UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: Narrativas da diferença

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Narrativas da diferença

Blog é vício. Eu, por exemplo, escrevo por simples compulsão, na maior parte das vezes propondo reflexões que interessam a meia dúzia de desavisados - tudo gente como eu, que fica agarrada à tela do computador até tarde da noite, ao invés de ir para a cama contar carneirinhos.

É bem certo que esta compulsão pela escrita é uma faca de dois gumes. Ela disciplina a alma preguiçosa e acaba fazendo a gente tirar leite de pedra naqueles dias em que a inspiração é escassa e as notícias interessantes também. Mas, às vezes, eu me vejo às voltas com uma espécie de remorso criativo por não escrever coisas mais edificantes. Hoje foi um desses dias. Principalmente depois de me deparar com a história de Paulo Henrique Machado, residente em uma UTI do Hospital das Clínicas, em São Paulo (http://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2013/05/1285372-internado-ha-mais-de-40-anos-paciente-cria-serie-de-animacao-dentro-do-hospital.shtml).

A história de Paulo Henrique, hoje com 45 anos, é narrada por ele mesmo na seção "Minha História" do caderno "Equilíbrio e Saúde" do jornal Folha de S. Paulo online. Do total de anos vividos por ele, 43 foram passados naquele hospital, em função de uma paralisia infantil, que afetou também o seu sistema respiratório, quando ele tinha apenas um ano e meio de idade. Foi também no Hospital das Clínicas que ele concluiu o ensino médio, fez diversos cursos de informática e até aprendeu a montar seu próprio PC.

A narrativa de Paulo Henrique no espaço "Minha História" é - juro! - uma das narrativas mais comoventes que eu já li. Comovente e desafiadora, porque ela não respeita os limites da imaginação das pessoas ditas "normais", a maior parte delas limitadas pelas normas que disciplinam o que elas devem achar do mundo e de si próprias. Ele conta coisas de si e de sua infância que certamente surpreenderiam o mais cético dos seres humanos: "Pensei que as minhas aventuras e dos meus amigos aqui dentro do hospital já dariam um bom roteiro para uma série animada. Ao colocar as histórias das nossas vidas, minha ideia é que as crianças possam assistir e aprender que o deficiente, numa cadeira de rodas, não é tão diferente assim."

Como eu, Paulo Henrique deve fazer parte deste seleto grupo de pessoas com compulsão pela escrita, mesmo se sua "escrita" é mediada por sonhos mais animados - literalmente animados, devo dizer. É que ele tem planos de contar sua história em uma série de filmes animados em 3D sobre a vida de crianças com paralisia infantil. Aliás, o projeto de animação dele recebe doações pelo site Catarse. Quem se interessar em saber mais e apoiá-lo, eis aqui o endereço: http://catarse.me/pt/leca.

Paulo Henrique está parcialmente certo: a infância de um deficiente numa cadeira de rodas pode até não ser "tão diferente assim". Mas diferente mesmo é a sua maneira de encarar a sua suposta "diferença", o que, no final das contas, termina por fazer dele uma pessoal realmente diferente das outras.

No mais, faço votos de que o montante almejado para a realização da série animada seja alcançada em breve!

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