UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: Coisa deles lá

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Coisa deles lá

Agora, falando sério: as pessoas teriam muito a ganhar se elas se interessassem mais pelos calendários demográficos do que por um fim de mundo (supostamente) anunciado pelo calendário maia. Poucos desconfiam, mas é na demografia que reside a chave para o entendimento de uma verdadeira e profunda mudança nos padrões das relações econômicas, culturais e sociais que ocorrerão nos próximos anos.

Em termos de professia demográfica, nota-se, por exemplo, que os EUA conheceram em 2011 a concretização de uma tendência que começou a se desenhar no período pós-guerra e que acaba de ser confirmada com a publicação hoje dos dados do último censo daquele país. "Os bebês nascidos em famílias de minorias étnicas representaram pela primeira vez na História a maioria (50,4%) em relação aos filhos de brancos que vieram ao mundo durante todo o ano", revela matéria publicada hoje no jornal O Globo online (http://oglobo.globo.com/mundo/bebes-de-minorias-sao-maioria-nos-eua-4922219#ixzz1vBN9A34i).

Isto significa que, muito em breve, a chamada "maioria" deixará de sê-lo, cedendo lugar a uma população de composição mais heterogênea do ponto de vista étnico-racial, isto é: composta por latinos, asiáticos, negros, conforme categorização adotada naquele país. "Segundo as projeções dos demógrafos, os brancos deixarão de ser maioria na população adulta depois de 2040, com impacto difícil de prever sobre a economia, a política e a cultura americanas".

O crescimento populacional não-branco não está, contudo, ligado a um suposto aumento da imigração, como poderiam supor alguns. "O crescimento é movido principalmente pelos nascimentos de bebês (a taxa de fecundidade desses grupos étnicos é superior à dos brancos) em solo americano". Trocando em miúdos, não deixa de ser uma revisitação da ideologia do "façam amor, não façam a guerra", só que totalmente destituída da estética hippie, mas com profundas consequências para a auto-imagem de um país.

E se alguém aí estiver achando que a tendência é "coisa deles lá" e que isto não tem nada a ver conosco, está na hora de atualizar seus conceitos com relação a nossa auto-imagem também. É que nosso censo de 2010 revelou algo muito parecido: "pela primeira vez na História do Censo, a população do Brasil deixa de ser predominantemente branca. Pelos dados de 2010, as pessoas que se declararam brancas são 47,73% da população, enquanto em 2000 eram 53,74%. Nos outros Censos, até agora, os brancos sempre tinham sido mais que 50%" (http://oglobo.globo.com/politica/censo-2010-populacao-do-brasil-deixa-de-ser-predominantemente-branca-2789597).

Claro, como a questão ultrapassa o simples pertencimento a uma categoria demográfica para envolver uma consciência mais profunda do sentido histórico da própria minoria, a buraco é sempre mais embaixo. "No governo do presidente Barack Obama, primeiro representante de uma minoria a governar o país, o número de deportações de imigrantes mexicanos em situação ilegal cresceu exponencialmente, ultrapassando a marca alcançada nos dois mandatos do presidente anterior, George W. Bush", recorda com muita propriedade a matéria publicada hoje sobre no O Globo.

E se alguém aí, mais uma vez, ficou achando que perseguição e minorias é "coisa deles lá", então o melhor mesmo vai ser este(a) dito(a) cujo(a) ir dormir com esta notícia aqui, publicada também no dia de hoje: "A Justiça Federal de São Paulo condenou por crime de discriminação a estudante de Direito que postou, em 2010, mensagem preconceituosa e de incitação à violência contra nordestinos no Twitter" (http://oglobo.globo.com/pais/condenada-estudante-acusada-de-discriminacao-no-twitter-4917740#ixzz1vBWFIPrU).

Moral da história: o país e o mundo estão mudando. E está passando da hora de atualizarmos nossos conceitos.

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