Mudanças de hábito e de atitude nem sempre são bem aceitas, mesmo porque nem sempre são vistas como mudanças para algo melhor.
Assim é com a atitude de aplaudir de pé os mais variados espetáculos de dança, música, teatro. Diversos críticos e diretores se insurgem contra o que atestam ser uma banalização do reconhecimento (http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2014/01/1401502-febre-de-aplauso-de-pe-incomoda-artistas-e-criticos-de-teatro.shtml).
A choradeira parece ter realmente tomado conta dos bastidores. Tem o crítico inglês Michael Billington que acha que aplaudir de pé não passa de um "hábito sujo americano". Já o crítico americano Ben Brantley considera que a prática "virou
um gesto social automático". No Brasil, o diretor Antunes Filho e a atriz Nydia Lícia acreditam que "essa mania de levantar sempre" é hábito recente. O diretor Cláudio Botelho (que não é meu parente) reclama que "quem quer que apareça é aplaudido".
O mais interessante, nessas horas de releitura, é perceber como os críticos da mudança retraçam sua gênese. Parte acredita que Hollywood tem, indiretamente, um dedo nisso: "Com a presença crescente de celebridades do cinema e da TV no palco,
tanto aqui como no exterior, o fenômeno avançou para o meio das
apresentações, para a entrada em cena". Outros acreditam que a prática teve "sua origem na Broadway, seguindo depois para Europa e outros junto com as franquias dos musicais nova-iorquinos".
Já o jornal New York Times vaticina: "espectadores aplaudem para justificar o ingresso caro; por serem
turistas, não habituados ao teatro; pelo alívio físico de se levantar;
até para chegar antes à saída, nas plateias lotadas". O ator e músico Saulo Vasconcelos vê na prática um rasgo da cordialidade brasileira: "As pessoas aplaudem já se levantando para ir embora, porque o
estacionamento é um inferno. E também porque o espectador daqui é
gentil, quer mostrar seu carinho."
E há quem acredite, como o ator Ron Daniels, que o problema é ainda maior aqui e o nos EUA do que em outras partes do mundo. "É muito esquisito: a plateia se congratula a
si mesma", reclama. Michael Billington vê nesta febre apenas um público "tentando
enganar a si mesmo".
Que seja a manifestação da cordialidade e gentileza dos brasileiros ou simplesmente a vaidade do autoengano: pouco importa! Mudança pede mudança. Para conter a expansão dos aplausos efusivos e a qualquer custo, o jeito vai ser radicalizar: a partir de agora, aplauso sincero será aquele dado de joelhos sobre o milho. Ou caco de vidro, dependendo do grau de exigência do crítico ou diretor.
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