e dê o fora daqui!"

Para ser sincera, adorei a pesquisa: leitura do relatório final em voz alta faria uma boiada adormecer em três tempos. Aliás, é exatamente isso o que eu vou fazer agora: dormir! Abraços para quem fica.

2 comentários:

  1. "Pobre gosta é luxo e riquezas. Quem gosta de miséria é intelectual..." Joãozinho Trinta - Carnavalesco.

    Um abraço
    Paulinho do Boi

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  2. Uma pena esses pesquisadores nunca terem ouvido falar de Joãozinho Trinta, rsrs...

    Abraços para você e a Família Tereza!

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