UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: Xadrez linguístico

segunda-feira, 29 de abril de 2013

Xadrez linguístico

Já entendi: o mundo anda mudando muito rápido. Mas... e nossas habilidades expressivas? Será que elas dão conta de acompanhar o fluxo das transformações?

Meu palpite é que elas não conseguem nem de longe! Um dos grandes problemas contemporâneos é que coisas tão bizarras andam acontecendo, que nossas habilidades expressivas acabam sendo prejudicadas pelo excesso de literalidade. Isto porque coisas até pouco tempo consideradas impossíveis (ou pouco prováveis) acabam se tornando coisa corriqueira.

Um bom exemplo foi essa cabeça de dimensões gigantescas que foi achada boiando no Rio Hudson, em Nova Iorque (http://www.hojeemdia.com.br/noticias/bizarro/cabeca-gigante-e-encontrada-boiando-em-rio-americano-1.117431). "Feita de fibra de vidro e poliestireno",  a cabeça foi avistada por uma equipe de remadores da Universidade Marista que treinavam no Rio Hudson. "A cabeça foi retirada da água e levada para uma doca. Grupos se organizam para tentarem descobrir a procedência do objeto." Xeque-mate na língua: em tempos sombrios como os nossos, tem muita gente perdendo a cabeça. Literalmente! E em meio a tanto caos, o difícil agora vai colocar a "cabeça no lugar".

Mas não pense você que é só no campo da literalidade que "o bicho anda pegando". Outro problema que surgiu no campo expressivo, graças ao ritmo acelerado das mudanças no mundo, é o comprometimento da nossa capacidade de figuração. Isso mesmo! Excesso de literalidade para uns, limitações de ordem metafórica para outros. Tudo culpa dessas pesquisas genéticas com vacas, que prometem alterar o código genético de raças inteiras para que elas nasçam sem chifres.

"Técnicas de edição de genes conseguiriam inserir uma porção de DNA no genoma das Holsteins, a raça leiteira mais importante do Reino Unido, suprimindo o crescimento dos chifres. Este código genético extra foi retirado de outras espécies de gado bovino. Daí viria uma vaca leiteira idêntica em todos os aspectos ao gado existente, mas sem os chifres" (http://oglobo.globo.com/ciencia/vaca-pode-ser-geneticamente-modificada-para-nao-ter-chifres-8244667).

Pois as modificações genéticas nas vacas farão muito mais do que "de queimar os chifres das vacas, um procedimento difícil e muito doloroso para os animais", conforme afirma a notícia publicada no jornal O Globo online. Outro xeque-mate na língua: a técnica simplesmente inviabilizaria, no espaço de "uma única geração" de bovinos, o uso da velha expressão "pegar o boi (logo, a vaca também) pelos chifres".

Logo, se você quer resolver alguma pendência de forma rápida e eficaz, corra logo: a supressão dos chifres, que já "seria a mudança mais rápida na aparência de um gado já atingida pela ciência", será também a derrocada de uma expressão usada anos a fio por gerações de seres humanas: só que no espaço de uma única geração de vacas.

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