UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: Incerteza

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Incerteza

Sim, revezes fazem parte da vida. Todo mundo já passou ou passará por algum enquanto estiver fazendo seu passeio existencial "neste  asteroide pequeno que todos chamam de Terra" (expressão tomada de empréstimo da canção de Zé Ramalho). Mas revezes na velhice são um tanto mais dramáticos do que em outros períodos da vida, já que o tempo necessário para a recuperação é mais escasso.

A história desta idosa de 96 anos que está internada há meses no Hospital Rio Laranjeiras, na cidade do Rio de Janeiro, é uma história de revezes, sem dúvida, mas não necessariamente pelos mesmos motivos ressaltados nesta notícia publicada hoje no jornal O Globo online: "A trama envolvendo a senhora que está no Rio Laranjeiras começou em 29 de fevereiro deste ano, quando ela passou mal. Com problemas intestinais, foi buscar ajuda na Delegacia do Idoso, em Copacabana. Os policiais a encaminharam para o Centro de Assistência Social, em Laranjeiras, onde os profissionais verificaram que ela tem plano de saúde, pago mensalmente por débito automático. Por isso, foi internada na Rio Laranjeiras" (http://oglobo.globo.com/rio/foto-tira-do-anonimato-idosa-internada-em-hospital-do-rio-5717715).

O problema é que a notícia começa levantando uma falsa lebre ao sugerir, logo nas primeiras linhas, que Leonora Amar Rousseau teve sua vida alterada em função da popularidade alcançada com a publicação de sua foto nas redes sociais: "Moradora de Copacabana, sem nenhum parente vivo, ela enfrentava seu drama sozinha até a semana passada, quando uma foto sua, deitada num leito hospitalar, foi divulgada nas redes sociais e, imediatamente, compartilhada por milhares de pessoas".

A notícia toma como indicador de popularidade o número de compartilhamentos que sua foto recebeu desde que foi parar nas redes sociais: "A foto de Leonora está presente em vários perfis do Facebook. Há casos em que a imagem foi compartilhada mais de 70 mil vezes", informa. Mas a própria notícia fornece evidências contrárias logo em seguida: no fundo, no fundo, a vida desta senhora pouco ou nada foi alterada desde que ela se tornou uma celebridade "pública", já que "Leonora está realmente internada e, apesar de não ter família, a equipe médica sabe exatamente quem ela é e onde morava até ser encaminhada à unidade".

Bem, se nenhum parente foi localizado - pois a idosa não os tem - e nenhuma nova informação sobre seu passado veio à tona, o que poderia ela ter ganhado com tamanha notoriedade pública? Comiseração? Em termos, pois Dona Leonora faz parte deste seleto clube de pessoas que chegam à velhice amparados de alguma forma por serviços de saúde privados. Além disso, de acordo com o hospital, a nobre dama está lúcida e caminha normalmente, o que, em si, já é uma boa notícia.

Bem, se ela pouco ganhou com a súbita fama, a única coisa realmente fidedigna na história da Dona Leonora parece ser a inconstância da vida. Apesar da idade avançada e do pouco tempo que lhe resta, ela sabe tão pouco como eu ou você o que o destino lhe aguarda nos próximos dias: apesar do seu estado de saúde ser estável, ela "permanece na unidade à espera de uma decisão do Ministério Público Estadual". De qualquer forma, "o Rio Laranjeiras informou que entrou com um procedimento na 2ª Promotoria do Idoso para que o MP assuma a mulher e, se for o caso, a encaminhe para um lar de idosos".

Bem, quanto a nós, meros expectadores do seu drama pessoal, nada mais nos resta senão ir dormir com uma pequena lição: a despeito da morte ser a única coisa certa na vida, viver é como jogar nos últimos minutos da prorrogação de um jogo de futebol: enquanto a bola estiver rolando na grama, a vida nos surpreenderá.

Assim é!

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