UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: Pacotes neuronais

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Pacotes neuronais

O problema é velho e muitas vezes evocado entre pesquisadores: nem sempre as notícias de jornal sabem citar as fontes de sua informações com o mesmo rigor do texto científico.

Notícia publicada hoje no jornal O Globo online quis destrinchar as astúcias das libélulas, tidas como "predadores mais vorazes da natureza", mas acabou trocando os pés pelas mãos e dando um mal exemplo de como dispor a informação científica (http://oglobo.globo.com/ciencia/libelulas-estao-entre-predadores-mais-vorazes-da-natureza-8005066).

A meu ver, o delito começou logo na primeira frase da notícia: "Aparentemente delicadas e belas, as libélulas podem ser os caçadores mais brutalmente eficazes do reino animal, sugere uma pesquisa americana". Obviamente, não são as libélulas em si (ou o que elas fazem), mas o fato de que terminamos de ler notícia sem saber, ao certo, que "pesquisa americana" é essa.

O problema é que fontes são tão diversas e institucionalmente desvinculadas que fica difícil entender realmente quem é a suposta "pesquisa". As credenciais dos pesquisadores, por si só, não explicitam nenhum vínculo de pesquisa: 1) Michael L. May, professor emérito de entomologia da Universidade de Rutgers; 2) Stacey Combes, estudioso pela Universidade de Harvard; 3) Robert M. Olberg, da Faculdade Union, autor de artigo publicado no periódico da “Proceedings of the National Academy of Sciences”; e 4) Paloma Gonzalez-Bellido, "uma das autoras do relatório". Ou seja, ao contrário do que anunciado no início da notícia, tudo leva a crer que não se tratava de uma única pesquisa, mas de várias.

Mas que relatório é esse? Mais uma pergunta sem resposta, pois não nenhuma outra menção sobre a existência de um relatório. Em contrapartida, informações científicas importantes são desvinculadas de suas devidas fontes, graças ao uso genérico que se faz do termo "pesquisadores":  por exemplo, diz-se que "uma equipe de pesquisadores mostrou que o sistema nervoso de uma libélula exibe uma capacidade quase humana de atenção seletiva"; ou então que "outros pesquisadores identificaram uma espécie de circuito mestre de 16 neurônios que conectam o cérebro da libélula ao seu centro motor de voo, no tórax".

De qualquer forma, valeu a pena saber que, "com a ajuda de um pacote neuronal, uma libélula pode rastrear um alvo em movimento, calcular uma trajetória para interceptá-lo e sutilmente ajustar o seu caminho como necessário". Resta agora saber quantos pacotes neuronais serão necessários para que os jornalistas da grande imprensa associem adequadamente as informações que relatam às suas devidas fontes.

Nenhum comentário:

Postar um comentário