Quem não se lembra daquela expressão (mais velha do que andar para a frente) que diz que "fulano mata a cobra e mostra o pau"? Pois é: foi inevitável lembrar dela após ler esta notícia publicada hoje no jornal Folha de S. Paulo online (http://classificados.folha.uol.com.br/negocios/2013/07/1311254-restaurante-mostra-ao-cliente-quem-pegou-o-peixe.shtml).
Não que se mate a cobra. Também não há pau sendo mostrado. Mas, na pior das hipóteses, uma analogia com a famosa expressão é possível, já que mostrar detalhes dos bastidores do abate de animais - neste caso especifico, de peixes - acabou virando moda nas Terras do Tio Sam. Ou, pelo menos, está em vias de.
"Rob Ruiz, do Harney Sushi, desenvolveu um sistema pela qual o cliente
pode ver onde o peixe que ele está comendo foi pescado, quanto dessa
espécie existe no mundo e até mesmo o rosto dos pescadores responsáveis
pela refeição".
A razão para tanto? Matar a cobra e mostrar o pau, isto é: provar que o peixe oferecido no Harney Sushi, um restaurante japonês localizado na cidade de San Diego, não usa de artifícios comumente utilizados em restaurante do gênero, a saber: "injetar monóxido de carbono no alimento para deixa-lo
vermelho mesmo depois de vencida a validade"; ou, tão ruim quanto, "processar
restos de peixe e vendê-los como uma peça nobre".
O método de identificação da procedência do peixe funciona com base em um dispositivo chamado QR Code. "O QR Code é um quadrado que se assemelha a um código de barras. Quando
aponta-se a câmera do smartphone para um deles, o usuário é direcionado a
uma página". Ao escanear este código, o cliente é imediatamente remetido a uma página, onde ele pode acessar a foto de seu pescador de preferência.
Mas, como toda analogia tem limites, vale listar aqui alguns deles:
1) a ideia funciona bem com peixes, mas corre o risco de ser traumatizante com vacas: já imaginou como se daria a visualização dos detalhes sórdidos de cada um dos funcionários do matadouro onde o chifrudo foi abatido?
2) o dispositivo QR Code exige banda larga e a presença de um celular smartphone, sendo, portanto, de pouco uso na Somália (aliás, tem alguém realmente interessado em conhecer a procedência de qualquer alimento na Somália?);
3) o visual do pescador pode passar a contar na escolha do peixe, variável que escapa completamente ao controle do dono do restaurante;
4) finalmente, há que se aventar a possibilidade de o experimento descambar para um show de exibicionismo: vai que o profissional empolga e engata uma de suas famosas conversas de pescador?
Este último fato justificaria, por si só, uma outra analogia: o encontro da fome com a vontade de comer. Mas qual seria o problema, no final das contas? Não é de analogia em analogia que a galinha enche o papo?
A autora criou esse blog para divagar sobre o que lê diariamente nos jornais, com foco principalmente (mas não exclusivamente) na cobertura diária de ciência. Suas principais armas são a ironia de inspiração machadiana e um computador bacaninha (ela tirou o escorpião do bolso e comprou um de verdade). Ao citar alguma passagem, por favor, dê créditos para a autora: até para as grandes bobagens o direito autoral é inalienável.
segunda-feira, 15 de julho de 2013
Analogias digitais
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