UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: Retóricas

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Retóricas

Claro está que o poder político não pode - e talvez nem consiga! - prescindir da retórica. Mas tem coisas nessa arena da política internacional que parecem saído do arco da velha.

Depois do descabelamento diplomático com as atividades de espionagem dos EUA, executado em praça pública mundial pela nossa presidenta Dilma - e uma crescente simpatia mundial pela figura de Edward Snowden, hoje seguramente o dedo-duro mais procurado do planeta (http://cronicasdejuvenal.blogspot.com.br/2013/07/unissono.html) - chegou a vez dos franceses subirem nas tamancas.

Não que estes últimos lhe tenham oferecido abertamente asilo político, como sugerido pelos nossos senadores. No entanto, como era de se esperar, "novas revelações sobre a espionagem em massa dos serviços norte-americanos provocaram reações iradas da França, que convocou o embaixador dos Estados Unidos em Paris" (http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2013/10/1359895-todos-os-paises-espionam-responde-a-casa-branca-as-acusacoes-da-franca.shtml).

E onde entra a retórica (sem "r" maiúsculo mesmo) nisso tudo? No tom teatral das trocas públicas de argumento. Nessas horas, o estardalhaço sempre começa por uma boa reportagem investigativa (e não seria a investigação um nome mais elegante para espionagem?): "Segundo o jornal 'Le Monde', em sua edição desta segunda-feira, a agência americana de Segurança realizou 70,3 milhões de gravações de dados telefônicos de franceses em um período de 30 dias entre dezembro de 2012 e janeiro de 2013."

A cena seguinte é quase tão previsível quanto engarrafamento em véspera de Natal: as autoridades máximas saem de suas alcovas e vêm a público demonstrar, em alto e bom som, sua indignação: " 'Estou profundamente escandalizado', declarou nesta segunda-feira em Copenhague o primeiro-ministro francês, Jean-Marc Ayrault". "Nós também estamos!", vocifera a plateia mundial. E seguem-se as vaias.

E os EUA com isso? Estão que nem rádio velho: nem ligando! " 'Já deixamos claro que os Estados Unidos recolhem informações de inteligência no exterior do mesmo modo que todos os países recolhem', afirmou a porta-voz da agência [de Segurança Nacional americana], Caitlin Hayden". O drama do dia então se encerra com um simples telefonema diplomático: o presidente americano Barack Obama liga para François Hollande para explicar o inexplicável - mesmo porque o incabível não tem mesmo cabimento.

O problema é que, sob um certo aspecto, Hayden e Obama estão cobertos de razão: espionagem todo mundo faz. E a França também. Basta dar uma olhada no que dizem alguns jornais europeus já há alguns anos sobre as práticas de espionagem industrial nada ortodoxas que vêm sendo executadas pelo país hexagonal: "Telegramas divulgados pelo WikiLeaks e publicados hoje pelo diário norueguês Aftenposten indicam que a França é o país mais activo em matéria de espionagem industrial, relegando para segundo plano países como a China ou a Rússia" (http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=1748461&seccao=Europa).

E fica a pergunta: então, pra quê tanta conversa jogada fora? Na melhor das hipóteses, para garantir a colônia de férias vitalícia para Edward Snowden.

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