UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: O Site das Cebolinhas

sexta-feira, 4 de maio de 2012

O Site das Cebolinhas

Queridos leitores: saibam que esse nosso ofício de comentarista de generalidades e banalidades diárias comporta alto grau de risco e requer, antes de mais nada, muita classe. Fato incontestil: ao rir da banalidade alheia, você pode estar relatando suas próprias fraquezas de caráter.

Exemplo clássico é essa matéria publicada hoje no jornal Hoje em Dia online: ela divulga um site de gosto bastante duvidoso, cuja proposta é compilar fotos bizarras e supostamente mal-sucedidas - na modesta opinião vaticinal de quem as selecionou (http://www.hojeemdia.com.br/noticias/site-reune-fotos-bizarras-de-pessoas-que-buscavam-glamour-1.440846).

Mas falemos primeiro do site (http://thechive.com/). Após uma breve visita exploratória, nota-se que ele muito provavelmente compila fotos que tenham sido previamente publicadas na Internet (ao menos, é o que dá a entender a seção "Daily Afternoon Randomness") ou que tenham sido enviadas pelos internautas (vide balãozinho "submit pics" no canto direito da página). Além disso, e a julgar pelo seu slogan, o site parece particularmente adepto da auto-ironia com o provocativo título de "provavelmente o melhor site do mundo".

A meu ver, um dos problema gritantes de sites "críticos" como este é que eles tomam por universais determinados critérios - absolutamente particulares, diga-se de passagem - de beleza e sofisticação, só que pelo avesso: é como se A contasse uma piada sobre B para C, e ambos interlocutores considerassem B abominável, desprezível ou indigno de respeito. Mas em um mundo pluralista, marcado pela diversidade de padrões de comportamento, modelos estéticos e gostos, nem sempre (quando não muito na maior parte das vezes) A e C comungam das mesmas visões sobre B. E é nessas horas que alguém pode não entender o motivo do riso, inclusive B, alvo da chacota.

O segundo problema desse tipo de site é de cunho ético. Afinal, "The Chives" pode ser lido por A, B e C. E é quase certo que B certamente não ficaria feliz de saber que ele é considerado "bola fora", motivo de escárnio e desdém de A, C e quem mais visitar e comentar a url. E mais: será que as fotos de B foram publicadas com o seu consentimento expresso ou foram surrupiadas por A e C? E se tiverem sido previamente aprovadas pelo seu protagonista, o que levaria alguém a se expor a tamanha degradação? Estas são perguntas cujas respostas fatalmente não serão dadas no âmbito desse comentário.

Voltando à matéria do Hoje em Dia: muito pior do que divulgar um site de gosto duvidoso como se fosse a oitava maravilha do universo é expor o próprio pré-conceito nos jugamentos. Convenhamos, o lead da matéria foi de uma infelicidade extrema: "Cabelo ruim, maquiagem ou foco inadequado. O 'The Chive' não deixa escapar nenhuma imagem. Confira".

Bem, se alguém ainda não entendeu aonde quero chegar e qual a razão da minha perplexidade, aqui vai uma breve explicação: dizer "cabelo ruim" fala muito dos conceitos de beleza do seu autor. Ele pressupõe uma divisão maniqueísta em cabelos bons e cabelos ruins. Os primeiros se adequam ao critério estético em voga e não necessariamente da maioria (cabelos lisos), enquanto os segundos encarnam o contra-exemplo da beleza e da sofisticação (cabelos crespos). Em outras palavras, a notícia reproduz os mesmos vícios do site que ela divulga: toma por universal critérios de beleza absolutamente particulares (tem muita gente linda e feliz com os cabelos supostamente "ruins"); reforça o mesmo préconceito contra quem escapa à norma, expondo sua imagem ao ridículo.

É por essas por outras que ironia reclama classe. Senão, ela vira preconceito puro. A uma hora dessas, o patrono deste blog, Machado de Assis - homem irônico e refinado - deve estar se contorcendo na tumba!

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