UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: Olhos na tela

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Olhos na tela

Escrever com os olhos, ler com a alma. Dois objetivos, dois desafios.

O primeiro objetivo está em vias de ser alcançado com essa nova invenção divulgada hoje pelo jornal Hoje em Dia online: "Um cientista francês desenvolveu um sistema para escrever com fluidez e desenhar em uma tela de computador usando apenas o movimento dos olhos, um avanço que poderá 'devolver a criatividade' a pessoas com deficiências severas" (http://www.hojeemdia.com.br/noticias/frances-desenvolve-sistema-que-permite-escrever-com-os-olhos-1.15447).

Para quem achava que os olhos eram a janela da alma, é hora de atualizar os conhecimentos: eles serão também a porta de saída. Desenvolvido principalmente para pessoas com motricidade reduzida nos membros - a exemplo do cientista Stephen Hawkings - o sistema aprimora modelos existentes que "só permitem que a pessoa selecione letras ou palavras sobre uma tela". Mais do que isto, o modelo francês dá mais liberdade de criação ao usuário diante da tela do computador, permitindo que ele possa escrever "com fluidez, desenhar ou assinar com o movimento dos olhos", de acordo com a matéria.

O curioso, na verdade, é que o protótipo tenta corrigir uma limitação ocular que todos nós temos, segundo a qual "o olho não consegue fazer movimentos suaves e regulares sobre um fundo estático". De acordo com Jean Lorenceau, pesquisador responsável pelo sistema, foi necessário criar alguns subterfúgios para que o olho humano obtivesse um apoio móvel o suficiente para que o usuário pudesse fazer curvas e não "sacudidelas": "a ilusão de ótica 'reverse-phi', descoberta pelo americano Stuart Anstis em 1970".

Sem explicar exatamente o que é a ilusão "reverse-phi", a matéria se atém à explicitar seus desdobramentos práticos: "São necessárias de duas a quatro sessões de treino de meia hora para controlar os movimentos do olho e traçar letras e figuras na tela", explica.

Mais curioso ainda é perceber que a estratégia reside em um paradoxo interessante - recorrer a uma ilusão para corrigir um "erro" natural do globo ocular. Metaforicamente falando, tal paradoxo pode nos ensinar algo mais sobre a relação entre o visível e o sensível que usualmente travamos para expessar nossos desejos.

Em seu "estado perfeito", o globo ocular não está apto a exercer mais do que seu papel imediato - isto é, o de ver, no sentido mais estrito do termo. Para que ele saia do seu estado ordinário, é preciso iludi-lo para fazê-lo transcender e assumir uma nova tarefa expressiva.

Ainda em um sentido metafórico - e desesperadamente otimista - seria preciso uma ilusão "reverse-phi" que nos permitisse dar um salto evolutivo que, em nosso estado ordinário, jamais seríamos capaz de dar. Olhos pregados na tela da alma, faríamos pequenas danças circulares, mãos entrelaçadas, pensando no nosso bem e no bem dos que estão à nossa volta. Serenaríamos nossos corações, calaríamos as desavenças e visitaríamos, juntos, nossos sonhos mais doces ao som do kântele que toquei hoje pela primeira vez. 

E aí então estaríamos cumprindo o segundo objetivo: ler com a alma.



(Fonte: http://youtu.be/8pR9Fi9j47o).




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