UA-89169382-1 Crônicas de Juvenal: Eclipses alexitímicos

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Eclipses alexitímicos

Final de ano, chuva, trânsito, pés alagados. Quem se achar em condições de tirar os olhos dos próprios sapatos encharcados e olhar para trás, terá a grata oportunidade de avaliar o ano que passou, com tudo de positivo e negativo que ele tenha proporcionado. E quem não se achar em condições para tanto, certamente incorrerá no risco de entrar em 2012 brincando de eclipse oculto na luz do verão: ou seja, parando "no meio/ sem saber os desejos/ aonde é que iam dar".

Ao que parece, a leitura dos desejos - e de onde é que eles vão dar - está virando uma questão crucial a ser resolvida (ou complicada) com as novas tecnologias eletrônicas. Pelo menos, é o que dá a entender a empresa IBM, ao publicar seu famoso relatório anual "5 in 5". "Nele, a empresa cita cinco tecnologias que ela acredita que existirão nos próximos cinco anos", explica notícia publicada hoje na Folha online (http://www1.folha.uol.com.br/tec/1023577-leitura-da-mente-pode-chegar-nos-proximos-cinco-anos-diz-ibm.shtml).

Dentre outras coisas, "a lista desse ano inclui a leitura da mente por aparelhos eletrônicos". De acordo com os prognósticos, a leitura da mente a ser proporcionada pelo futuro achado tecnológico está diretamente relacionada com a capacidade de leitura e interpretação de expressões faciais: "A empresa argumenta que estudos no campo da bioinformática indicam a criação de sensores avançados que leem as atividades do cérebro, reconhecem expressões faciais e níveis de concentração e empolgação", diz a Folha.

Mas, "diferentemente do que ocorre em filmes de ficção científica, porém, a leitura da mente sugerida pela IBM não permitirá que você olhe para alguém e enxergue o seu pensamento", conclui a notícia. Não se trata, portanto, de "leitura da mente" no sentido mais estrito, isto é, de captação das ondas eletromagnéticas que dão forma ao pensamento, mas muito mais da capacidade de aparelhos interpretarem sinais psicomotores emitidos externamente pelos seres humanos.

Nada mal para quem achava que as emoções não teriam mais lugar no futuro. Péssimas notícias para os alexitímicos: aqueles que não conseguem descrever apropriadamente, por meio da linguagem, seus próprios sentimentos e emoções, bem como as sensações físicas que os acompanham. Eles serão a unha encravada da IBM. Também o serão os sequelados na face em decorrrência de acidentes cardiovasculares, os caolhos, os queimados de pele repuxada e até os banguelos: todos eles colocarão o quadro interpretativo dessas futuras tecnologias eletrônicas em xeque-mate.

Alexitímicos ou não, o ato de expressar adequadamente desejos e sensações - sem ferir desnecessariamente a nós mesmos e aos demais - é um desafio que se coloca para qualquer um. Mas não deixo de pensar nos futuros problemas práticos a serem enfrentados pelas tecnologias de leitura de expressões faciais: talvez tenhamos apenas cinco anos para expressar nossos sentimentos livremente, sem medos de sermos mal-interpretados por uma máquinas. Ou cinco anos para adaptar todas as diferenças anatômicas das pessoas - desejadas ou não - a um único padrão de expressão.

Sabe-se lá... Melhor seria se tudo saísse como o "som de Tim Maia/ Sem grilos de mim".

2 comentários:

  1. Bom... ainda terei mais alguns anos para guardar só para mim meus pensamentos mais levianos.... Vou aproveitar... Hum.... O que eu estava pensando antes mesmo?? ;-)))))

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  2. Taí uma coisa que eu não tinha pensado: que tipo de contração facial gera um pensamento leviano? E um pensamento infame? E um pensamento sem pé nem cabeça? Estaríamos às voltas com o retorno da velha arte ou ciência da Fisiognomonia? Ó céus! Quantas dúvidas!
    Beijos, amada Toy.

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